Roberto Rillo Bíscaro
O sucesso além-fronteiras de Forbrydelsen despertou
parte do planeta pro potencial da TV dinamarquesa, mas ninguém no diminuto país
acreditava que Borgen interessaria a estrangeiros. Foi isso que ouviu Sidse
Babett Knudsen ao aceitar o papel da carismática Birgite Nyborg, primeira
mulher a ocupar o cargo de Primeira-Ministra na península jutlândica. Apta a
figurar em qualquer lista de melhores séries políticas de todos os tempos,
Borgen conquistou umas 7 dezenas de países.
Vi os 30 capítulos, divididos em 3 temporadas, exibidas
entre 2010-13 e entendi o sucesso e adulação. As 2 primeiras temporadas são
brilhantes e a terceira é quase.
Evitando a folhetinização de Scandal e o personalismo
exagerado de House of Cards, Borgen mostra a política como atividade que
demanda líderes carismáticos, mas é essencialmente negociação intragrupos
defendendo interesses conflitantes.
Nas 2 primeiras temporadas, o foco é quase todo na
condução do governo da Dinamarca. Apenas Nyborg e um par de personagens são
apresentados em seus dilemas pessoais, então sobra tempo pras negociações e
intrigas políticas, apresentadas como algo inerente, sem sensacionalismo ou
dramatização excessiva, afastando a produção de seus congêneres norte-americanos,
afeitos à lacrimização e a golpes dramáticos vindos do nada. Não que Borgen
seja destituído de tensão – se o fosse não seria bom – mas a trama é conduzida
dum jeito mais “adulto” e emocionalmente escandinavo, pra usar um estereótipo
daquela região, vista como mais “fria” e reservada.
A opção de não enfatizar a questão de gênero na eleição
e governo duma Primeira-Ministra libera tempo pra sua ação mais livre e
soberana, porém, leva o espectador a reforçar a noção errônea de que tais
questões estão superadas na Dinamarca, inverdade explicitada na realidade da
eleição da Primeira-Ministra Helle Thorning-Schmidt, contra a qual não faltaram
críticas por ser “bonita demais” pra entender de política.
Numa entrevista, da qual participavam fãs, Hugh Bonneville
esclareceu o assunto ao ouvir uma secundarista agradecendo por ter aprendido
muito sobre a sociedade inglesa da época enfocada em Downton Abbey. Lord
Grantham disse que se sentia lisonjeado, mas sabiamente advertiu que a série
era apenas “a little bit o’ telly”.
A terceira temporada de Borgen aprofunda algumas tramas
individuais e em alguns momentos senti o interesse diminuir. Não a qualidade,
porque houve capítulos interessantíssimos com discussões muito maduras sobre legalização
(ou não) da prostituição, redução da maioridade penal, além de críticas ao
endurecimento dinamarquês em sua política imigratória, de asilo e ao
desmantelamento do Estado do Bem-Estar Social, pelo qual a Escandinávia também
é idealizada. Mas, ao longo da temporada quase toda, não deu pra acreditar no
relacionamento de Nyborg com o arquiteto inglês. Reitero não se tratar de queda
na qualidade, porque a própria personagem é dúbia quanto ao caso amoroso. É que
ficava meio enfadonho, às vezes. Eu queria mesmo era ver Hans Christian
Thorsen, líder dos Trabalhistas; Lars Hesselboe, líder dos Liberais; Svende Age
Saltum, caricato líder dos ultraconservadores e as demais personagens ligadas
ao contexto político, motor dramático que justificou a criação e existência de
Borgen.
Com texto excelente e
atuações de alto calibre, o programa é indispensável pra quem curte intrigas
palacianas.
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