Depois de décadas vivendo o terror franquista, a Espanha viu-se livre do Generalíssimo em 1975. Previamente escolhido pelo ditador, o Rei Juan Carlos assumiu o trono e seu governo foi referendado popularmente em 1978. Em 23 de fevereiro de 1981, enquanto o país ibérico engatinhava de volta à democracia, um grupo de militares fez reféns todos os membros do Parlamento. A ação do monarca foi decisiva pra frustrar o golpe: em um discurso na TV, Juan Carlos defendeu sem reservas a ordem democrática. Depois disso, sua popularidade explodiu, até entre comunistas, inimigos históricos da Monarquia.
A TV Espanhola (TVE) produziu caprichado telefilme em 2
partes sobre o episódio. Roteirizado por Helena Medina e dirigido por Silvia
Quer, 23F: El Dia Más Difícil del Rey (2011) segue a linha de The Queen (2006),
de Stephen Frears, humanizando a figura da família real espanhola. Aquela
coisa, eles chorarm, comem, amam os filhos, portanto são iguais a qualquer um. Em
época de celebridades-joão-ninguém, de dificuldade em perceber abstrações e da
falácia da morte da luta de classes é preciso cotidianizar tudo.
Contada sob o ponto de vista do Rei Juan Carlos, a
minissérie mescla o político e o pessoal de forma muito competente. Os
golpistas usavam o nome do rei pra granjear apoio. Ao ser informado disso, um
dos dilemas de Juanito (viu como ficamos íntimos de Sua Majestade?) é o temor
por sua família caso o palácio fosse invadido, quando o monarca desmentisse os
rebeldes. Mas, como a realeza nunca larga o osso, a Rainha Sofia mostra-se
valente e disposta a enfrentar o que viesse.
O roteiro é criativo pra incluir o infante Príncipe
Felipe na trama e receber uma lição do que é o ofício de rei. Prometendo ajudar
o filho em uma redação escolar sobre a profissão que deseja desempenhar quando
adulto, Juan Carlos deixa o menino assistir a todo o desenrolar dos fatos, pra
que tenha dados pra falar sobre a profissão que já fora designada a ele desde o
nascimento.
Filmado prioritariamente em
interiores e repleto de diálogos, 23F: El Dia Más Difícil del Rey dribla o
tédio potencial com diálogos crispados, criando um verdadeiro thriller de
câmara.
Os antidemocratas são representados como reacionários
que são, porém, nunca como porcos ignorantes, característica que assolou muito
da produção de cine e teatro ao longo de décadas. O roteiro pede que
simpatizemos com o Rei, claro, mas os militares golpistas têm seus motivos,
ainda que desprezíveis pra nós, amantes da liberdade, igualdade e fraternidade.
E como não ficar ao lado de Juanito, segura e
nuançadamente interpretado pelo almodovariano Lluís Homar? Aliás, o elenco é
composto predominantemente por atores de meia-idade. Gostei de ver isso nesta
era de silicones e bíceps jovens.
Parece que as 2 partes da mini estão no You Tube...
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