domingo, 13 de dezembro de 2009

DEMÔNIO RETRÔ

Roberto Rillo Bíscaro

A década de 70 foi infestada por filmes a respeito de seitas satânicas ou possessão demoníaca. The Exorcist (1973) e The Omen (1976) podem ser os mais populares, mas não passam de ponta de iceberg. Até John Travolta começou em filme de culto satânico (The Devil’s Rain (1975)), sendo derretido no final!
Volta e meia alguma notícia sobre malucos cultuando o diabo no mundo real alimentava ainda mais a histeria e a lucratividade dos filmes e da mídia. Rosemary’s Baby (1968) alterara o paradigma dos filmes de culto satânico com uma ambientação “normal” e longa espera antes de clímax. Era Roman Planski usando a idéia de Alfred Hitchcok de que o que realmente importa num filme de suspense é a espera e não o clímax em si. Ironicamente, a atriz Sharon Tate, primeira esposa do diretor polonês, seria brutalmente assassinada por Charles Manson e sua trupe de malucos satanistas.
Muita produção pra TV nos anos 70 e primeira metade dos 80 era sobre o demônio. Cães possuídos pelo Cão, carros comandados pelo demo. Enfim, o diabo! O mundo às voltas com demônios de verdade como Richard Nixon, Ronald Reagan e o aloprado Jim Jones e o cine reproduzindo isso em diabruras em celulóide. Muita produção barata também, as quais, não podendo contar com orçamento pra efeitos especiais tinham que se esmerar em fazer uma boa preparação de terreno antes do clímax, geralmente meio improvisado. Casas escuras, gente esquisita, silêncios, corredores sinistros. A gente ficava angustiado pelo clima de suspense e pela angústia de saber que algo iria acontecer, mas quando?
Tudo isso foi há mais de 30 anos, todavia... Hoje os filmes de horror são diferentes, obviamente. Outras convenções, outros modos de filmar, outro equipamento, até mesmo certo modo diferente de atuação de atores. Muitos fãs de horror atual não suportariam a lentidão e a falta de elementos high tech nesses filmes de possessão diabólica dos anos 70 e começo dos 80...
Sexta à noite, decidi ver um filme chamado The House of the Devil (2009). Eu não sabia nada a respeito do filme, mas nada mesmo. Ouvira falar dele apenas um par de dias antes de assistir e mesmo assim não lera crítica alguma. O título me pareceu divertido o bastante; adoro filme de casa mal-assobrada!
Botei o filme no player, deitei. Primeiro aparecem uns dados estatísticos sobre cultos satânicos nos anos 80, situando o filme naquela década. Mmmm, delícia, pensei. Quando os créditos e a musica iniciais começaram, não pude acreditar: são puro vintage do fim dos anos 70/começo dos anos 80. Daí eu fui reparando melhor, a protagonista era super começo dos anos 80, os cabelos, o walkman enorme que ela usava. A recriação da época é muito boa. Até a película ou a câmera usada são as mesmas da época, então a impressão que se tem é de estarmos vendo um filme de casa mal assombrada/ritos satânicos de sua época dourada!
A premissa é a seguinte: Samantha necessita urgentemente de grana pra mudar-se do quarto onde vive com uma amiga suja e promíscua. “Coincidentemente” surge uma proposta pra que ela vá a uma casa enorme, estranha, no meio do nada, pra cuidar de uma inválida. Ou seja, como o espectador já conhece as convenções desses filmes porque a película deixou bem claro que está operando totalmente dentro delas, resta-nos esperar quando Samantha vai entrar pelo cano e como!
E é na espera que o diretor Ti West se regozija em torturar o espectador. Ou entediar, depende do espectador... São 70 minutos de construção do clímax: muitos silêncios, muita exploração da casa misteriosa. Tudo filmado absolutamente como se fosse um filme da época. Quem viveu ou conhece bem a épocada qual estou falando vai se lembrar de muitos filmes e também de muitas coisas vividas enquanto assiste The House of The Devil. É pura nostalgia.
Depois que acabei de ver o filme fui procurar comentários, e, conforme previra, as pessoas dividem-se em 2 grupos:as que amam e as que odeiam. Quem ama é porque o filme remete a tempos passados, porque troca o gore pelo clima etc. Quem odeia é porque acha o filme chato e lento demais. Teve gente que detestou porque achou o final “fraco”demais.
Realmente, a maneira como a heroína parece escapar é simplória demais. (alías, pra quem conhece a convenção desses filmes vou soltar um spoiler: o destino da heroína é super 70s...). Mas, eu entendi isso como parte da estrutura retro e laudativa do filme. Meu problema com o final foi outro. Preciso ver de novo, mas me parece que filmaram o final em alta definição, o que entra em contradição com os 2 primeiros atos. Além disso, achei as cenas um pouco gore demais prum filme da época. E tem aquele maldito som de “espada sendo desembainhada” que deveria ser banido nos filmes contemporâneos porque já saturou!!!!
The House of the Devil é uma viagem retro pra quem curte filmes de casa mal assobrada e cultos satãnicos dos anos 70 e 80. Enquanto opera nessa convenção é uma delícia; quando decide ficar indeciso a respeito de pra qual santo rezar, perde o gás, bem no final, infelizmente! Ainda assim, fazia tempo que eu não gostava tanto assim dum filme de terror.
(Eis o trailer. Não se deixe enganar pela trilha sonora do trailer, que é desse tipo moderninho que assusta mais do que o filme em si! A música incidental de The House of The Devil é puro 70s/80s!)

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