terça-feira, 2 de agosto de 2011

TELINHA QUENTE 23

Promessa Cumprida

Roberto Rillo Bíscaro


Na adolescência, repetia que teria todos os episódios de DALLAS. Décadas antes do DVD, imaginava que quando tivesse grana gravaria todos os capítulos pra revê-los a meu bel-prazer.
Uma das séries de maior audiência da história da TV, DALLAS estreou nos EUA em 2 de abril de 1978. A audiência foi modesta e os episódios eram meio independentes uns dos outros. Com o tempo, a série passou a ter o formato de novela (soap opera) e em 1980, tornou-se febre mundial. 360 milhões de telespectadores ligaram suas TVs pra descobrir quem atirara no vilão JR. Pilotos de avião anunciaram em pleno voo o nome do(a) autor(a) dos disparos; na Inglaterra, o episódio chegou cercado por forte esquema de segurança; conta-se que bares e restaurantes ficaram ás moscas na noite da exibição do episódio. Na primeira metade dos anos 80, a família Ewing reinou soberana no horário nobre e inspirou a criação de clones(Dynasty, FalconCrest).
Dizem que o fenômeno de audiência deve-se ao fato de DALLAS mostrar um mundo de opulência e poder numa época em que os EUA viviam uma recessão econômica e moral baixa com reféns em embaixadas iranianas, filas quilométricas pra comprar gasolina etc. Os Ewings sofriam, mas o faziam com estilo (muito, muito menos do que em Dynasty...). Por mais infeliz e bêbada que Sue Ellen estivesse, ela ainda usava perfumes de cem dólares a onça. Mas, dirigia um carro que estava mais pra empregado do rancho Southfork! Ah, as incongruências de DALLAS...

São inúmeros os relatos que dizem como as batalhas em DALLAS eram a única coisa interessante nas vidas de gente vivendo em pequenas cidades no interior da Noruega, por exemplo.
No Brasil, o show começou a ser exibido pela Globo, no final de 1981, se não me engano. A emissora exibiu as 2 temporadas iniciais de uma enfiada só, diariamente.
Fui fisgado no primeiro capítulo, onde a premissa do show é exposta. Bobby Ewing casa-se com Pamela Barnes, filha de Digger, arqui-inimigo dos Ewings. Consta que a história deveria girar em torno de Pam, uma vez que Bobby morreria no quinto episódio. Dizem até que a atriz Victoria Principal saudava os demais atores que entravam no set com um “bem vindo ao meu show”. Mal sabia ela que isso seria por bem pouco tempo.
De cara, meu personagem preferido foi JR Ewing, cujo ator Larry Hagman, animara minha infância como o Major Nelson de Jeannie é um Gênio. No primeiro episódio ele já mostra as garras tentando destruir Pam. Ela não é boba e vira o jogo. O episódio termina com JR falando “I underestimated the new Mrs. Ewing. Well, I surely won’t do that again.” (não precisei consultar o DVD pra essa citação...).
Bobby e Pam eram bonzinhos demais pro meu gosto. Lindos, mas sem graça. JR é quem dava sabor. Milhões de telespectadores antes de mim chegaram à mesma conclusão. Em pouco tempo, o que era pra ter sido um Romeu e Julieta transformou-se num painel de devassidão e luta pelo poder num clã petrolífero texano, centrado na figura do “homem que todos adoravam odiar”, JR Ewing. Eu não o odiava; torcia por ele! Quanto mais estrago JR fazia, mas eu gostava. Vai ver que expiava nele minha porção maligna. Talvez ele fizesse o que inconscientemente, eu gostaria de fazer.  
Identifico-me com os fãs das pequenas cidades que viam em DALLAS algo como compensação pra vidas despidas de grandes eventos. Morando em Penápolis, sem grana e enfrentando a barra do preconceito, talvez o show tenha me fisgado pelo mesmo motivo. Hay cosas que te ayudan a vivir, diz a canção de Fito Páes.

