Roberto Rillo Bíscaro
Quando resenhei o documentário sobre a bem- sucedidaficção policial escandinava contemporânea afirmei que dificilmente leria alguma. Por adorar quebrar expectativas e por persuasão do Helder, pessoa com albinismo que me recontatou declarando-se fã de Nordic Noir e me recomendando leitura, li Stille Umrkeligt Drab (2010), de Lene Kaaberbøl e Agnete Friis. Como não sei dinamarquês, recorri à tradução pro inglês (2012), The Invisible Murder.
Quando resenhei o documentário sobre a bem- sucedidaficção policial escandinava contemporânea afirmei que dificilmente leria alguma. Por adorar quebrar expectativas e por persuasão do Helder, pessoa com albinismo que me recontatou declarando-se fã de Nordic Noir e me recomendando leitura, li Stille Umrkeligt Drab (2010), de Lene Kaaberbøl e Agnete Friis. Como não sei dinamarquês, recorri à tradução pro inglês (2012), The Invisible Murder.
A trama começa na pobre
Hungria, onde garotos buscam coisas de valor em abandonado hospital da era
soviética. Encontram. Corte pra rica Dinamarca, onde diversas histórias começam
a se entrecruzar em capítulos curtos, até chegar o ponto em que húngaros e
dinamarqueses se veem envolvidos numa ameaça que potencialmente pode matar às
dúzias. Sem querer estragar o mistério pra futuros leitores, uma região
brasileira enfrentou esse “assassino invisível” nos anos 80, caso inclusive,
mencionado no livro.
Detonei Game of Thrones
porque lembra um roteiro raso e me dava ganas de ler Walter Scott (leia aqui).
The Invisible Murder não pode deixar de parecer com filme/série de detetive/suspense.
Nosso imaginário está saturado dessas narrativas, então é impossível escapar.
Mas, mesmo a tradução deixa ver que as danesas escrevem mais criativamente do
que o clichezento George R. R. Martin. Há sacadas legais e até rachei o bico um
par de vezes.
Deu pra supor o/a culpado/a
antes do desfecho, mas a motivação é bastante original e tem forte cunho
social.
É aí que reside um dos pontos
fortes de The Invisible Murder: a visibilidade de temas sociais relevantes como
a exploração de imigrantes, a desigualdade econômica entre as várias Europas,
os conflitos e hostilidades étnicas que promovem desigualdade, perseguição, diásporas
e podem levar a genocídios, como na ex-Iugoslávia.
Exceto por um finlandês
psicopata – narrativas de suspense têm que ter cor! – não há bandidos e
mocinhos, heróis ou vilões. Muito das ações é resposta explícita a condições
sócio-históricas bem marcadas ao invés de bondade, coragem, maldade ou sordidez
inatas. Não há, por outro lado, sugestão de fatalismo ou determinismo. As
personagens escolhem responder desse ou daquele modo às contradições sociais, e
tais escolhas têm consequências sobre outrem, mas as opções poderiam ter sido
distintas (mas, claro, desencadeariam resultados igualmente díspares).
Parte do marketing do livro
reside no fato de ser o segundo da série protagonizada pela enfermeira da Cruz
Vermelha Nina Borg. A âncora social do tema é tão pesada, porém, que naufraga a
possibilidade formal dum protagonismo detetivesco geniozinho da dedução criado
por Poe (Auguste Dupin), desenvolvido por Conan Doyle ou Agatha Christie e que
segue forte, vide o norueguês Varg Veum. Borg não protagoniza; faz muito pouco,
é levada pelas circunstâncias por quase todo o romance.
Stille Umrkeligt Drab
começa lento, ganha ritmo e é capaz de prender. Tomara que ganhe em breve
tradução pro português.
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