Roberto Rillo Bíscaro
Enquanto assistia a The Stonning of Soraya M. (2008), pensava em como é importante não se restringir a uma fonte única de informação ou entretenimento. Se eu não tivesse tantos filmes iranianos no currículo ou acreditasse que representações culturais representam a realidade desinteressada e imparcialmente, o filme teria cumprido seu papel redutor com eficiência.
A história real da iraniana condenada à morte por
apedrejamento é o tema da película, roteirizada e dirigida com mão pesada por
Cyrus Nowrasteh. O nome conta o fim da história, por isso, o foco da atenção é
no processo que culminará na execução, sadisticamente filmada numa sequência
lenta, longa e agônica. Bastante desnecessários os detalhes, aliás. Não preciso
realmente ver um caco de vidro entrando num pé pra saber que não quero isso pra
mim ou pra outrem. Mas, dentro do filme, a cena faz sentido, desde que situemos
a produção em seu devido nicho: propaganda política. Isso explica a cena, mas não
a abona, claro.
Após a derrubada do xá Reza Pahlavi, em 1979 (cruzes,
eu lembro disso!), o Irã caiu nas mãos de aiatolás e mullahs com suas leituras
fundamentalistas do Corão. Nesse contexto, desenrola-se o drama de Soraya, cujo
marido quer o divórcio, mas, não o obtendo, trama pra que a aldeota acredite
que sua esposa o trai com um viúvo para o qual o próprio conselho da cidade
indicara o trabalho de Soraya. Como o mullah local foi rejeitado pela bela
Soraya, ele auxilia o esposo no complô, que culmina em até o pai e os filhos atirarem
pedras nela.
Repulsivo e moralmente odioso, sem dúvida, mas temos
que refletir um pouco sobre o filme, que despolitiza a situação e faz a ação
correr em espaço de dias, muito no compasso duma tragédia.
Soraya tem uma tia desbocada que representa a suposta
liberdade perdida após a revolução de fevereiro de 1979. 2 ou 3 frases aludem a
um clima de maior tolerância antes dos aiatolás. É certo que Pahlavi propunha o
voto feminino, mas também é correto que seu reinado foi marcado por muitos
desrespeitos aos direitos humanos, com milhares de presos políticos, além de
apedrejamentos, que não são invenção aitalolática.
Uma das personagens usa o fato de não haver propriedade
privada no país, para justificar o confisco de fitas dum jornalista. Clara
ferroada anticomunista (e o Irã, não o é, não se iludam!). Basta uma rápida
pesquisa pra descobrirmos que o xá derrubado suprimiu adivinhem qual partido?
Repito,
apedrejamento é repulsivo, mas o filme tem uma agenda política clara de
demonização do atual regime em prol do anterior. Algo como preferir o diabo ao
capeta!
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