Quando a Globo passou a exibir a série após o Fantástico, eu saia de onde estivesse pra ir pra casa ver a família Ewing.  
O reinado da novela durou até 1985, na infame “temporada-sonho”. Patrick Duffy saiu pra tentar carreira no cinema. Face ao fracasso, decidiu voltar, mas havia um problema: Bobby morrera atropelado por Katherine Wentworth, a meia-irmã louca de Pam. A solução foi transformar toda a temporada em um sonho de Pam! Lembro-me vividamente do choque que senti quando Victoria Principal desperta, ouve o barulho do chuveiro, abre o box e Bobby diz o “good morning” mais notório da TV. Fiquei besta, não via a hora de chegar o domingo seguinte.   Grande parte do público não achou a sacada genial, porém. A temporada de 1986 marcou o começo da queda da casa dos Ewings.
Mas, por que adoro tanto um show cheio de incongruências, atuações medíocres e personagens infantis? Bem, por tudo isso e mais! O ritmo alucinante com que as coisas mudam (pra permanecerem iguais) sempre me encantou. Filhos bastardos, primeiros casamentos mantidos em segredo, alcoolismo, traições, enfim, quase tudo entrava no coquetel de DALLAS. Até um involuntário caso de incesto básico rolou!
Uma das primeiras cenas do show mostrava a ninfeta Lucy Ewing esbaldando-se no feno com o capataz Ray Krebbs. Temporadas mais tarde, descobrimos que Ray é filho ilegítimo de Jock, o patriarca dos Ewings. Logo, Lucy era sobrinha de Ray. Como Ray dormira com todo mundo (brincava-se nos bastidores que nem a velha Miss Ellie estava segura com o garanhão), os produtores perceberam a gafe tarde demais. A solução foi não tocar mais no assunto do affair Lucy-Ray.
Quando a Globo parou de exibir o seriado, ele foi pra Band que começou a exibi-lo desde o início, parando no final da temporada em que Sue Ellen atira em JR, depois que seu amante despencara da janela do apartamento. Ficaram faltando 3 temporadas pra eu assistir. Tive que esperar mais de 15 anos, mas finalmente pude vê-las este ano.
Em agosto de 2004, as 14 temporadas começaram a ser lançadas em DVD. Só então me animei a comprar um DVD player. Exato, comprei-o por causa de DALLAS. Este ano adquiri a temporada derradeira, além dos DVDs com os reunion movies e a prequel, de 1986.
A 12ª temporada já estava desfalcada de muitas personagens, como Lucy, Pam, Ray, Donna e Geena. Seria a última com Linda Gray, a Sue Ellen. Os produtores poderiam ter aproveitado e dado um final pra novela nessa temporada e evitar os momentos embaraçosos das 2 últimas.
Algumas plotlines das temporadas 13 e 14 deixaram-me literalmente irritado, embora já as conhecesse dos fóruns de fãs, frequentados desde meu primeiro dia de internet em casa.
Onde já se viu JR preso numa cidadezinha no meio do nada, sendo obrigado a se casar com uma mocinha caipira? Ou o mesmo vilão trancafiado num hospício?  Lucy Ewing retorna, mas sem função dramática, assim como Miss Ellie e Clayton (bem, ele quase nunca teve uma mesmo...) Até Cliff Barnes (argh!), Nemesis de JR, passa boa parte do tempo sem muito o que fazer. Desse modo, exceto por JR e Bobby, quase toda a ação fica em mãos de não-Ewings novatos na série. E DALLAS jamais teve tantos atores péssimos duma vez só, cruzes!
De vez em quando, faíscas eletrizantes que serviam pra lembrar com nostalgia dos áureos tempos.
Mas, como fã é cego, DALLAS segue sendo meu programa de TV predileto. Duvido que algum dia deixe de ser.
De todo modo, cumpri a promessa juvenil de possuir os 357 episódios pra revê-los quando quiser. De vez em quando, vejo um a esmo. Daqui a alguns anos, planejo ver tudo de novo, tipo um episódio por dia, pra ter a trama bem estruturada e presente na cachola. Coisas de fã doido.

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