A Teleprima
Foram décadas sem contato com o programa, o qual jamais saiu de minha cabeça, até porque guardo a excelente trilha sonora, comprada em vinil na época do lançamento, hoje modernamente preservada em mp3. Chorei quando Zilka Salaberry faleceu; afinal, ela foi meio avó de minha geração. Às vezes, visitava alguma página na net que trazia fotos ou via algum trecho no You Tube. Sempre dava aquela saudadezinha gostosa dos tais tempos que não mais voltam e clichês afins.
Nos primeiros anos da televisão no Brasil havia o fenômeno do televizinho, aquele que, não tendo o aparelho assistia à programação na casa de quem tinha. Conta-se que a coisa era tão corriqueira que os apresentadores dirigiam-se igualmente aos telespectadores e televizinhos pra desejarem-lhes boa noite. O termo ficou tão popular que consta até na edição século XXI do Novo Aurélio, mesmo que televizinho seja tão comum quanto um brontossauro hoje.
Quando eu tinha uns 10 anos – há mais de 30... – não mais se usava a expressão porque o contingente com telinha em casa devia ser expressivo. Não me lembro do Sílvio Santos ou do Chacrinha cumprimentando televizinhos. Eu tinha uma teleprima, porém.
Em casa, possuíamos televisor branco e preto, assim, todas as tardes dirigia-me à casa da Irene e do marido Didi pra ver o Sítio do Picapau Amarelo na TV colorida da prima de mamãe.
Monteiro Lobato foi meu primeiro autor predileto. Devorara toda sua obra pra crianças antes dos 11 anos de idade, quando entrei pra quinta série e entrei na geração das borboletas atírias e escaravelhos do diabo.
Quando a versão global setentista do Sítio estreou tornei-me fiel seguidor e ver colorido era outra coisa. Que lindo o Reino das Águas Claras e o rinoceronte Quindim. Não tinha graça ver aquela superprodução em preto, branco e tantos tons de cinza!
Foram décadas sem contato com o programa, o qual jamais saiu de minha cabeça, até porque guardo a excelente trilha sonora, comprada em vinil na época do lançamento, hoje modernamente preservada em mp3. Chorei quando Zilka Salaberry faleceu; afinal, ela foi meio avó de minha geração. Às vezes, visitava alguma página na net que trazia fotos ou via algum trecho no You Tube. Sempre dava aquela saudadezinha gostosa dos tais tempos que não mais voltam e clichês afins.
Há algumas semanas peguei emprestado 2 DVDs com aventuras do Sítio anos 70.
Primeiro revi O Minotauro, de cuja história, cenas e atores me lembrava tão bem! Talvez pra velocidade da meninada contemporânea a introdução e o desenvolvimento do enredo sejam lentos demais. Divertido ver um Teseu não-bombado. Se fosse hoje, duvido que o fisicamente fraquinho Gracindo Jr. fosse escalado pro papel. E que delícia ver Fábio Mássimo, Lúcia Alves, Lena Krespi e tantas outras faces e vozes da infância. Diversos coadjuvantes também atuavam como dubladores de filmes e desenhos, então gozei de viagem polissêmica associando voes e rostos nacionais a rostos e vozes de personagens estrangeiros igualmente evocativos.
Depois rememorei As Memórias de Emília, que tem sabor de compilação de histórias passadas. Embora tenha rido muito com a esperteza da boneca no que diz respeito à teoria literária (algumas de suas observações sobre a escrita autobiográfica são imapagavelmente verdadeiras), eu preferiria ter visto cada história na sua integralidade, exceto pela do anjinho, que 3 décadas depois ainda consegue me irritar com aquele interminável “saudade”!
Claro que não se tratou apenas duma viagem sentimental no tempo. O Sítio do Picapau Amarelo foi um programa de alta qualidade técnico-pedagógica, numa época em que efeitos especiais na TV brasileira eram na base do heroísmo. Até os bonecos utilizados tinham que vir da Europa, devido à incipiência de nossas condições. Sem contar que o PROJAC não existia, o que implica na inexistência de cidades cinematográficas e recursos materiais à mão e em abundância, como hoje.
Só agora me dei conta de que as personagens lobatianas do paulista Vale do Paraíba tinham sotaque carioca na versão global...
Sobretudo, recordei-me de tantas idas, vindas, prosas e estadias na casa da teleprima Irene e do esposo Didi, que me emprestava enciclopédias. Irene partiu em 86, se não me engano. Didi se foi há alguns meses, após 2 décadas e meia de solidão. Sempre que passo defronte à casa (que provavelmente será remodelada pelos novos proprietários), lembrar-me-ei deles e do Sítio do Picapau Amarelo.
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