sexta-feira, 11 de março de 2011

PAPIRO VIRTUAL 18

O psicólogo e psicanalista Emílio Figueira é a prova de que pessoas com deficiência têm muito a acrescentar

Em entrevista, ele dá dicas para quem pretende publicar e cita o psicólogo russo Lev Vygotsky; “Uma limitação não pode ser vista como um impedimento pela vida"
Fabiano Alcântara

Se alguém duvida de que a inclusão de deficientes na sociedade é não apenas viável como necessária, o psicólogo e psicanalista Emílio Figueira, 41 anos, é um exemplo vivo. Eles nasceu com paralisia cerebral, teve a coordenação motora e fala comprometida e mesmo assim tornou-se autor de 26 livros e 86 artigos científicos publicados no Brasil e exterior.Doutor em psicanálise, Emílio estuda a aplicação da psicologia em pessoas deficiência, dedica-se à clínica da meia idade, escreve crônicas, textos para teatro, e a literatura sob o ponto de vista psicanalítico.
Você lançou recentemente “Como Escrever e Publicar Livros" (Agbook). O que é mais difícil, escrever ou publicar?
Emílio Figueira - Tanto no meu livro como nos cursos que ministro, falo do livro de não-ficção,enquanto um produto cultural, o qual uma editora investirá dinheiro para publicá-lo, divulgá-lo e precisará ter retorno nas vendas. Assim, escrever e publicar devem ser duas ações totalmente ligadas. Explico. Um erro de quase todos os autores é achar que sua idéia e genial, por isso fará sucesso e venderá milhões de exemplares. Mas os autores de sucesso mesmo, são aqueles que têm um público-alvo bem definido para sua obra. Conhece esse público, sua realidade, características, linguagem e necessidade de conhecimento. Assim ele escreverá de acordo com tudo isso, o que procura e anseia saber seus leitores. Buscando a editora especializada em sua temática, o editor também conhece esse público. Vendo os originais de acordo e viável com sua demanda, a publicação e veiculação da obra será certa. Claro, há tantos outros detalhes fundamentais, o livro precisará ter um algo a mais que seus similares, coisas assim...
O mercado independente de livros é viável?
Emílio - Lido com o mercado editorial desde 1986 e cada vez mais creio que o mercado independente será o caminho. Aqui podemos desmistificar um outro mito. Muitos ainda acreditam que sua história pessoal ou suas criações são geniais, que será só coloca-las no papel, enviar pelos correios à uma grande editora e sua obra será publicada e se tornará um sucesso editorial. Mas não é assim, há editoras como a Ática, Moderna, Scipione, FTC e tantas outras famosas que recebem em média, mil originais por dia, o que vale dizer trinta mil por mês. Pesquisas demonstram que de cada dois mil originais recebidos, apenas um seja publicado. E, para tal, ele passa por três avaliações editoriais, até chegar às mãos de editor-geral que dará a palavra final. Além do mais, essas editoras já tem o seu quadro fixo de autores. Então, vejo dois caminhos: trabalhar o seu livro como uma mídia bem dirigida conforme falei na primeira questão e batalhar para entrar nesse mercado competitivo. Ou partir para o mercado independente. Mas quais as vantagens desse mercado independente? Hoje você pode publicar com um custo quase zero. Fazer edições a partir de um exemplar, sob-demanda. Vendê-los para conhecidos à sua volta, parentes, amigos, alunos, colegas de profissão, em suas palestras, pela internet. Enfim, criar o seu próprio universo de leitores. Vou confessar uma coisa: Durante muito tempo, principalmente na adolescência, sonhei em ser um grande escritor; hoje, diante deste cenário editorial, se eu consegui ser apenas um escritor, já estarei realizado!
Qual é sua opinião sobre as discussões em torno da morte do livro?
Emílio - Pois é, já tive a oportunidade de rir muito com este assunto. Mais uma das grandes especulações da humanidade. Quando surgiu o rádio, diziam que ele mataria o jornal impresso. Quando surgiu a televisão, diziam que ela mataria o cinema. Veio o videocassete, o DVD, a internet, e diziam que eles matariam a televisão. No enquanto, todos esses meios de comunicações estão aí, vivinhos da silva, claro, com muito menos público devido a diversidade de escolhas que temos. O livro impresso e o ebook caminharão juntos. Mesmo porque, o mercado editorial brasileiro está em plena expansão. Segundo a Câmara Brasileira do Livro, 700 editoras nascem e, no total, cerca de 270 mil livros oficiais são publicados por ano no Brasil. E depois, temos milhões de livros publicados ao longo da história da humanidade. Não podemos destrui-los todos em uma “fogueira santa” em nome da tecnologia. Acho que mais de 90% dessas obras nunca serão republicadas; por isto, precisaremos delas vivas como uma eterna fonte de consultas.
Quais são seus autores literários preferidos e por quê?
Emílio - Durante muitos anos, há cada época me apaixonei por autores diferentes. Mas se tenho que citar alguns, digo: na literatura universal o meu preferido é Miguel de Cervantes por ter criados dois personagens em Dom Quixote tão ricos em interpretações psicológicas; na literatura nacional li toda a obra de Érico Veríssimo e aprendi muito com sua linguagem e estilo; gosto muito do Marcos Rey pelos seus romances bem paulistanos; poetas, aprendi muito com Manual Bandeira e Drummond, mas o meu preferido mesmo é Mário Quintana, com quem me identifico muito em minhas composições. Atualmente, estou redescobrindo e me apaixonando por Fernando Pessoa.
De que maneira espera que seu exemplo inspire a outras pessoas?
Emílio - Esta é a pergunta mais difícil. Realmente estou perdido para respondê-la. Mas acredito que posso provar uma coisa interessante. Se nós não corremos atrás de nossos objetivos, ninguém correrá por nós. E, quanto a minha condição física, quero citar o que dizia o psicólogo russo Lev Vygotsky. Uma limitação não pode ser vista como um impedimento pela vida; mas sim como uma motivação a mais para que a pessoa se autosupere e realize coisas imagináveis para a sua condição perante a sociedade!
(Encontrado em http://saci.org.br/index.php?modulo=akemi¶metro=31252)

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