Há alguns meses, o Helder, um dos seguidores albinos do blog me telefonou. Além do albinismo e da luta por superação de barreiras, compartilhamos forte interesse por cinema. Na conversa, não escapou a Helder certo paradoxo que vivemos: ambos com deficiência visual, ao mesmo tempo amando uma arte visual! Afinal, cine é contar histórias através de imagens, ainda que existam diálogos.
A diversidade e disparidade dos filmes comentados no blog atestam meu ecletismo. Trafego tranquilamente desde cine iraniano a produções podres de terror. Evito os lançamentos de Hollywood, mas isso não significa que seja refratário a eles. Só não fico neurótico na obrigação de TER que ver um filme porque todo mundo está vendo. Se calhar, algum dia vejo, sem stress.. Obrigação, só as que envolvem trabalho e afins. Me divirto como quero, não como mandam...
Mudei-me pra Penápolis em julho de 1976, vindo de São Paulo, minha terra natal. Lá, fora ao cine apenas um par de vezes. Perto de casa não havia sala e dependia dalgum adulto me levar.
Em Plis, havia o Cine São Joaquim em frente à praça central. Ficava a apenas 3 quadras de casa. Prédio enorme, na verdade, um cine teatro com capacidade pra 1.185 espectadores. (Aprendi o número exato agora há pouco, no link abaixo!)
A gente subia alguns degraus a partir da calçada (que ainda continuam os mesmos), e em frente havia a bilheteria. À direita havia uma porta de vidro com um carinha que pegava os ingressos. Lá dentro, havia um hall onde ficava a bomboniére, que não passava dum daqueles balcões antigos de vidro e madeira. Minha família possuía um empório e uma vez a administradora da doceria ficou devendo quantia razoável. Como não podia ou não queria pagar, concordou que pegássemos o equivalente da dívida em guloseimas nas sessões de cine! Quase morri de tanto comer chococlate, especialmente Choquito e o recém-lançado Sensação (que tinha música tipo Carmen Miranda no comercial!!)
Uma curiosidade: talvez o Cine São Joaquim tenha sido um dos únicos do planeta onde não se podia comer pipoca vendo filme! Era proibido entrar com o alimento nasala. Pra mim não fazia diferença porque vivo perfeitamente bem sem pipoca! Literalmente, comprei um balde de pipoca apenas UMA VEZ em toda minha vida, mas isso é pra outra história...
O grande balcão de doces ficava no espaço entre as portas de acesso e saída da enorme sala de exibição, que era em declive e tinha piso de tábua. Garrafas de refrigerante eram proibidas também porque senão a gente bebia e as colocava no chão pra que rolassem até lá embaixo... Era uma delícia bater os pés naquele piso, o cine todo parecia tremer! Antes de o filme começar era costume de muitos garotos correr ou dar voltas pela grande sala semi-escura.
Eu não perdia uma só matinê, sessões de filmes infantis aos domingos á tarde, às 14:00. Era ritual dominical, não importa o que estivesse passando. Sentava-me na primeira fileira e tinha que ficar com a cabeça levantada porque era quase embaixo da tela.
Conforme crescia, começava a ver os filmes exibidos à noite também (e mudei-me pra poltronas um pouco mais atrás, mas não muito porque senão não enxergaria as legendas!). Naquela época existia a Censura. Havia filmes pra 5, 10, 12, 14, 16 e 18 anos. Dizia-se que também havia filmes de 21, mas não sei se era verdade ou invencionice da meninada.
Morríamos de vontade de ver os filmes acima de nossa faixa etária. Claro! Falou que é proibido, a coceira é maior pra ver, não é assim? Quando tinha uns 11 anos, tentei entrar num filme pra 16, A Maldição das Aranhas! Passei no apartamento dum colega e fomos pra casa de outro. Tentaríamos os 3 entrar... Na porta do cine, os 2 afinaram, mas eu fui em frente... “Ih moleque, pode voltar pra trás, cê não tem 16 nem aqui nem na China”... Fernando e Alexandre mo gozaram durante dias e contaram pra escola toda!
No ano seguinte, entrava tranquilamente em filmes pra 14 anos e logo, logo nos raros filmes pra 16. Mas, daí, a grande ambição era entrar num de 18!!!
Quando estava no primeiro colegial, em 1982, aos 15 anos, realizei a façanha! Fui ver Luz del Fuego com Lucélia Santos e Walmor Chagas. Adolescentes são mais blasé, mas mesmo assim, tive alguns minutos de fama no dia seguinte, entre os meninos menores ou menos “descolados”...
Muitos momentos deliciosos vividos no São Joaquim... Minha turma e eu fomos assistir Flashdance 3 vezes, nas 2 semanas em que ficou em cartaz...
Agora, o que mais marca alguém acima dos 30 anos que tenha vivido em Penápolis na época e freqüentado o cine São Joaquim é uma música!
Como se tratava dum cine-teatro, a tela ficava no palco, no topo de alguns degraus e protegida por uma cortina. Pra marcar o início de toda e qualquer exibição, as luzes se apagavam e imediatamente começava a tocar Theme from a Summer Place, simultaneamente ao abrimento das cortinas. Vivi isso centenas de vezes ao longo de quase 2 décadas! Em 1993, ainda me lembro de tocarem a canção...
Hoje o cine São Joaquim não mais existe. Há outro cine com outro nome no mesmo prédio. Agora há um cinema e um teatro. A sala era tão grande que deu pra fazerem duas! Não há mais cortinas porque parece que são proibidas pelos bombeiros por causa de perigo de incêndio. Também não toca mais Theme from a Summer Place...
Nunca deixarei de ver as cortinas do cine São Joaquim se abrindo toda vez que ouvir essa canção. Ela sempre será “a musica do cinema”. Aliás, aprendi o nome oficial dela hoje!
(A música pra ilustrar o post não poderia ser outra, claro...)
Viajei neste post! e o tema é lindo mesmo, faz a gente se transportar para outro lugar. adorei.
ResponderExcluirTem post p vc no blog, com direito a surpresinha, hehehe bj!
ResponderExcluirA Dr. Roberto eu vivi tudo isto aqui em Mococa e aoouvir a musica; chorei...saudades ....
ResponderExcluirA gente nem se importava com os erros de projeção... Perdi a conta de quantas vezes gritamos: "olha o foco!".
ResponderExcluirNossa Roberto viajei no tempo agr,foi como se eu estivesse numa máquina do tempo,fui lendo e fui revivendo cada momento,que saudades que me deu,e sem esquecer de Grease - Nos Tempos da Brilhantina e Os embalos de sábado a noite.....amei a lembrança,bjoos.
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ResponderExcluirVoltei no tempo! Muito bom Roberto! E quantos namoros no cinema não viraram casamento? No escurinho do cinema...
ResponderExcluirPuxa vida voltei no tempo assisti muitos filmes em pois tarzam mazaropi me lembro que eu estudava na Oceu ficava olhando um japonês desenhar os personagens dos filmes
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