ETs DO MINDINHO DURO

Roberto Rillo Bíscaro

Os Invasores foi uma série televisiva de ficção-científica que durou 2 temporadas, entre 1967-8. Nasceu junto comigo! Não me recordo de tê-la visto na TV quando criança, embora gostasse de sci-fi. Creio mesmo que jamais ouvira falar do show até este ano.

Como atualmente estou bastante atarefado, tenho visto mais séries do que filmes; episódios são mais curtos do que longas metragens... Quando li a sinopse e visitei alguns sites sobre The Invaders, interessei-me e resolvi assistir. Gosto de TV dos anos 50/60, além dos filmes B de ficção, alguns deles comentados no blog.

O arquiteto David Vincent presencia o pouso dum disco voador em local abandonado no Texas. Ninguém crê em sua história e a partir daí, começa sua saga pra tentar provar que os alienígenas estão entre nós, prontos pra invadir a Terra, exterminar a espécie humana e usar nosso planeta pra substituir o deles, em vias de morrer.

A odisséia de Vincent lembra a de diversos protagonistas televisivos dos anos 60/70, que vagavam de cidade em cidade fugindo de algo ou tentando provar alguma coisa. The Fugitive e The Incredible Hulk vieram á mente quando vi o primeiro episódio, mas sei que existem outras, com premissas similares. A figura do andante sem destino ou parada, que repara danos é tropo recorrente desde o mito grego de Hércules, passando por cavaleiros medievais e cowboys de faroeste norte-americano.

Os alienígenas assumem forma de seres humanos, sendo impossível identificá-los a não ser por alguns sinais característicos: ausência de batimento cardíaco e pulso, inexistência de sangue e, em muitos casos, uma espécie de má formação do dedo mínimo, que o deixa permanentemente em riste (traço que é abandonado no final da segunda temporada...). Ao morrerem, os ETs incandescem e transformam-se em cinza, não deixando rastro. Bom truque narrativo pra evitar que Vincent consiga provas da invasão iminente e tenha que prosseguir sua peregrinação incansável.

Desprovidos de sentimentos, os alienígenas de The Invaders não podem deixar de serem percebidos como representação da paranóia anti-comunista, tão presente nos filmes da década de 1950. Visualmente, a série está mais pra década anterior do que pra psicodelia anos 60 já presente em Batman, com sua explosão de cores e surf music. The Invaders tem aspecto retrô mesmo pra 1967! Vincent aparece de paletó quase o tempo todo (descontadas algumas vezes em que aparece sem camisa pra atiçar fãs do ator Roy Thinnes...), assim como as demais personagens masculinas.

Há 43 anos, a Guerra Fria estava fervendo, materializada na Guerra do Vietnã, inevitavelmente citada em alguns episódios. Fora isso é como se a efervescência e conflitos sociais dos anos 60 não existissem no mundo ficcional da série. Os distúrbios gerados pela revolta dos negros em diversas cidades norte-americanas são mencionados em apenas um episódio, que aliás, é um dos únicos a apresentar personagens afro-descendentes. Entretanto, a presença é tão saturada nesse único show, que não dá pra deixar de notar que a adição dos negros (ainda chamados de “negroes” em inglês!) foi forçada demais.

O movimento de liberação feminina deve ter tido fartos motivos pra detestar a série! Via de regra, as personagens femininas são tolas, infantilmente teimosas ou submissas.

Coleridge, no Romantismo inglês, saiu-se com a teoria da “suspensão da descrença”, que modernamente é entendida mais ou menos assim: diante da promessa de entretenimento, o leitor/espectador releva implausibilidades da trama. Meu pai tinha uma tirada ótima, que ecoava o autor de The Ancient Mariner. Quando eu reclamava que algo era mentira, que “só podia acontecer mesmo em filme!”, ele se saía com a tirada: “ué, mas se não for assim, não tem filme, Beto.” Sábio, não?

Pra curtir The Invaders temos que suspender a descrença também, e várias vezes. Por que os aliens não matam David Vincent logo de uma vez? Eles tem inúmeras oportunidades pra isso nas 2 temporadas. Por que o arquiteto não anda armado e sai por aí matando tudo quanto é ET que surja pela frente? Afinal, os corpos se tornam cinzas mesmo! E por aí afora...

Isso não me tirou o gosto de ver todos os episódios, porém. Cada vez mais, sigo os conselhos de papai, caso contrário, não haveria filme e quero me divertir, afinal de contas. Só.

Prazer à parte, identificar velhos atores conhecidos de filmes dos anos 50 e futuros conhecidos de outras séries e do cinema pós-The Invaders. A cada episódio, ligava minhas antenas pra identificar rostos familiares.

Peter Graves, espécie de Rei dos filmes B da década de 50, como Killers From Space, Red Planet Mars, It Conquered the World, The Beginning of the End. Graves faleceu em abril, enquanto eu assistia a The Invaders…

Barry Morse, o Professor Bergman na primeira temporada de Space:1999, série que amava quando tinha uns 7, 8 aninhos. Ele e a Doutora Russell foram meus primeiros heróis na TV!

Jack Warden, que atuou tanto em filmes de John Wayne nos anos 60, quanto em September, de Woody Allen, em 1987.

Como sou fixado em novelas norte-americanas dos anos 80, ás vezes falava sozinho coisas do tipo “Ah, o Andrew, advogado do Blake!”. Tratava-se de Mark Richman que trabalhou em Dynasty e DALLAS (às vezes sou capaz de detectar atores que participaram de apenas um episódio de DALLAS, de tanto que já assisti!). Ou senão, “Gente, o senador Fulmont” , novamente, um ator de Dynasty.

Também vi uma ainda adolescente Barbara Hershey, que migraria da TV pra Hollywood, trabalhando com diretores importantes como Woody Allen, em Hannah and Her Sisters.

A surpresa maior foi ver meu amado Gene Hackman como alienígena. Gene se tornaria astro de primeira grandeza em Hollywood e um dos atores mais respeitados de sua geração. À época de The Invaders ele provavelmente já filmara ou estava filmando Bonny and Clyde, que iniciaria sua escalada pro estrelato. Mas ainda precisava de pequenos papéis na TV pra pagar as contas!

Os Invasores – título no Brasil – faz a delícia de quem curte séries vintage. Em 1995, uma mini-série tentou reviver o interesse pelo show, mas parece que não conseguiu porque não houve nada além disso. A única cena que vi dessa tentativa é aquela onde um envelhecido David Vincent faz participação especial passando o cetro pro novo caçador-mor de ETs de mindinho duro.

David Vincent é o mais novo herói em minha galeria. Com 43 anos de atraso.