Devo a Monteiro Lobato meu interesse e parte do
conhecimento sobre mitologia grega, desde que li as aventuras da turma do Sítio
do Picapau com o Minotauro e Hércules, nos meus 9, 10 anos.
Vivo minifase grega. Ouço um áudiolivro sobre deuses
(as) e tenho outros em estoque sobre a história da Grécia Antiga e as tragédias.
Aproveitando o clima, assisti à adaptação de Antígone, rodada na Grécia, em 1961
e estrelada por Irene Papas.
Vários mitos helênicos sobrevivem em diferentes
versões. No caso de Antígone, a mais famosa é a deixada por Sófocles, um dos 3
mestres da tragédia.
Antígone é filha de Édipo e Jocasta, portanto, princesa
de Tebas. Os protagonistas trágicos sempre pertencem às famílias mais distintas
e se estrepam. Suas quedas serviam como exemplo aos espectadores.
A maldição da Casa de Laio – pai de Édipo - passa a
seus descendentes. Depois do suicídio de Jocasta e do exílio edipiano, seus
filhos Etéocles e Polinice entram em guerra pelo reinado tebano. Ésquilo tratou
disso n’Os Sete Contra Tebas.
Na guerra civil, os 2 irmãos morrem e Creonte – irmão
de Jocasta – assume o trono. Um de seus primeiros éditos é proibir o enterro do
traidor Polinice. Na Grécia antiga, a unção do corpo e seu sepultamento eram
partes fundamentais pra entrada no Hades, reino dos mortos. O cadáver de
Polinicie ficaria exposto ao ar livre pra ser devorado pelas feras carniceiras.
A tragédia de Antígone começa quando sabe da
promulgação Real. Resoluta, a jovem decide sepultar Polinice, porque age
segundo as tradições dos deuses. As personagens trágicas jamais são demovidas
de suas resoluções. Nada – a não ser os deuses – pode se interpor em seu
caminho.
Arma-se um dos dilemas da(o) peça/filme: Antígone devia
ter seguido a antiga tradição ou curvado-se ao fato de que seu irmão pusera a polis
em perigo por sua traição?
Há outra questão que torna Antígone tão atual. Ao ser
informado da desobediência de Antígone, Creonte sentencia que a princesa deve
ser enterrada viva. Ao saber da punição, seu filho – noivo de condenada – pede
clemência ao rei, alegando que os cidadãos tebanos estavam contra a severidade
do castigo, afinal, a pobre Antígone só desejava dar enterro digno a seu
sangue.
Ao desconsiderar o anseio de seus súditos, a atitude de
Creonte põe em questão o papel do governante. Ele tem o direito de gerir seu
lugar a seu bel prazer ou tem que ouvir a voz do povo? Se não a escutar, quais
podem ser as consequências?
Creonte é tão cabeça-dura quanto Antígone. Mas, a
intransigência de Creonte potencialmente pode trazer muito mais problemas, por
ser o governante da cidade. O adivinho Tirésias o alerta. E o pior acontece.
A adaptação pra cine é ótima. Na tragédia grega, as
ações acontecem fora do palco, sendo narradas. O filme mostra tais ações
enquanto são contadas, eliminando o possível tédio. O papel do coro – espécie
de comentador da ação na tragédia grega – é diminuído a fim de não desacelerar
o conflito. Não que Antígone seja um desses filmes vertiginosamente rápidos de
hoje, mas não é moroso.
Reli a peça depois de ver a película e percebi que
muito do diálogo foi mantido, especialmente as partes onde a questão do gênero
de Antígone é levantada. Uma das inquietações de Creonte é que tudo tenha sido
causado por uma mulher, que sequer possuía status de cidadã na Grécia Antiga (mesmo
na posterior democracia ateniense).
Além da suntuosa produção e da linda fotografia em
branco e preto, há a atuação de Manos Katrakis. Mesmo sem entender grego, a
gente sente a soberba, a dúvida e a dor de Creonte através de suas inflexões,
tom de voz, expressões faciais e gestuais. Um colosso de ator.
Pra quem lê inglês, não há desculpa pra não ver essa
preciosidade, no You Tube:
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