Dia 06 de maio, o jornal espanhol El País publicou o
emocionante caso duma pessoa com albinismo, tentando asilar-se no país, para
escapar do perigo de ser pessoa com albinismo na África. O jovem se deparou,
porém, com a barreira da burocracia, que o relegou a uma situação de limbo na
fronteira, com a vida literalmente estagnada.
Meu Azar é Ser Negro e Albino
O ugandense Emanuel Mukasa encontra-se há mais de 19
meses em um centro de Melilla, solicitando asilo. O governo espanhol lhe impede
viajar á península.
Paloma Marín
(Tradução: Carlos Alberto Pedretti e Roberto Rillo
Bíscaro)
“Deus está me colocando á prova. Deu-me esta pele
branca em um corpo de negro. Nasci sob o signo do azar.” Emanuel Mukasa é um
ugandês de 20 anos. Seus pais morreram durante a guerra no país africano, em
1980. Foi resgatado por um pastor que sabia que se não protegesse a criança –
um negro com pele branca – ela seria assassinada por algum vizinho ou grupo
mafioso, que venderia seu corpo para práticas de bruxaria. O camponês que
resgatou Emanuel optou por escondê-lo em um celeiro até que o menino atingisse
a maioridade, momento em que o jovem decidiu arriscar a vida, atravessando o
deserto de seu país natal até Marrocos, para chegar até Melilla á nado. No
total, cerca de 12 mil quilômetros.
Emanuel Mukasa encontra-se há mais de 19 meses no
Centro de Estância Temporal de Imigrantes (CETI), em Melilla, onde solicitou o
direito de asilo por sentir-se perseguido por ser albino. “Estou cansado e
quero sair daqui”, lamenta-se, ao telefone, com a voz embargada e em um inglês
balbuciante. Sua voz trêmula transmite cansaço e apreensão. Emanuel chegou à
Espanha depois de uma travessia de um mês, escondido na parte inferior de um
caminhão, cujo motorista lhe dava pão e água. Antes de iniciar o trajeto, teve
que pagar “pedágio” para alcançar o que considerava a sua “liberdade”: dar um
pouco de seu sangue ao chofer, que também via nele um ser esotérico. A
realidade que vive hoje esse jovem negro de tez branca é muito diferente da que
sonhava antes de deixar Uganda. Ouvira histórias sobre a Espanha. Um lugar onde
pessoas perseguidas como ele eram acolhidas, um país que lhe reconheceria como
“ser humano”.
Ele conta como fugiu de um inferno devastado pela
guerra civil, que custou 312 mil vidas e fez com que 350 mil se refugiassem no
sul do Sudão. No fim, acabou encurralado entre as paredes do CETI, onde espera
que lhe concedam a possibilidade de entrar na península como refugiado. Emanuel
sente-se desamparado e “está morto de medo”, relatam alguns de seus amigos ao
telefone.
Os dias de Emanuel são longos, tediosos e monótonos.
“Leio um trecho da Bíblia todas as manhãs, porque necessito estar em comunhão
com Deus. Sei que Ele não tem culpa pela cor de minha pele e não o culpo por
isso. Não sei se fiz algo errado”, chora. Ao meio-dia, sai um pouco do CETI,
sempre protegido por seu boné preto, jaqueta e calças largas. Anda cabisbaixo;
quer passar despercebido. Consegue alguns euros limpando carros no semáforo ou permanecendo
à porta de supermercados, esperando que alguém se apiede e deixe-o carregar as compras
a troco de uma moeda. “Só quero ganhar a vida como qualquer um, sair deste
Centro... ser independente. Passei toda minha vida preso... Só quero ser
livre.”
Há mais de um ano e sete meses, Emanuel espera que as
autoridades espanholas reconheçam que ele não é um imigrante que apenas busca
trabalho, mas um homem cuja cabeça vale muito em seu país.
Organizações como a CEAR (Comissão Espanhola de Ajuda
aos Refugiados), o ACNUR (Alto Comissariado das Nações Unidas para os
Refugiados) e a Defensoria Pública denunciam essa situação desde 2008.
Consideram que a Lei de Asilo na Espanha converteu-se numa “corrida de
obstáculos” para os necessitados de proteção internacional imediata. 73% dos
3.400 pedidos de asilo apresentados no país em 2011 foram negados.
