O Reino da Jordânia passou décadas sem produzir cinema, embora o país tenha servido de locação pra diversos sucessos ocidentais, como Indiana Jones e a Última Cruzada.
Captain Abu Raed (2007), co-produção com os EUA, serviu de mola pra indústria cinematográfica do país, além de ganhar alguns prêmios. Filme de estréia do diretor Amin Matalqa, jordaniano que vive nos EUA desde criança, onde estudou cinema. Por um lado, cooperação com a indústria norte-americana certamente trará benefícios técnicos ao país árabe e poderá tornar os produtos mais competitivos no mercado mundial. Por outro lado, pode também significar uma estandardização dos roteiros e modos narrativos, algo como filmes com cara ocidental (leia-se estadunidense), falados em árabe e ambientados em cidades da região. Ambas as coisas podem ser sentidas em Captain Abu Raed.
O enredo gira em torno dum velho faxineiro do aeroporto de Amã, que, confundido com um piloto de avião pelas crianças de seu bairro, assume a identidade presumida pelos infantes e começa a inventar-lhes histórias de aventuras. Abu Raed, viúvo solitário, afeiçoa-se por seus admiradores e progressivamente passa a interessar-se por seus problemas e tentar ajudá-los. É então que a trama assume contornos mais dramáticos e entra no tema da violência doméstica.
O ponto forte do filme está na tridimensionalidade das personagens e ações. Abu Raed torna-se o protótipo da figura do vovô benigno, mas por um momento titubeia. Em sua disposição pra consertar a vida dos meninos, Raed demonstra estoicismo e autosacrifício, mas também dá tiros pela culatra. Às vezes, se meter na vida alheia, ainda que pra ajudar, atrapalha mais ainda.
Amã, território virgem pras lentes de cine, apresenta logradouros fascinantes, proporcionando ao espectador uma viagem dentro das viagens do pseudo-capitão Abu. Nadin Sawalha, como Abu Raed, está muito bem, assim como os meninos principais. O estreante Matalqa é bom diretor de elenco.
O fato de ser seu primeiro longa explica alguns deslizes como o roteiro que soa excessivamente arbitrário; tudo programado pra sair certinho no final. Pede-se um pouco demais da platéia às vezes, como acreditar que um faxineiro de aeroporto jordaniano tenha um apê tão amplo... A influência ocidental talvez justifique o tom melodramático de alguns momentos e a trilha sonora um pouco artificial. Por que recrutar um compositor norte-americano (Austin Wintory) pra mimetizar música do oriente médio, quando a região tem tanto a oferecer? Além disso, a música tem o costume de aparecer em momentos-chave da trama, condicionando a emoção do espectador.
Feito pra agradar o mercado de “filmes de arte”, Captain Abu Raed é acessível, sensível, bem fotografado. Aquele tipo de película que nos faz sentir bem e emocionados no final.
Também nos apresenta um país árabe moderno, urbano, com mulheres pilotando aviões, muito maquiadas e sem burka. O cinema pode ser uma boa ferramenta pra percebermos o quanto temos em comum com pessoas que vivem tão distantes. Bem melhor do que depender dos comentários de jornalistas peudo-intelectuais e preconceituosos que xingam mulheres muçulmanas.
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