Dando sequência a suas conjecturas sobre o amor, nosso cronista
mostra-se incurável romântico!
CRÔNICAS AMOROSAS
José Carlos
Sebe Bom Meihy
Sempre que escrevo, antes de considerar o texto acabado, gosto de ouvir
opiniões amigas. Quando tempo há, escolho pessoas de acordo com um casamento
imaginário de crítica e correção. Confesso, sempre que isso se dá me vejo feliz
com os resultados. Escrevi faz pouco tempo sobre a transformação histórica do
amor. A crônica chamava-se “A invenção doamor”. Dividido em etapas, o sentimento em sua configuração atual foi
inventado no século XII, a partir da linda e trágica relação de Tristão e Isolda. Redigido o texto,
enviei a três pessoas e, de modo geral, todos responderam dizendo que não
deixei espaço para o “bom amor”,
aquele que pode dar certo. Vendo-me como pessimista, entendi que deveria propor
outro. Bastou isso para dar nascença a esta crônica que corrige a rota
possivelmente desviada da mensagem anterior. Aviso logo que sou tesmunha viva
de histórias amorosas felizes.
Sim, acredito que mesmo navegando nas águas do “amor líquido” (evocando sempre Bauman), há espaço para a realização
do “bom amor”. Eu mesmo vivi tal
situação e multiplico amigos que experienciam tal ventura. Mas, não há como
negar que os tempos mudaram. A fidelidade, por exemplo, padece novas afrontas.
Vejamos, por exemplo, o curioso debate sobre a lealdade virtual. A discussão
sobre traição via internet é das mais férteis que se conhece. Afinal, sexo
virtual é aceito? Vale considerar como sexo praticado o desejo estabelecido a
partir de situações à distância e mediada por aparelhos eletrônicos?
Logicamente, este debate tem anterioridades. Quem não se lembra dos argumentos
usados por Bill Clinton no rumoroso caso da Ms Monica Lewinsky, quando se
afirmava que tecnicamente não teria havido relação, pois esta seria determinada
pela conjunção carnal que, ao que tudo indica, não houve? Bobagens? De toda
forma, ficou mais difícil estabelecer os limites da fidelidade. Por lógico, não
cabe desconhecer as linhas defensoras de que uma coisa é sexo e outra o amor.
Como se fazer sexo fosse uma espécie de ginastica, algo natural e biológico,
tantos são os que desprezam a relação afetiva em favor da dita “aliviada”. Tudo
como se fosse mecânico e descartável. Na mesma ordem, há os que não abrem mão
da relação plena, capaz de justificar o “bom
amor”, a troca de afetos. Dia desses, ouvi uma expressão estranhamente
cativante. Um quase senhor me explicava que era adpeto do “sexo progressivo”. Ante minha dúvida ele dizia “professor, não tem rock progressivo? pois é,
tem também sexo progressivo.” Desdobrando o profícuo argumento, me era
explicado que em relacionamento que comunga amor e sexo, as manifestações
afetivas íntimas tinham que caminhar para uma progessão geométrica, criativa,
cumulativa de carinhos, carícias e emoções, senão...
Mas, tudo isso me faz perguntar como são vistos hoje os padrões
amorosos. Achei dia desses, lendo uma cronista que ganha destaque galopante
entre nós algo que pode resumir o meu amplíssimo entendimento da matéria. Dizia
Marta Medeiros “sentem-se amados aqueles
que perdoam um ao outro e que não transformam a mágoa em munição na hora da
discussão. Sente-se amado aquele que se sente aceito, que se sente bem-vindo,
que se sente inteiro. Sente-se amado aquele que tem sua solidão respeitada,
aquele que sabe que não existe assunto proibido, que tudo pode ser dito e
compreendido. Sente-se amado quem se sente seguro para ser exatamente como é,
sem inventar um personagem para a relação, pois personagem nenhum se sustenta
muito tempo. Sente-se amado quem não ofega, mas suspira; quem não levanta a
voz, mas fala; quem não concorda, mas escuta. Agora, sente-se e escute: eu
te amo não diz tudo”.
Foi pensando nisto que estabeleci uma moldura para minha análise. O amor
em tempos modernos pode existir sim, mas a complexidade dos sentimentos demanda
bordados com diferentes cores. O desenho proposto é sempre inovador e os rumos
da relação se emendam no compromisso continuado. É aí que reside o grande
segredo das relações: diálogo. Diálogo aberto, daqueles que projetam futuro e
permitem supor que o amor se materializa no afeto expresso, mas não só nele:
não basta dizer “eu te amo”. Aliás, mais do que dizer “eu te amo” é preciso ter
projetos comuns e esses exigem que um par olhe para o outro expressando a
vontade de ficar juntos. Unicamente competados.
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