sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

PAPIRO VIRTUAL 30

Roberto Rillo Bíscaro

Terminei a deliciosa trilogia campesina-aldeã da britânica Flora Thompson. Candleford Green (1945) mostra a adolescente Laura e seu relacionamento com a população do minúsculo distrito, que para a garota tem porte de cidade, uma vez que vem da aldeota Lark Rise.
O terceiro tomo guarda semelhanças e diferenças com Lark Rise e Over to Candleford, seus predecessores. A narrativa adquire tom mais irônico e assume-se como construção ficcional, como crônica, com marcadores textuais do tipo “esta narrativa”. Nos 2 primeiros livros, a crônica flui mais “naturalmente”, tão orgânica quanto os cenários campesinos e as colheitas descritas.
Como acontecera nos tomos precedentes, a população de diminuta Candleford Green e seus costumes antiquados já pros padrões da década de 1890 são o destaque da narração, em detrimento de fechar a narrativa em algum protagonista, como num romance convencional.
Obviamente mais conectada com o mundo exterior do que a moribunda Lark Rise, as impressões advindas do mundo urbano e das repercussões de algumas mudanças e fatos atingem os moradores e Laura com algum impacto, modificando suas vidas, mesmo que de soslaio.
Fascinam as páginas dedicadas à hoje corriqueira bicicleta. Acostumados a dar mais importância ao automóvel, esquecemos que deslizar sobre 2 rodas foi o primeiro passo pra maior mobilidade individual. Thompson conclui que a liberação das mulheres começou com a bicicleta, porque em princípio tiveram que quebrar tabus que condenavam a locomoção feminina em 2 rodas indecente ou masculinizante. Segundo, porque o pesado e torturante vestuário vitoriano teve que se adequar às magrelas. E, finalmente, e mais importante, com uma bicicleta nas mãos, ninguém mais segurava a mulherada, que podia ir pronde bem entendesse. O carro acentuou isso, mas foi a bicicleta que deu o empurrão inicial.
Com a circulação dos jornais na urbe, até o julgamento de Oscar Wilde leva a narradora a estabelecer ligação com a dupla de velhos soldados que viviam juntos e tiveram uma vidraça estilhaçada, depois do escândalo e ultraje estimulados pelos jornais e rumores.
Terminada a leitura, postei minha velha edição comprada num sebo online prum amigo. Creio que o livro o encantará, e acredito que Lark Rise to Candleford seja mais saboroso se lido em finas páginas amarelecidas, dum tempo que já ficou pra trás, como o descrito por Flora Thompson.  

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