É comum o sucesso dum escritor encetar o lançamento de
qualquer rascunho escrito antes da fama. Manuscritos recusados trocentas vezes
ganham a distinção do papel e sempre haverá apreciadores que lerão o material,
mesmo que a qualidade justifique a rejeição pelas editoras.
Terminei de ler The Professor (1857), de Charlotte
Brontë, publicado postumamente por seu viúvo. Embora o romance não se encaixe
na categoria rascunho, está longe do brilhantismo do influente Jane Eyre, que
garantiu à inglesa lugar na constelação dos grandes da literatura.
William Crimsworth é o sem graça protagonista. Filho
desprezado da baixa nobreza, o jovem ex-estudante da aristocrática Eton também
não se adapta ao mundo dos negócios, representado por seu ambicioso irmão, que
o detesta e faz da vida do jovem um calvário, no curto período em que esse
trabalha na empresa do irmão. Com a ajuda de Mr. Hunsden – negociante que finge
detestar suas raízes tradicionais –, Crimsworth vai ensinar inglês em Bruxelas.
Brontë atua numa chave comum entre diversos escritores
da época: ao mesmo tempo em que tentavam se livrar do fascínio da nobreza –
historicamente derrotada pela burguesia, classe à qual pertenciam – abominavam
a “vulgaridade” e a poluição resultantes da Revolução Industrial. Geralmente, a
terceira via era o refúgio nalgum local intocado pelas fábricas e pelo
comércio. Classe média literalmente com rei na barriga.
Na Bélgica, Crimsworth vai trabalhar na escola de
Mademoiselle Reuter, que começa a flertar com ele, enquanto estabelece uma
relação de jogo de poder quando percebe o interesse do professor pela insípida Frances
Evans Henri, instrutora de costura no estabelecimento.
Prenunciando a desidealização física de Jane Eyre e Mr.
Rochester, Crimsworth e Henri não são atraentes. William é até míope. Acontece
que Eyre e Rochester são interessantes – por isso, estão em nossos corações até
hoje – ao passo que os protagonistas de The Professsor são entediantes.
Rascunho de marinheira de primeira viagem; este foi o primeiro romance da irmã
de Emily.
Charlotte foi professora na capital belga e usou sua
experiência pra compor Crimsworth. Embora se note uma tênue tentativa de
entendimento do estrangeiro, abundam as referências à superioridade
intelectual, física, religiosa e moral dos ingleses sobre os europeus
continentais. Pra “purificar” Henri, a autora arranjou ascendência parcialmente
inglesa à moça. Notem que ela se chama Frances Evans...
Esse cosmopolitismo de araque ainda é forte. Quantos
filmes norte-americanos apresentam uma personagem que atravessa o globo pra
experimentar outra cultura e se apaixonam por outro ianque?
Brontë tinha muito ainda a polir em termos da técnica
de escrita. Os diálogose encontros entre Mr. Hunsden e Crimsowrth são
tenebrosamente forçados. O capítulo final alonga-se desnecessariamente. O
enredo não prende e foi impossível não concordar com as 11 rejeições
enfrentadas.
O bom de ter blog é poder dar a opinião sem se
preocupar com editor, pareceiristas et ali. Então, posso falar: The Professor é
um pontapé no saco!
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