quinta-feira, 24 de maio de 2012

TELONA QUENTE 50

Roberto Rillo Bíscaro

Adoro filmes que cozinham lentamente em banho-maria e apresentam, sem alarde, algum grande personagem ou majestosa atuação.  O norueguês En Ganske Snill Mann (2010) traz os 2.

Ulrik é um senhor de meia-idade saindo da cadeia após 12 anos de haver matado o amante da esposa. Reencontrando sua velha gangue – reduzida, decrépita e patética – o mecânico tenta se reaproximar do filho e deixa seus antigos comparsas convencerem-no a procurar vingança. Nesse ínterim, envolve-se com personagens tão comuns e classe trabalhadora quanto ele. Nada daquela Noruega idealizada como paraíso de afluência. Não há miséria, claro, mas a galeria de personagens é de gente pobre, trambiqueira, francamente bizarra, violenta ou perdedora.

Ulrik tem que se haver com a azeda e repulsiva senhoria, que lhe serve jantar, assiste a programas de auditório polaco com ele, pra, de repente, baixar a calcinha e “comê-lo”. Também com a colega de trabalho, mais jovem e que tem um ex-marido violento. E esses são apenas 2 exemplos.

Ulrik é caladão e algo gentil (o título alude a isso), que se não sabe direito porque matou o rival, demonstra ter potencial demolidor, como quando intervém junto ao ex-esposo machão da companheira de serviço. Por outro lado, é enternecedora a cena onde ri até as lagrimas apenas por ver o filho e a noiva deste também rindo.

Ai estão 2 trunfos do roteiro: personagens multifacetadas e uma interpretação impecável do sueco Stellan Skarsgård. Demora um pouco pro espectador começar a se importar com esse homem e seu rabo-de-cavalo, mas, sem fogos de artifício, o ator nos coloca do lado da personagem e torcemos pra que tudo dê certo pra ele, mesmo quando toda a sua frágil tentativa de reaprender a caminhar venha abaixo de um só golpe.

Polvilhado com humor escandinavo, En Ganske Snill Mann contém detalhes que enriquecem o roteiro: posso jurar que a canção dos Pretenders que toca na oficina vem do álbum Learning to Crawl, que se traduz como aprendendo a engatinhar, precisamente o que Ulrik fazia.

Apostando no conceito de menos como mais e na mistura leve de drama, comédia e policial meio noir, a produção é entretenimento mais do que decente, ainda que discreta.

E como a gente curte o sorriso de Ulrik, quando chega a primavera! 

Nenhum comentário:

Postar um comentário