quinta-feira, 11 de outubro de 2012

TELONA QUENTE 60


Outro dia, topei com o termo adultescente. Não prestei muita atenção, mas, pelo que captei, refere-se ao estágio cada vez maior de imaturidade, devido a uma sociedade que quer e prega gratificação instantânea, excessivo zelo parental, infantilização de conteúdos via escola, mídia e afins, declínio da abstração e otras cositas.
Enquanto assistia ao inquietante Kynodontas (2009), do agent provocateur grego Yorgos Lanthimos, adultescente não me saía da cachola. Repulsivo, surreal, satírico, violento, patético, às vezes tudo ao mesmo tempo agora, Kynodontas fica com a gente depois de passada a hora e meia com aquela coleção de personagens tão alheios, estranhos, bonitos, feios, próximos.
Não adianta querer julgar o filme utilizando as lições dos manuais de roteiro a la Syd Field, porque a estrutura é diversa: não temos apresentação, desenvolvimento, mudança nos rumos da trama nos momentos convencionais dum roteiro composto por 3 atos, realista (por mais que se disfarce isso em clima de fantasia) .
Um casal cria seus 3 filhos jovens adultos apartados do mundo, numa grande casa murada, com piscina e amplo quintal, nos arredores dalguma cidade grega. Jamais nomeados, os filhos vivem num ambiente de tirania indisfarçada, sob o jugo de competições e ensinamentos errôneos. No vocabulário próprio da casa, telefone significa saleiro.
O clima surreal/absurdo já sinaliza que o filme requer ferramental crítico específico pra julgá-lo. Não adianta ficar perguntando como eles limpam a piscina, ou, como os jovens tinham atendimento médico. Kynodontas dá quase nenhuma explicação.
Por outro lado, o surrealismo da história bate na nossa fuça quando nos lembramos de fatos recentes na Áustria e na Califórnia, onde crianças passaram anos isoladas/prisioneiras.
Embora o filme seja lento, o clima de paranóia, sadismo, masoquismo, perversão, “normalidade” postiça, sexualidade, distanciamento criado pelo diretor - tanto em termos de narrativa, quanto de cinematografia e ângulos de câmera – faz com que queiramos saber o que poderá acontecer. Incomoda e até diverte meio doentiamente, ver adultos se comportando como crianças, latindo e achando que um avião de brinquedo jogado pela mãe é uma aeronave que realmente caiu no quintal da mansão.
Quando uma jovem contratada pra satisfazer sexualmente ao filho traz um elemento exógeno às escondidas, as consequências são irreversíveis. Que esse elemento se travista em produtos culturais estadunidenses permitiria uma leitura globalizante do filme? Oitentistas, atentem pra bizarra cena onde uma das filhas imita Flashdance!
Crítica a pais superprotetores, metáfora sobre a tirania (mal) disfarçada. Seja o que for, Kynodontas é uma daquelas experiências cinematográficas, que, quietinhas, corroem o cérebro e se incrustam nele por muito tempo.  
PS: se você, como eu, é gateiro, odiará uma cena!

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