domingo, 22 de janeiro de 2012

A SUPERAÇÃO DE RODRIGO


Apaixonado por motos desde os 14 anos, Rodrigo começou a pilotar com o seu irmão, mais novo que ele. Gosta de adrenalina e da sensação de liberdade. Assistia aos pilotos americanos de MotoCross e sonhava em um dia ser um aventureiro de Freestyle. “Eu ainda pensava: pô eles sempre fazem as mesmas coisas. Será que não é hora de alguém entrar com uma manobra nova?”, lembra Rodrigo.
Não se contentava em só pilotar. Queria também entender motos. Dos 15 aos 19 anos foi mecânico e ao falar disso, soltou uma das colocações que me marcaram. “Tenho vontade de melhorar as coisas. Achava legal pegar uma moto quebrada e transformar ela em quase nova”.
Logo depois do acidente, a sua vida mudou por completo, mas o que mudou primeiro?
O mais básico. Eu cheguei em casa e não conseguia fazer nada sozinho, nem comer, nem me vestir, nem ir ao banheiro, nada. A minha mãe ficava comigo o tempo todo, fazendo tudo. Eu recuperei um pouco de independência, mas devagar. Já faz mais de um ano que o acidente aconteceu. Eu também não sabia muito se eu queria continuar vivendo, ou não. A força que eu tive dos meus pais foi muito importante.
Essa recuperação de independência começou como?
Um dia a minha mãe estava ocupada e eu queria tomar banho. Meus braços ainda funcionam, então eu dei um jeito. Fui me arrastando pelas paredes e consegui. Não queria que minha mãe continuasse a fazer tudo por mim, então resolvi começar a me virar, do jeito que dava.
No meio de tudo isso, você passou por uma recuperação emocional também. Emocional e mental.
Pois é. Antes do acidente o pessoal sempre ia pra minha casa [Eu me mudei de Colombo para Cerro Azul] e meus amigos me chamavam pra sair, dar uma volta e tal. Depois do acidente os meus amigos foram se afastando, acho que pensavam que não daria mais pra gente sair junto, pensavam se teriam que ficar me empurrando, sei lá. Acho que isso é normal, mas seria mais fácil se eu tivesse mais gente perto de mim.
Você fez fisioterapia e recentemente conheceu a ADFP (Associação dos Deficientes Físicos do Paraná). Como foi procurar essas coisas todas?
A gente teve sorte. A Dona Vera já foi minha sogra e perdeu uma filha em um acidente de carro. Ela que apontou os caminhos. Ficou muito perto da minha família e foi indicando pessoas. Sem ela seria bem mais complicado buscar ajuda, porque a minha mãe não iria saber por onde procurar. Ninguém imagina que esse tipo de coisa vai acontecer com alguém perto de você.
A matéria da Gazeta falou que você era um cara namorador. Como é isso agora?
(Risos) Depois do acidente até rolou uma namorada. Era a filha da Dona Vera, a menina com quem eu já tinha namorado, acredita? Quando ela soube o que tinha acontecido, quis se aproximar de mim, cuidar, acho. Mas aí veio uma sensação estranha, achei que ela estava querendo ficar comigo por dó. Até o dia que eu confirmei isso e não quis mais. Dó não é bom pra ninguém.
Eu acho que isso é um assunto meio complicado ainda. Ás vezes a gente até percebe que tem uma menina querendo se aproximar, ter contato. Mas ela pensa “Poxa, ele está numa cadeira de rodas. Como vai ser? O que os outros vão pensar?”. Acontece.
Como você vê o mundo hoje?
Eu olho para as pessoas de outro jeito. A gente entende melhor o que a pessoa está pensando, ou pelo menos dá mais atenção para essas coisas. Parece até que eu fiquei mais inteligente depois do acidente (Risos). Comecei a me relacionar com as pessoas de outro jeito, eu penso mais nas coisas.
Hoje eu tenho vontade de fazer o bem, de falar com as pessoas, de contar a minha história. Eu tenho dois braços que funcionam, uma mente que pensa e uma boca que fala normalmente. Dá pra fazer muita coisa ainda.
O que você quer pro futuro?
Voltar a estudar. Quero ser arquiteto, acho legal pensar em como construir as coisas. Larguei os estudos faz tempo, estudei até a 5ª série, mas sei que é importante voltar.
Depois de conversar por um tempo com Rodrigo, fui falar com a mãe dele, a Fátima, mãe de outros dois meninos. Uma mulher simples na fala que me deu outro ponto de vista sobre o que aconteceu e sobre o que mudou na vida da família. “Ele passou cinco dias em coma. Eu demorei muito para criar coragem e ir visitar o meu filho no hospital. No dia que eu fui, ele saiu do coma”, conta Fátima.
“Meu filho voltou a ser criança pequena. Não fazia nada sem mim e é muito difícil lidar com isso. A gente sempre pediu muita força e rezou bastante. Não pode desistir, né?”
Quis saber como foi a batalha particular dessa mãe. Como é para os pais? Por onde começar? Com quem conversar?
“Ter a Dona Vera por perto foi um presente. Ela foi como uma segunda mãe para o Rodrigo e ajudou muito a gente. Eu até encontrei outras mães e vi que é realmente complicado agüentar por muito tempo. Conheci mães que desistiram, não aguentaram e largaram mão”, lamenta a mãe de Rodrigo.
No fim da conversa ela me disse uma coisa que me fez pensar muito. A esperança maior é algo delicadíssimo de lidar. Fátima, assim como muitas outras mães, tem a esperança que o filho volte a andar e acredita em um milagre. Fiquei pensando nessa palavra. Milagre.
O Rodrigo bateu em um caminhão, deu uma pirueta com a moto e esmagou a nuca em uma mureta de concreto. Ficou em coma por cinco dias e precisou ter a cabeça dos dois fêmures cerradas. Teve a sua vida interrompida no período de transição entre a adolescência e a idade adulta e agora lida com escaras, feridas na pele comuns entre pessoas sem mobilidade em alguma parte do corpo.
Mesmo com tudo isso, ele tem “braços que funcionam, uma cabeça que pensa e uma boca que fala”. Será que o milagre não é esse?

Um comentário:

  1. Ve como a vida pode mudar derrepente . ele mesmo declara :( hoje eu tenho vontade de faser o bem ). ..Muitas veses de um momento para outro nos transformamos ... ou para melhor ou para pior ..Miguel

    ResponderExcluir