Roberto Rillo Bíscaro
Se fizerem um genoma da música eletrônica, acharão o
cromossomo K, do Kraftwerk. Quando escrevi isso, me chamaram de exagerado. Não
nego sê-lo, mas nesse caso foi reducionismo. O grupo alemão influenciou até a
guitarra roqueira de Neil Young, em certa canção! Não sei em qual, porque pouco
conheço da obra do canadense, mas aprendi essa no documentário Kraftwerk and
the Electronic Revolution (2008). Se as quase 3 horas de programa tivessem sido
produzidas posteriormente, possivelmente teria se referido ao Coldplay usar o
riff de Computer Love pra construir a sua Talk.
Quase uma hora transcorre até chegar ao Kraft. Os
documentaristas fornecem vasto background histórico e estético da Alemanha do
pós-guerra até os 70’s, da música eletrônica, concreta e pop, incluindo alguns
aspectos de um tipo de música popular germânica chamada schlager, esvaziada de
sua artificialidade de sacarina pela secura e planura estudadas dos vocais da
banda.
A
terraplanagem do terreno é tão minuciosa que até a influência das trilhas
sonoras de filmes de ficção dos anos 50 e 60 é mencionada, bola cantada por
este escriba, em 2009 (leia aqui).
Quando falando sobre o grupo, o programa revela as
conexões e contradições planejadas entre o visual retrô- remetente a um passado
que a Alemanha queria esquecer e o conteúdo revolucionariamente
moderno/futurista da sonoridade. Focando a década de 70/começo dos 1980’s, Kraftwerk
and the Electronic Revolution cartografa a mudança de visual dos próprios
integrantes, de pseudo-cientistas, passando por sarcásticos almofadinhas do
período social democrata à desumanização robótico-computacional oitentista, que
resulta praticamente no desaparecimento dos membros do Kraft, especialmente
quando já não mais dão conta de serem vanguarda.
Em termos musicais, o filme alinhava os conceitos e resultados obtidos desde os primeiros álbuns – experimentalismo refutado pelos caciques do Kraft, Florian Schneider and Ralf Hütter (e por mim, acho chatinho...) até o oitentista Computer World. O conceito de Autobhan (1974) também tem a ver com os Beach Boys, nem imaginava! No caso desse álbum - que entrou na parada norte-americana! – a conjugação desse documentário com Krautrock: the Rebirth of Germany foi muito enriquecedora.
Os ultrafechados Florian e Ralf não participaram do documentário, não autorizado, aliás. Karl Bartos – participante de todos os álbuns fundamentais – conta sobre influências, alguns processos de composição e sua consciência do impacto do Kraftwerk na cultura musical contemporânea. Elogios á garotada inglesa que utilizou as deixas pra criar algo novo – como o Human League – e discreto dardo envenenado no pobre Gary Numan. Ri, mas Numam também tem seus méritos, vai!
Pra não iniciados, pode ser que Kraftwerk and the Electronic Revolution seja longo em demasia, mas há que se ter em mente a importância desses alemães. Eles pertencem á rarefeita liga dos Beatles, Smiths, Bowie, ou seja, aquela casta de artistas pop que mudou e ajudou a definir a sonoridade duma época. E isso não é exagero.
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