domingo, 23 de maio de 2010

(DES)APARECIDOS


Roberto Rillo Bíscaro

Meio sem querer, acabei assistindo a outra produção argentina hoje á tarde. Na verdade, uma co-produção com a Espanha. Um amigo em cujo gosto cinematográfico confio, me indicou um filme de horror “espanhol” chamado Aparecidos (2008). Ele mesmo não o vira, mas depois de assistir ao trailer no You Tube, resolvi dar uma chance, algo como um tiro no escuro, o que é bastante freqüente comigo. Depois de boas produções espanholas assistidas, não faria mal tentar mais essa.

Os irmãos Pablo e Malena estão em Buenos Aires pra autorizarem o desligamento das máquinas que mantinham as funções vitais de seu velho pai – com o qual não tinham contato desde criança – cuja morte cerebral fora decretada.

Malena não mostra o menor interesse pelo velho; tudo o que quer é assinar logo os papéis e regressar à Espanha. Pablo, que sequer conhecera o progenitor, manifesta interesse em saber mais a respeito do homem e diz à irmã que em troca de assinar a autorização, quer viajar até o sul do país no carro do pai, que estava estacionado na garagem do hospital.

Só então saquei que a trama se desenrolaria na Argentina...

Durante uma parada à beira da estrada, Pablo vê uma garota mexendo na parte interna da lataria do veículo, acima dum dos pneus traseiros. Diante da mudez da menina perante suas perguntas, Pablo enfia a mão no nicho e encontra uma espécie de diário repleto de fotos e manchas que parecem sangue. Ao olhar de volta pra garota, constata que desaparecera sem deixar rastro.

Lendo o diário, Pablo começa a se inteirar acerca duma pavorosa história de seqüestros, torturas e assassinatos, documentada com fotos assustadoras. Pernoitando num hotel, descobre através da narrativa, que, no quarto ao lado em que estavam, um brutal crime ocorrera em 1980. A partir daí, fenômenos aterradores começam a acontecer precisamente nas horas indicadas no diário. Aos poucos, os ingênuos jovens espanhóis tomam conhecimento das barbaridades ocorridas durante a sangrenta ditadura argentina, que durou de meados da década de 70 até depois da derrota da Guerra das Malvinas (pralguma coisa boa a Margareth Tatcher tinha que servir, não?). Malena também descobre um segredo familiar nada lisonjeiro, relacionado á atividade profissional do pai e à origem de Pablo.

O cine argentino vem tematizando a ditadura e suas torturas e sequestros de bebês desde praticamente o dia em que a democracia voltou ao país, basta lembrar o oscarizado La História Oficial (1985), o qual amo de paixão. Há muitos outros, muitos mesmo! Já vi vários. O fantasma desse período ainda assombra o país.

Inédito ainda era tratar do tema sob a ótica dos filmes de horror. A Espanha fez isso diversas vezes a respeito de sua própria história recente de guerra civil e franquismo. Basta lembrar de El Espinazo Del Diablo (2001), El Laberinto Del Fauno (2006) e de No+Do (2009), este último comentado aqui. http://www.albinoincoerente.com/2009/09/nodo.html

Aparecidos é um competente filme de horror com cenas marcantes, boa trilha sonora e fotografia apurada. Quase impossível errar, filmando na Terra do Fogo, né? Descontadas algumas afobações e implausibilidades do roteiro, a película coloca a Argentina no mapa do cine de horror de maneira honrosa.

Comovente a cena final em que fantasmas de torturados circulam pelas ruas portenhas sob chuva torrencial. Chorei.

Usar temas políticos pra fazer roteiros de filmes de terror mostra que os malditos Francos e Videlas da vida assustam muito mais do que Jasons e Freddy Kruggers! Particularmente, prefiro os últimos porque são de mentirinha. Os de carne e osso que apodreçam no inferno!

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