Quantas
vezes você não ouviu “prefiro a Europa, porque nos Estados Unidos não tem
cultura”? Imagino que a cultura referida sejam prédios velhos e museus. Mas,
surpresa, surpresa (ironia mode on), os EUA também têm “cultura”; até no You Tube dá pra acessar. Descobri uma
montagem nova-iorquina de Alceste, peça de Eurípedes, em grego arcaico com
legenda em inglês! Phyno, né?
Tragicômica,
a peça apresenta outro imbróglio criado pelos deuses gregos, sempre tão maduros
quanto os mortais! Pra recompensar o Rei Admeto, Apolo concede-lhe a
possibilidade de escapar da morte. Ele só teria que arrumar alguém pra morrer
em seu lugar. Ninguém aceita, nem os pais do monarca, a não se sua esposa
Alceste. A peça se passa no dia em que a morte vem reclamar a jovem rainha.
Embora não
tão atual quanto suas tragédias, Eurípedes cria um Admeto hipócrita ao tentar
se convencer e as outros de que sua covardia seja altruísmo. Ao imputar a culpa aos pais –
Admeto crê que eles podiam ter aberto mão da vida por ele – o rei ouve poucas e
boas num belo discurso de amor á vida, proferido por um ancião. Também fica a
discussão se o sacrifício de Alceste pode ser considerado heróico, num mundo
onde heroísmo cabia essencialmente ao macho.
E por falar
em herói, o bombado Hércules salva o dia e é aí onde repousa um dos temas mais
importantes de Alceste, nos termos da época de sua produção: a importância da
hospitalidade. Repetidas vezes em distintos locais na Antiguidade percebemos a
essencialidade do ser bom anfitrião, não importa sob quais circunstâncias.
A montagem
do grupo de teatro clássico da Barnard College e da Columbia University discretamente combina elementos ancestrais e
modernos. Aos diálogos em grego (com legendas em um mostrador acima do palco) e
à pantomima e simulação da máscara grega sob forma de maquiagem, contrapõe-se
um Hércules fanfarrão, que anda de bicicleta e comanda sua trilha sonora. As
mulheres não subiam nos palcos atenienses, então, Alceste é interpretada por um
ator. Mas, Hércules é uma atriz.
Há momentos
em que tudo fica meio monótono, porque teatro literalmente filmado não é a
coisa mais ágil do mundo e o texto envelheceu. Mesmo assim, é uma boa
oportunidade pra conhecer um pouco mais da cultura grega e ver que ela também
tem seguidores nos EUA. Assim como a Europa tem EuroDisney, o Tio Sam também
não é só McDonnald’s.
Nenhum comentário:
Postar um comentário