Distrito da Gorongosa: o caso da criança albina isolada durante três anos
Derton Termo Zabo, de 4 anos de idade, residente na comunidade de Mbulaua, distrito de Gorongosa, viveu grande parte da sua vida confinado dentro de quatro paredes e nos limites do quintal da casa dos seus progenitores. Os pais tinham receio de dar a conhecer aos vizinhos e à comunidade da existência de um filho albino no seio do seu agregado familiar.
Durante este tempo, o rapaz que apresenta a pele e os pêlos de cor branca, os olhos de tom rosado e fotofobia, era preterido do convívio em círculo de amigos, passeios, entre outras liberdades, devido à sua alteração genética que o incapacita de fabricar a pigmentação necessária.
Quando adoecesse nunca era levado ao hospital. A mãe deixava o menino em casa e se dirigia sozinha ao clínico, ao qual explicava os sintomas (subjectivos, sujeitos à interpretação do próprio paciente) para a prescrição médica do filho a distância. Ela sempre mentia ao prescritor sobre a ausência do doente na consulta alegando que vive muito longe da unidade sanitária, pelo que era impossível levar o menino crescido ao colo e andar dezenas de quilómetros a pé para ser observado directamente pelo profissional de saúde.
Desta forma, Derton Zabo, quando enfermo era ”consultado” mediante apresentação de sintomas da sua doença através da mãe, impossibilitando um diagnóstico correcto, através dos sinais e alterações percebidas ou medidas por outra pessoa, usualmente um técnico da medicina.
No atendimento de alguém por um clínico é sempre prática cruzar sintomas e sinais, com vista a colher as informações necessárias ao pleno conhecimento da enfermidade de cada pessoa, mas o menino que temos vindo a referir era excluído desta prerrogativa, na sequência da sua mutação de genes que o impossibilita de produzir melanina que dá cor à pele e protege da radiação ultravioleta tanto do sol, como de algum dispositivo artificial.
Os pais têm pigmentação ajustada para seu corpo, razão pela qual consideravam a origem da situação da criança ligada a magia e alvo de troça por parte da sociedade. Eles não possuem o conhecimento científico para perceber que apesar de serem indivíduos normais, foram os dois que transmitiram ao filho os genes alterados no processo hereditário e que os albinos aparecem tanto em seres humanos, assim como em animais e plantas.
Por outro lado, foram ignorantes em acreditar que, apesar da discriminação social persistente, todo mundo conhece a existência de pessoas albinas, incluindo na comunidade Mbulaua onde moram, até porque em língua local nesta comunidade chamam de sope.
Por preconceito dos progenitores, o menino portador de albinismo ficou nos seus primeiros três anos de vida sem cuidados especiais exigidos, sobretudo da pele e da vista, bem como sem consultas de pediatria.
Entretanto, há um ano Nildo Sulemane Chigavale, enfermeiro da Clínica do Chitengo e da Clínica Móvel de Saúde do Parque Nacional da Gorongosa (PNG), notou uma clareza anormal na pele dos irmãos do Derton Zabo, numa das suas idas a Mbulaua.
Segundo contou, num dos dias ousou perguntar aos irmãos do miúdo albino quantos eram, tendo-lhe sido fornecido o número e informado da existência de outro que sempre ficava em casa.
Nildo Chigavale curioso, por outro lado, pelo facto de atitude duma mãe que fazia consulta de sua criança sempre ausente, decide identificar a residência dos Zabos. Quando chegou na casa não viu o pequeno e porque não podia entrar dentro do apartamento, optou por conversar abertamente com a mãe que revelou a existência do filho albino.
Sensibilizou o casal para deixar o menino livre e que era igual aos outros. A partir daí Derton Zabo passou a sair fora de casa, a passear com os irmãos, amigos e a frequentar consultas de pediatria. Paralelamente, recebe regularmente visitas domiciliárias da Clínica Móvel do PNG.
Conforme a fonte explicou, o preconceito dos pais de darem liberdade ao petiz residia pelo facto na família e na comunidade local nunca ter existido um indivíduo albino.
Presentemente, as atitudes estereotipadas dos progenitores mudaram, deixam o menino livremente fora de casa, sai a brincar em qualquer canto com os companheiros e falam da condição de albinismo dele sem nenhum preconceito.
Aliás, em conversa com o articulista deste artigo há dias o pai, Termo Zabo, 49 anos, camponês, casado com duas esposas, explicou que o menino está bem de saúde, mas nos horários de maior intensidade de radiação solar apresenta complicações para vislumbrar e a sua pele é muito susceptível a raios ultravioletas que lhe provocam pequenas queimaduras por não utilizar nenhum produto protector de pele.
Também disse que, o rapaz nas condições normais de temperatura para as demais pessoas, sente frio.
Mais afirmou que está desprovido de finanças para aquisição de protectores solares, bonés e óculos de sol que podem ajudar na protecção da pele e dos olhos, bem como de agasalhos condignos e calçado. Nisto, pede benesses a todos que puderem ajudar Derton Zabo em roupa, sapatos, cremes e mais.
Em resposta a este grito de socorro, uma equipa de médicos do Hospital Mount Sinai, dos Estados Unidos, ofereceu cremes especiais da pele ao rapaz, enquanto que o Departamento de Comunicação do PNG doou 500,00Mt para a compra de algumas peças de vestuário do mesmo.
Todos os que puderem prestar o seu apoio ao menor são bem-vindos pela parte da família Zabo.
A sociedade e os pais são bastante preconceituosos com o albinismo e pelos vistos o trilho a percorrer parece ser muito extenso ainda. O que aconteceu nos Zabos é mais um exemplo disso. Mas para a sua “infelicidade”, a mãe do Derton Zabo deu à luz mais uma vez há três meses uma menina albina chamada Mila Termo Zabo. Com a bebé, Termo Zabo passa a contar com nove filhos vivos.
(Encontrado em http://www.gorongosa.net/pt/news-event/280709_Crianca_Albina/distrito-da-gorongosa-o-caso-da-criana-albina-isolada-durante-trs-anos)
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