Roberto Rillo Bíscaro
(Em memória de Thiago Bíscaro)
Não sei se o resto do Brasil curtiu a série Anos
Incríveis nos anos 90. A TV Cultura (emissora pública estadual paulista) exibiu
as 6 temporadas diariamente entre 93 e 94, acho. Virou febre, e olha que o
programa competia com novelas globais e o escambau. Mas, lembro-me de que quase
todo jovem que conhecia, adorava o programa. Era uma luta nos lares com apenas
um aparelho de TV, convencer os pais a nos deixarem ver o programa ao invés do
Jornal Nacional...
Sempre lembro de meu sobrinho mais velho, Thiago, com o
qual via o show quando podia. Ele imita o “ó Kevin”, meio sem vida da dublagem
da Winnie Cooper. Parece que ele comprou a série em DVDs piratas. Se chegou a
ver tudo, jamais saberei.
Passei os últimos meses (re)assistindoa todos os
episódios.
A ação se passa num subúrbio de classe-média qualquer
nos EUA, no período de 1968 a 73. Vietnã, lua, Rolling Stones, liberação da
mulher, direitos civis dos negros; o protagonista Kevin Arnold, sua família e
amigos, passam por tudo isso e, embora não participem de protestos e batalhas
de rua, a História invade suas vidas e casas.
Kevin é um garoto nada especial, o que confere charme à
história. As “lições de moral” ficam a cargo do narrador, um Kevin já adulto,
rememorando o passado e sumarizando lições aprendidas, não na infância mesmo –
uma vez que as ações de Arnold em conjunto durante a série desmentem muitas das
coisas “aprendidas”. É esse contraponto que torna o show inteligente.
Por ser um menino “comum”, as expectativas edificantes
do telespectador são frustradas. Quando cremos que dirá/fará algo maduro e/ou
inteligente, ele se comporta como um garotão.Essa quebra de expectativas torna
The Wonder Years um produto moderno e inovador, considerando-se que começou a
ser exibido nos EUA no final dos anos 80. E em TV aberta.
A grande sacada da série é mostrar que não existem
vidas “comuns”. Qualquer experiência pessoal é rica, as mínimas coisas da vida
adquirem significado mastodôntico. Todos somos especiais e a aparente
padronização suburbana esconde existências preciosas.
O que cativa, sobretudo, é a simpatia do elenco,
especialmente dos atores-mirins. Como resistir á doce Winnie Cooper - interesse
romântico de Kevin – cujas aparições eram frequentemente acompanhadas dum primaveril
dedilhar de violão?
E o nerd alérgico a tudo com óculos gigantes, Paul
Pfeifer? Pena que nas últimas temporadas seu papel diminuamuito. Pra desfazer uma
lenda urbana: o ator Josh Saviano NÃO se tornou o roqueiro Marilyn Manson
quando cresceu. Ao invés, ele abandonou a carreira artística e foi pra Harvard,
bem ao estilo de sua personagem.
Quando as crianças crescem, o show perde bastante de
sua graça. Na sexta temporada, Fred Savage (hoje, diretor de TV) tinha 17 anos
e perdera o frescor da meninice. Na verdade, nós fãs não nos sentimos
confortáveis, creio, com Kevin dando o maior amasso em Winnie. Pode até ser
recalque ou repressão, caretice, mas foi a própria série quem investira nessa
imagem, então, a culpa é dela!
A narração final do último capítulo – quando aprendemos
o destino das personagens principais – dá nó na garganta, como diversos outros
ao longo dos anos. Como esquecer Mr. Collins, professor de matemática, que
ensina muito mais do que contas a Kevin? E olha que o mestre aparece em apenas
2 episódios!
O dia em que Kevin vai com seu pai ao escritório, o vê
sendo maltratado pelo chefe,e começa a se dar conta de que Jack Arnold não é o super-herói
que fantasiava é igualmente memorável.São muitos episódios de excelente nível,
colocando The Wonder Years na linha de frente das melhores produções de sua
época.
Diz-se que um lançamento em DVD é improvável devido à
miríade de canções dos anos 60/70 constantes da rica trilha sonora. Coisa de
direitos autorais, cessão de direitos, sei lá. Enquanto isso, o mercado de DVDs
piratas, feitos a partir de gravações da TV, vai bem obrigado.
Guardarei
Anos Incríveis pra rever quando for sessentão e estiver rememorando os meus,
que certamente serão os anos 80.
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