“Na Espanha, coexistem 2 problemas em matéria de asilo:
uma clara falta de formação nesses assuntos, além de desinformação por parte
dos policiais de fronteira, que não diferenciam os imigrantes econômicos dos
possíveis refugiados”, afirma Lourdes Navarro, advogada da CEAR na Andaluzia.
De acordo com a Defensoria Pública, as autoridades das
cidades autônomas descumprem a normativa de proteção internacional, desde fins
de 2008. “Em Melilla e Ceuta, ninguém informa sobre os direitos dos possíveis
asilados. Só lhes dizem que não podem viajar para a península porque lhes falta
um documento das autoridades governamentais ou do diretor do CETI, o qual
carece de poder jurídico para emitir qualquer documento que lhes permita o
ingresso na península.”
Em 2010, a Defensoria Pública abriu uma investigação sobre
a atuação de agentes da Unidade Central contra as Redes de Imigração Ilegal e
Falsificações Documentais (UCRIF) por interrogar um grupo de marroquinos, que
buscava asilo no aeroporto de Barajas, sem presença de um advogado e fazendo
perguntas alheias à situação. Ademais, iniciou investigação paralela
baseando-se em 4 sentenças do Tribunal Superior de Andaluzia, que se constituíram em evidente cerceamento da livre
circulação e movimento dos requerentes de asilo, impedidos de aceder à
península a partir de ambas cidades autônomas.
Os governos de Ceuta e Melilla reconhecem que nem
sempre é fácil identificar num primeiro momento os casos que satisfazem os
parâmetros para ser solicitante de asilo, devido ao grande número de imigrantes
irregulares que entram no território espanhol. Mesmo assim, lembram as
autoridades, Ceuta e Melilla possuem uma clausula de reserva do espaço
Schengen, que estabelece que os estrangeiros que chegam a essas cidades não
podem entrar na União Europeia sem documentos. Segundo o governo de Melilla,
esse é o motivo pelo qual os requerentes de asilo não podem cruzar o Estreito
de Gibraltar.
Além disso, as autoridades governamentais afirmam que a
burocracia não ajuda a agilizar o processo.
Essas afirmações são contestadas pelo advogado
especialista em imigração Marcelo Belgrano, que defende que o Tratado de
Schengen obriga a realização de controles fronteiriços, mas não a limitação da
liberdade de movimento dessas pessoas, a menos que representem “um problema
para o Estado.”.
Apesar de existirem, segundo a CEAR e o ACNUR, provas
suficientes demonstrando que Emanuel encontra-se em evidente situação de
vulnerabilidade, foi-lhe negada 3 vezes a carteira vermelha que lhe daria
status de refugiado. Depois de 19 meses de luta, a Espanha apenas aceitou sua
solicitação, ora em trâmite. Isso significa que ele só pode caminhar pelas ruas
de Melilla, mas não pela península.
Emanuel está cansado. Quer terminar a entrevista. Sua
voz demonstra impaciência, mas antes de se despedir acrescenta: “Só quero sair
daqui e ser livre”.
Quanto Vale um Albino na África?
Nascem amaldiçoados. Geralmente seus pais os abandonam
nos arredores da aldeia ou em uma estrada de pouco movimento.
As mães são culpadas por engendrarem um demônio e são
repudiadas pelo resto da vida.
A vida de um albino em certas nações africanas, como
Uganda ou Tanzânia, é um inferno. Para alguns, representam a reencarnação do
diabo e devem ser exterminados; para outros, beber o sangue de albinos e
utilizá-lo para a bruxaria significa atrair riqueza à aldeia. Todos desejam
possuir suas extremidades, como os dedos indicadores; cobiçados amuletos, que
simbolizam força e poder. Segundo o ACNUR, a mão de um albino pode valer até
400 dólares e seu corpo completo, 65 mil. Os albinos sobreviventes sabe que
serão discriminados por toda a vida. Acabarão vivendo na indigência com
enfermidades visuais e seguramente morrerão jovens, devido ao câncer de pele. Na
África, há mais albinos do que em qualquer outra parte do mundo. Se na Europa
há um albino para cada 17 pessoas, no continente negro essa cifra sobe para 1
entre 2 ou 5 mil habitantes. Um em cada 70 habitantes é portador do gene; isso
significa que se seu/sua parceiro(a) também for portador(a), seus descendentes
terão muitas possibilidades de serem albinos.
Quanta ignorância! Lamentável.
ResponderExcluir