Roberto Rillo Bíscaro
O punk chocou muito pelos adereços como alfinetes, calças rasgadas e maquiagem pesada, além dos cabelos moicanos espetados. Não demorou pra essa rebelião virar de butique e estilistas lançarem caras calças que já davam impressão de surradas.
No Brasil, a novela Champagne (1983-4) popularizou um penduricalho
“punk”. Quando eu tinha uns 16, 17 anos, metade dos jovens e adolescentes
comprou um colar feito com fio de telefone e um cadeado como pingente. Copiado
da personagem Greg, filhinho de papai revoltado que passara anos em Londres e
voltara punk. Dei-me o trabalho de investigar qual era sua canção na trilha do
folhetim e descobri que era All Night Long, do Lionel Ritchie. Realmente
superpunk! Acho que foi a primeira vez que ouvi falar nos punks, naquele tempo
pré-internet no interiorzão de São Paulo.
Se nos idos de 77, os jovens punks culpavam os hippies
por sua “revolução” ter dado em nada, os filhotes dos anos 70 devem ter feito o
mesmo. Modismo e consumo à parte, o punk mudou a música jovem, tirando-a do
reino dos peritos pop stars pra
colocá-la nas mãos duma molecada que sequer sabia tocar.
Pra dar uma sacada em parte
dessa moçada, à época em que tudo fervia na Inglaterra, indispensável assistir
a Raw Energy: The Early Years of Punk, um tesouro que achei no You Tube, sem
legendas. Produzido em 78, a proximidade com a explosão de 77 e a
contemporaneidade das questões tratadas torna o material inestimável.
Narradora muito discreta e entrevistas pincelam temas
como a perseguição policial, proibição de se apresentar em muitos lugares na
Inglaterra, o sensacionalismo dos tabloides, o costume punk de demonstrar
apreciação nos shows com cusparadas
de cerveja (argh!) e, muito reveladoramente, o quanto de tudo isso não passava
de moda, entretenimento, zuação amplificada pela mídia sedenta de escândalos
pra vender jornais.
Muita gente com a cara colorida (o New Romanticcanibalizaria essas maquiagens!) e cabelo armado reclama de como os anos 70
eram entediantes até a chegada do punk. Não deixam de ter razão: nos shows prog, por exemplo, a plateia tendia a
estar sentada, chapadamente escutando virtuosos.
Interessante escutar um executivo de grande corporação
dizer que as letras rebeldes não ofereciam perigo; a “mensagem” era a própria
música, diz. Esses caras são espertos.
O muso glam
Marc Bolan – já falecido quando o documentário foi lançado – vaticina: a
explosão de 77 foi a ponta de lança, o melhor estava por vir com a irradiação
do ideário punk pra outras áreas e sua espatifação em miríades de sub-gêneros.
Antenado Bolan; Siouxsie and the Banshees, X Ray Specs, The Cure e tantos
outros já faziam isso.
Também mito legal ver o pessoal todo muito jovenzinho,
fresquinho. Siouxsie Sioux, Johnny Rotten e Billy Idol, que depois viraria pop
star profissional, morando em Los Angeles.
Punk the Early Years está recheado de números ao vivo.
Dá pra ver como as meninas do The Slits eram mesmo toscas ao vivo (superpunk!),
como Eddie and the Hot Rods era bem pouco punk; parecia algo dos anos 50 que
tivesse tomado ácido; como o desgramado do Idol tinha carisma pra estrela pop.
Os documentaristas seguiram
a estética da colagem na edição e na confecção dos créditos, assim, o programa é
formalmente fiel ao tema abordado.
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