A Afilhada de Amy
Roberto Rillo Bíscaro
A última aparição pública da trágica Amy Winehouse
aconteceu poucos dias antes de seu falecimento, em um show da afilhada Dione
Broomfield, que lançava seu segundo álbum.
O sucesso de Back to Black deflagrou uma minionda de
nepotismo. O pai de Amy lançou álbum e começou a fazer shows (ele se
apresentava em Nova York quando a filha morreu) e a madrinha anunciou
Broomfield como sua possível sucessora, afirmando que a garota de então 13 anos
era melhor que a mentora na mesma idade.
Frente ao carnaval de mídia cercando o lançamento de
Introducing Dionne Broomfield (2009), chequei um par de canções no You Tube. A
petulância de batizar o álbum quase como o Presenting Dionne Warwick (1963) me
divertiu e a seleção de covers da soul music me interessou. Não passei da
audição online. A adolescente não fez feio, mas, prum 40tão, ela não tinha nada
a acrescentar a clássicos como Ain’t No Mountain High Enough.
Não fiquei bravo. Em minha juventude fui introduzido a
clássicos Motown por branquelos ingleses como Phil Collins ou Kim Wilde. Os
críticos detonavam as releituras, mas foram elas que marcaram essa fase de
minha vida. Por mais que eu reconheça que You Can’t Hurry Love e You Keep Me
Hanging On são melhores com as Supremes, insisto em carregar Collins e Wilde em
meu mp3. Por que os jovens atuais não poderiam fazer o mesmo com Broomfield?
Quando Good for the Soul foi lançado em julho, pensei
em novamente checar algumas canções no You Tube e boa. A morte da madrinha me
fez querer escutar o álbum inteiro, porém.
Good for the Soul é uma coleção de canções inéditas,
dando sequência ao coquetel retrô de soul, rhythm’n’blues e outras antiguidades,
tipo Phil Spector, do primeiro álbum. Se pra mim, essa sonoridade é antiga,
pruma menina de 15 anos é pré-histórica! De vez em quando, uma piscadela trip
hop ou electronica pra salpicar o trabalho com alguma contemporaneidade.
Os arranjos e a produção são impecáveis, o que não é
mais do que obrigação, afinal, parte do time era o que trabalhou com Wino.
Yeah Right abre o álbum com um funk rappeado,
sinalizando que Dionne é uma teen do século XXI e não dos anos 60. Ouch That Hurt é bem Motown e A Little Love é
informada pela Wall of Sound, de Phil Spector. Co-autora de várias
canções, Broomfield atualiza as influências de black music norte-americana que
possui, misturando-as com ska e pop.
Mas, a menina ainda tem apenas 15 anos e por mais
simpático que soe, Good for the Soul carece de maturidade vocal. Há que se
resistir á tentação de compará-la com Winehouse, embora o timbre anasalado da
garota lembre o da protetora e em vários trechos fique clara a tentativa de
imitá-la. Mas, Wino já possuía a experiência e a dor necessárias pra encharcar
suas canções com aquela qualidade pertencente às grandes.
A afilhada é jovem demais pra isso, o que neutraliza o
impacto que poderiam ter canções como Remember Our Love e Good for the Soul. Quando
ouvi a urbana Foolin’ não deu pra evitar o desapontamento no verso “You’re
the best teacher that I ever know”. Daria frêmitos de prazer numa voz mais experiente.
Há uma pérola perdida no meio do álbum, porém. Too Soon to Call
It Love é uma canção pop deslizante com genes de Burt Bacharach no arranjo.
Quando a voz de Broomfield se permite a doçura debutante do refrão é como se o
Mestre andasse de patins pela Califórnia na adolescência. A única canção que
vai pro meu mp3 e permanecerá pra sempre.
No cômputo geral, Good for the Soul também não acrescenta quase
nada a públicos maduros. Não diria que Dionne deveria esperar mais pra gravar,
porque os adolescentes também merecem ter/ser ídolos. Por outro lado, algo
poderia ser dito a respeito da sexualização duma garotinha começar tão cedo,
aos 13 anos.
A madrinha se foi e Dionne Broomfield dá provas de
estar maturando. Se resistir à pressão em se tornar a “próxima Amy Winehouse”,
a mocinha tem chances de produzir coisas bem legais.
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