quinta-feira, 7 de outubro de 2010

TELONA QUENTE 7


ESPELHO, ESPELHO MEU
Roberto Rillo Bíscaro

O que esses diretores iranianos têm que conseguem arrancar interpretações perfeitas de crianças?! É impressionante; todo filme iraniano com criança que conheço é impecável no quesito atuação.
Ontem vi Ayneh (1997; no Brasil o filme se chamou O Espelho), do diretor Jafar Panahi. Uma garota de primeiro ano sai da escola e sua mãe não está na porta para esperá-la. Durante 40 minutos assistimos - entre angustiados e enamorados pela expressividade de Mina Mohammad Khani e sua voz estridente – à sua odisseia pelo caos urbano de Teerã. Cercada por adultos inoperantes ou desinteressados, a menina, além de perdida, está com um dos braços quebrados. Cheio de closes e cenas de rua, é hipnótico e às vezes assustador ver a pequena correndo e atravessando as ruas caóticas e quase iguais da metrópole iraniana. Será que não há semáforos, lá?
Embora estivesse adorando o filme, pensava que era a mesma história de Badkonade Sefid (O Balão Branco), filme anterior de Panahi. http://www.albinoincoerente.com/2010/05/badkonake-sefid.html
(Alerta: vou revelar a virada do filme. Quem não quiser saber, pare por aqui.)

De repente, o comando: “Mina, não olhe pra câmera”. Em seguida, a menina tira o véu e começa a gritar que quer descer do ônibus e voltar pra casa. Enjoara de participar do filme. Tudo o que se passara era a rodagem dum filme, todos eram personagens.
Acontece que Mina (será?) insiste em ir pra casa sozinha e não sabe direito como fazer. Como ficara com o microfone ainda na roupa, a equipe de filmagem resolve segui-la de longe. Ou seja, a partir daí passamos a ver um filme que supostamente é sobre uma pessoa de verdade que rodava uma película, mas desistiu de fazê-lo! Será? Esse é o começo do jogo de espelhos quase brechtiano, proposto pelo discípulo de Abbas Kiarostami.
Com Mina sendo filmada às escondidas pela equipe, a forma do filme muda. Cenas em enquadramentos mais abertos, muitas vezes obstruídas por veículos, microfone que falha e o som urbano que se torna ainda mais caótico, cacofônico e ruidoso. Um exercício em forma e perspectiva, que se adensa à medida que a menina vai encontrando ex-personagens que lhe dizem que foram pagos pra dizerem as falas, mas afirmam que o dito foi verdade. Realidade e ficção se entremeiam, o cinema é revelado em suas multi-faces e a arte parece não dar mais conta do real (ou seria o contrário?)
Talvez essa parte do filme pudesse ter sido mais curta: existe a sensação de repetição e falta do que dizer, em determinado ponto. Mas, cenas onde a menina se encontra com o dublador oficial de John Wayne no Irã (claro que jamais o vemos!) são muito bem boladas.

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