Nosso cronista careca das quartas-feiras vem hoje com um texto entre bem-humorado e inquisitivo sobre pelos masculinos. Inusitado, mas revelador da versatilidade do professor Sebe, capaz de extrair leite de pedra, digo, de pelo!
ENFEITE DE HOMEM...
José Carlos Sebe Bom Meihy
Fazer a barba é um ritual pouco prezado. Melhor dizendo, é prática muitas vezes amaldiçoada. Não são poucos os homens que detratam o barbear diário e o comparam a exercícios aborrecidos, evitados, postergados. Já ouvi comparações estapafúrdias dizendo que o barbear cotidiano equivale à TPM masculina. Há outros, é verdade, que, à guisa de culto, cuidam de valorizar de diferentes formas o conjunto dos pelos no rosto. Com cavanhaques bem desenhados ou bigodes detalhados segundo padrões corriqueiros ou exóticos, não faltam os que ostentam virtudes que atestariam masculinidade e distinção. Esses passam tempo cuidando do rosto como se fosse garantia de sucesso. Alguns exemplares da fauna “testosteronada” insatisfeita com o branqueamento causado pelo peso dos anos tinge de maneira vibrante o que optam por mostrar no rosto. Tudo em nome da boa aparência.
Sou dos que preferem ficar sem barba, sem bigode, sem cavanhaque. Outrora tentei todas as formas e essas experiências serviram para garantir minha opção pela “cara limpa”. Confesso, contudo, que frente ao exigente dever diário desenvolvi alguns truques facilitadores. Com espuma farta, cubro a parte peluda que insiste em crescer e vou me divertindo, fazendo manobras arrojadas com o aparelho. Há algo de artístico nisso, pois inscrevi lances de solenidade no prosaico dever. Sim, transformo em comemoração esse ato de estrita intimidade pessoal. Tem dias que deixo cavanhaques de espuma, em outros permito costeletas atrevidas, há os que admito barbichas variadas. É bom cunhar ilusões provisórias e brincar com a própria cara na base do “como ficaria”. No comum das vezes, me recrio com bigodes estapafúrdios e assim saúdo o dia como se fosse Chaplin, Capitão Gancho, Clark Gable, Salvador Dali ou Brad Pitt. Jamais como Sarney ou Mercadante. Jamais. Depois dessa farra reservada, os sagrados quinze minutos que gasto em frente ao espelho me permitem olhar no fundo do que sou e garantir minha opção pela aparência mais simples. Esse contato pessoal me abre perspectivas para supor o que seria de minha aparência se ousasse admitir alguma arte capilar no rosto e garanto assim minha identidade.
Quando suposto no feminino, pelos na face evocam pânicos e dimensionam pavores eloquentes. Sei de mulheres que sacrificaram muito para se livrar do que é no máximo considerado “enfeite de homem”. Houve um tempo em que a ideia de mulher rejeitava presença de pelos expostos e isso as diferenciava dos exemplares masculinos, que deveriam ostentar pelos variados. Graças a essa ojeriza das mulheres, segmentos masculinos têm se beneficiado de avanços. Salões e academias se especializam na eliminação de pelos e agora se abrem para a clientela do sexo forte. Laser, cera quente, parafina, tudo tem sido adaptado para os candidatos a bonitões de plantão. Não deixa de ser engraçado o que se passa com o tratamento de pelos no corpo masculino atualmente. E não é mais a barba que motiva profissões novas no tratamento dos pelos masculinos. Parece que a “homarada” está fugindo da aparência viril e adere a visuais clean. Há algo de irônico nisso tudo, pois nem é preciso ser vidente para adivinhar que a população mundial composta por homens está a cada dia mais carente de cabelo. Basta uma olhada na rua para ver que o número de calvos cresce em ordem geométrica. Na mesma medida, se observa que os jovens, a cada geração, começam a ter menos pelos no corpo e os inevitáveis tardam a chegar. Hormônios? De todo jeito, como os pelos do rosto não caem, é como se ocorresse uma praga que inverte o espaço escolhido pelos cabelos. Há pessoas que, como eu, se despediram cedo dos topetes e se enviuvaram dos cabelos. Como tantos outros, ainda em tenra idade, comecei a fazer barba e, não bastasse, minhas sobrancelhas crescem muito, assustadoramente. Sei que não chego a me afigurar monstruosamente, mas há algo bizarro nisso tudo.
Pela cartilha estética contemporânea os pelos do corpo para os homens tornam-se elemento complicador dos padrões da moda. Não tenho como e nem porque ocultar que acho alarmante a depilação masculina. Não que tenha algo contra. Não mesmo, mas imagino o sacrifício e a falta de lógica em arrancar os pelos do peito e até das axilas. Deve doer muito e tudo para renascimentos insistentes. Garanto que contra a mania depilatória sempre haverá pessoas que renunciam arrancar pelos e atingiram o máximo depilatório no ato de se barbear. Esta conclusão me convida ao retorno do tema: enfeite de homem é bigode. Sem eles resta, com todo respeito, lembrar a famosa frase da saudosa Dercy Gonçalves: prá que bigode se homem já nasce enfeitado?
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