Roberto Rillo Bíscaro
Depois de autobiografias (Morrissey e Michael Caine) e Nordic Noir, voltei ao século XIX, onde me sinto mais em casa em termos literários. Escolhi The Mayor of Casterbridge (1886), de Thomas Hardy. Sua tentativa de construir uma tragédia em romance agradou-me mais pelo aspecto político do que pelo nhém nhém nhém mítico que quase sempre desencadeia.
Depois de autobiografias (Morrissey e Michael Caine) e Nordic Noir, voltei ao século XIX, onde me sinto mais em casa em termos literários. Escolhi The Mayor of Casterbridge (1886), de Thomas Hardy. Sua tentativa de construir uma tragédia em romance agradou-me mais pelo aspecto político do que pelo nhém nhém nhém mítico que quase sempre desencadeia.
O livro começa com um casal caminhando numa estrada. A
mulher carrega uma menina, o homem lê uma balada impressa, equivalente da época
aos smartphones pra indicar ao leitor
que Michael Henchard e Susan habitavam mundos distintos/distantes.
Ao chegarem a uma feira agrícola, remanescente da Idade
Média, Henchard se embebeda, como de costume, e vende a esposa ao marinheiro
Newson. Pra justificar a ida de Susan com um estranho, assim tão de boa, Hardy
descreve-a como simplória, analfabeta. Forçado, mas, se a ideia era criar uma
tragédia, Henchard precisava ter uma falha tremenda pra depois cair.
Mas, ele era empregado do campo, não tinha donde cair
hierarquicamente. Hardy faz o tempo correr 20 anos, período em que Henchard
fora pra isolada Casterbridge, prosperara economicamente e alcançara a posição
de prefeito, tendo então donde despencar pra pagar pelo erro. Tragédias
funcionam assim e Hardy lota a narrativa de indicadores formais, geográficos,
arquitetônicos, linguísticos e simbólicos pra greco-romanizá-la e criar a
ambientação que estofasse a vontade de ser tragédia. Levantar tais elementos e
discutir sua eficácia daria bom TCC pra graduando de Letras.
Henchard prosperara e cumpria promessa de passar 21
anos sem beber. Tudo ia bem, mas seu destino começava a mudar. A comunidade
vociferava contra um trigo de péssima qualidade negociado pelo atravessador e
que tornava o pão horrível. Como se não bastasse, Susan volta a Casterbridge
com a jovem Elizabeth Jane. Daí em diante, Henchard começa a decair.
Simultaneamente à ex-esposa e à filha (será?), chega a
Casterbridge o jovem escocês Farfrae, de cujo sonho de emigrar pra América
Henchard demove. Farfrae torna-se o braço direito de Henchard e não demora pra
que se tornem rivais em mais de uma contenda.
Aí está o que mais me interessou em The Mayor of
Casterbridge. Farfrae introduz novas técnicas gerenciais ao negócio de
Henchard, tornando-o mais lucrativo e sistematizado e minimizando custos em
substituição aos obsoletos métodos “a olho” do ex-trabalhador do campo. Hardy
não está realmente tratando do trabalho agrícola. Henchard, e depois Farfrae,
são especuladores, que compram e vendem produtos agrícolas, àquela altura já
comodificados.
Quando Farfrae passa a concorrer com Henchard, por mais
que Hardy atribua o fracasso do último ao destino, à roda da fortuna ou ajuste
de contas por erros mortais, sempre é possível analisar sua queda como parte do
processo de obsolescência de suas técnicas especulativas. Farfrae é mais
simpático com seus empregados, e por isso mais querido. Mas, paga um shilling a menos do que Henchard.
Fiquei com vontade de ler
mais Thomas Hardy.
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