terça-feira, 18 de outubro de 2011

TELINHA QUENTE 27


Crônica Duma Paixão Anunciada

Roberto Rillo Bíscaro

Em setembro do ano passado estreou Downton Abbey, no canal inglês ITV, ambientada no período eduardiano e com elenco de primeira (Hugh Bonneville, Dame Maggie Smith etc.). Cada episódio custava um milhão de libras e logo a série virou mania entre público devoto e crítica laudatória, abocanhando prêmios na Inglaterra e no estrangeiro.
Tinha tudo pra me deslumbrar: sotacão britânico, gente chique, casarão, mas não pude começar a ver os 6 episódios da primeira temporada até há cerca de um mês, quando a segunda já está pra lá da metade na Inglaterra. Nem alcançara o meio do primeiro episódio e já me apaixonara por Downton Abbey. Muito bem escrita, a série é daquelas que se tem de ver mais de uma vez pra adentrar/adensar nos detalhes.
Downton Abbey é a vasta propriedade do Conde de Grantham, que se casara com uma norte-americana pra salvar o patrimônio. Seu pai fundira a fortuna ianque à do tradicional clã inglês de tal modo que tudo passou a ser uma coisa só, que seria herdada pelo primogênito do nobre. Mas, ele teve apenas filhas e mulheres não herdavam (lembrem-se das irmãs Dashwood, em Razão e Sensibilidade). Pra manter a fortuna e o título com os Crawley, foi arranjado o casamento de conveniência da filha mais velha, Lady Mary, com um primo.
A série começa com a notícia de que o noivo arranjado perecera no Titanic. Logo, a propriedade, título e fortuna iriam pra outro primo, Mathew, advogado de Manchester. Vulgar demais pros aristocráticos Robert Crawley e família: alguém com um emprego e vindo da industrial Manchester? Mathew e a mãe vem viver perto da propriedade e abre-se excitante painel de intrigas, amores e costumes magistralmente enovelados no roteiro de Julian Fellowes. Downton Abbey é TV de qualidade e multicamadas, mas nunca esquece de sua filiação folhetinesca: a trama sempre anda, movida a surpresas e ingredientes como gente má, falsidade, amores complicados, fofoca e algum humor.
Não acompanhamos apenas as vidas dos patrões. Mais interessantes são o burburinho e as intrigas e esperanças entre os serventes e sua interação com os nobres, que envolve admiração, respeito, amor, dependência e ressentimento de classe. Há horas em que Downton Abbey funciona como versão estendida de Vestígios do Dia (1993) e Gosrford Park (2001).
A segunda década do século passado marcou o declínio da Inglaterra (em 1913), o PIB estadunidense já era o primeiro) e da aristocracia rural e seus costumes, estas últimas já muito combalidas. Automóveis, eletricidade, telefone, voto feminino, preferência pelo emprego de secretária ao de empregada numa casa senhorial, maior equidade até mesmo num simples concurso de rosas; o roteiro usa esses e outros elementos para marcar a mudança e declínio de um país/modo de vida.
Os diálogos são inteligentes e carregados de certo tipo de humor britânico, irônico. O dinheirão gasto em cada capítulo foi bem aplicado, uma vez que a produção é impecável.
Ansio pelo fim da segunda temporada pra vê-la em sua integralidade. Por enquanto, desfruto de entrevistas com o elenco, sátiras no You Tube (a BBC fez uma impagável com Jennifer Saunders e Joanna Lumley, da’lin’!), participação de páginas de aficionados no Facebook e repetida audição da envolvente trilha sonora. Downton Abbey entrou direto pra minha lista de programas mais amados, que sempre reverei.
Essencial pra anglófilos e apreciadores de boa contação de (H)história.

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