Nesta quarta, nosso cronista viajante José Carlos Sebe comenta sobre algumas mulheres do mundo das letras, enfocando um de seus temas favoritos, a imigração, ligando-o aos árabes, parte da identidade do professor.
MULHERES ÁRABES PERSONAGENS DA LITERATURA.
José Carlos Sebe Bom Meihy
Sempre. Sempre fui fascinado pelas sutilezas da linguagem. Seja pela palavra escrita, falada ou sinalizada por gestos, toda expressão comunicativa me arrebata. E me faz pasmo. Por vezes, o que me enfeitiça é o não tácito, o interdito, o silenciado ou os outros significados. Um dos mais intrigantes mistérios desta manifestação diz respeito às nuanças entre os modos femininos e masculinos de escrever. Às vezes, detenho-me encantado com autores que redigem na primeira pessoa do singular sobre o gênero oposto. E, nesse campo, a belga Margueritte Yourcenar é imbatível ao se colocar como um jovem aristocrata que dirige longa carta à esposa. Mas, quero falar de outra situação que na corrente literatura brasileira começa a chamar a atenção. Mulheres brasileiras escrevendo sobre outras culturas. E são dois casos básicos: como imigrante e como intérprete do contexto distante.
A literatura brasileira é modesta em termos da abordagem da imigração. Nossa obsessiva busca pela caracterização do nacional brasileiro tem dado pouca estrada para ficções que situam dilemas identitários de estrangeiros. Se na raiz deste segmento tivemos Canaã, do inquieto maranhense Graça Aranha – que contemplou os imigrantes alemães no Espírito Santo – depois desse texto de 1902 apenas despontou o importante – ainda que minimizado pela crítica recente – O Estrangeiro, de Plínio Salgado, situando São Paulo como cenário. Em ambos os casos caracterizam-se os problemas de adaptação ao novo meio. Em Canaã, o personagem Milkau, otimista, julgava ter encontrado no Brasil a “terra prometida”; ao contrário do companheiro Lentz que não aceitava os trópicos e preferia reafirmar a alegada superioridade germânica. Plínio Salgado, representando o limite entre o romantismo nacionalista – de cunho ideológico – valeu-se da linguagem pretensiosamente moderna com a qual representa o professor Juvêncio e Ivã. Entre os dois o choque em que este, Ivã, representava a falência do binômio cidade-indústria e o outro, Juvêncio, a saída pela alternativa do campo. O debate sobre nosso destino nacional é empolgante, e, na correspondência trocada entre os dois nota-se o teor da crítica política. Frente a afirmativa de Ivã que dizia que “Este país nasceu velho como a nossa Rússia; e tudo quanto aqui fizerem não será mais do que acelerar a construção de novas barreiras e novos impossíveis”, Juvêncio contrapõe afirmando que o nosso caboclo é um tipo que já admirava “pela força hercúlea, feições bonitas e toadas dolentes”, era o único tipo real do Brasil.
Estas reflexões servem de pretexto para se pensar na abordagem masculina do fenômeno imigração e no que seria depois considerado pelas mulheres. Os homens quando não tratam de casos biográficos, cuidam sempre de contextualizar situações de julgamentos culturais onde o político domina. As mulheres não. Introspectivas – ou como diria Clarice Lispector “com o olhar curto” – desvelam um mundo íntimo, privado e pleno de mistérios aparentemente minúsculos. São dois os casos recentes que chamam a atenção. Um, “Amrik” da prolífera Ana Miranda e outra da imortal Nélida Piñon com suas “Vozes do deserto”.
Foi bom saber que Ana Miranda está casada com o cientista social Emir Sader para adivinhar como ela conseguiu captar um universo tão verossímil. “Amrik”, palavra que dá nome à formidável trama que envolve a dançarina Amina, significa América, segundo a pronúncia dos libaneses arribados em São Paulo. A narradora, a dançarina Amina, luta para sobreviver numa cidade difícil, onde busca um lugar pessoal, de liberdade. E sob todos os aspectos esse livro é marcante. Escrito com capítulos brevíssimos, a narrativa fragmentada assinala as interrupções impostas à vida de quem se ajusta a outro meio. É como dança que as palavras se movem e o ventre rápido dá conta dos significados.
Nélida Piñon é mesmo ousada. Como que anulando o espaço e o tempo brasileiros, recobrando seu ágil movimento feminino, vai ao passado e recria nada mais nada menos que Scherazade. O que se ergue é um alguém que transgride e reinventa um mundo de histórias onde o suspense é sinônimo da sagacidade máxima. Na aparência, nada há de brasileiro nisso, a não ser o fato de no Brasil alguém definir linhas ficcionais para uma discussão universal que inverte a direção da origem e recria o fundamento de uma causa.
Entre Amina – que vem para se descobrir em sendo dançarina – e Scherazade que se reinventa para mostrar o não limite pessoal, a liberdade, há um mar de sutilezas que se explicam pela brasileira e nossa generosa fortuna crítica.
Olá!
ResponderExcluirAssim que li post, lembrei imediatamente de vc. Um mangá com protagonista albina, vai ser lançado no Brasil: http://panini-fa.blogspot.com/2011/03/noticias-rapidas.html
Vou esperar o lançamento e acompanhar a história da Dorothea!