Roberto Rillo Bíscaro
Tenho o filme O Visitante (The Visitor - 2007) há mais tempo do que gostaria de me lembrar, mas evitava-o por receio de me decepcionar com o modo com que o tema “jovem imigrante encontra velho norte-americano solitário” seria tratado. Cada vez tenho menos estômago pra narrativas que incumbem os desvalidos de trazer a alegria de viver perdida aos de barriga cheia e cama vazia.
Tenho o filme O Visitante (The Visitor - 2007) há mais tempo do que gostaria de me lembrar, mas evitava-o por receio de me decepcionar com o modo com que o tema “jovem imigrante encontra velho norte-americano solitário” seria tratado. Cada vez tenho menos estômago pra narrativas que incumbem os desvalidos de trazer a alegria de viver perdida aos de barriga cheia e cama vazia.
O episódio sobrealbinos em Harry’s Law não ajudou em nada, mas, chegara a vez do filme que
trouxera a indicação ao Oscar a meu amado Richard Jenkins, de A Sete Palmos. Alguns
artistas têm esse poder sobre mim: podem trabalhar em que filme for, que
assisto. Pode demorar, mas vejo! E quando mais Jenkins será indicado ao Oscar,
já que é sessentão, calvo e nada galânico?
The Visitor
centra-se num professor universitário viúvo e desanimado. Quer aprender a tocar
piano, mas não tem realmente talento pra isso. Forçado a participar dum
congresso sobre globalização em Nova York, Walter deixa a paroquial Connecticut
pra ficar alguns dias em seu nunca-visitado apartamento na multiétnica Grande Maçã.
Qual sua surpresa quando se depara com o imóvel invadido por 2 ilegais: o sírio
Tarik e sua namorada senegalesa, Zeina. Convidando o casal de estrangeiros a
permanecer no apartamento, Walter Vale deixa a teoria da globalização e passa a
viver sua prática, nem sempre feita de liquidez e plasticidade fronteiriças
como querem alguns, crentes de que a posição de um punhadinho representa a de
todos.
Tarik toca tambor
e o ritmo “cardíaco” hipnotiza Walter, muito mais do que o do racional piano
clássico. O contato com o outro oriental retira o véu (Walter Vale... veil..)
que encobria essa outra possibilidade de vida.
Um estúpido
incidente com Tarik no metrô, porém, rasgará de vez o véu de Vale. Preso, o
imigrante tem poucas chances de ficar numa América hostil a palestinos depois
do 11 de Setembro. Quase no final do filme, perante a impotência em ajudar
Tarik, Vale explode dizendo que os cidadãos não são crianças. Embora The
Visitor se esforce pra focar o lado pessoal da situação, pro bom entendedor o
estouro do senhor de meia-idade é politicamente desmentido pela história.
Enquanto o
músico está encarcerado sua mãe vem pra apoi-a-lo mesmo impedida de vê-lo, uma
vez que seria capturada também. Interpretada pela excelente Hiam Abbass (de
Lemmon Tree e A Noiva Síria), a viúva ao princípio surpreende-se com a
negritude de Zeina; detalhe esperto do roteiro, que aponta pro preconceito
também entre grupos oprimidos. A aceitação da senegalesa, todavia, representa o
possível caminho de eliminação de fronteiras.
Outra
possibilidade de congregação entre os povos dá-se nas ternas cenas finais entre
ela e Walter, sinalizando o que poderia ter sido a reconstrução da felicidade
em um planeta efetivamente globalizado e “líquido” para todos.
Convencionalmente
narrado e plurinacionalmente interpretado (também sinal duma utopia fraterna
pro planeta), com destaque pra discrição de Richard Jenkins, The Visitor não
foge de todo do esquema fílmico desse tipo de película, mas encanta pela
sutileza e generosidade com que trata suas personagens. Pena que o mundo não as
trate igual.
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