Nosso cronista-historiador fala sobre a implicância com e a importância do horário eleitoral gratuito.
MAIS DO MESMO: sobre o horário eleitoral.
José Carlos Sebe Bom Meihy.
Houve um tempo em que eu detestava o período eleitoral. Por
lógico, isto se deu antes da instalação do regime militar. A ditadura fez ver
meu engano e como seria fértil o tempo de escolhas e de direito de manifestação
livre e democrática. Foram longos os 21 anos de imposição de silêncios e
afastamento dos cidadãos comuns das decisões que lhes dizem respeito. O
cala-boca eleitoral, contudo, foi dos mais eficientes recursos usados por
personagens que não seriam eleitos fora daqueles mandos. Mas era tudo muito sutil
e disfarçado, pois tínhamos “presidentes” eleitos, só que por colégios
eleitorais, fato que, de certa maneira, camuflava o sagrado direito de escolhas
de nossos representantes. Quantos se sentiam aviltados com a censura eleitoral
aprenderam a cultivar o respeito às oportunidades de escolha. O tempo passou e
ainda que as cicatrizes da interdição democrática não tenham se fechado – pelo
contrário, ainda sangram e nos colocam na espreita de achar nossos mortos e
desaparecidos – vemo-nos ante nova etapa da construção da liberdade. É difícil
admitir, mas o frio ditatorial praticamente envenenou os nutrientes que
poderiam ter alimentado árvores mais frondosas. Passado aquele inverno, desde a
Abertura Política dos anos de 1980, vivemos uma espécie de aprendizado forçado,
onde o infantilismo das campanhas chega a nos diminuir enquanto cidadãos
maduros. Com freqüência ouvimos brados, às vezes até inconformados, com os
“famigerados horários políticos”. Sei de pessoas que “aproveitam” esse tempo
para as tais “outras coisas” como cozinhar, navegar na internet, tirar uma
soneca. Não poucos são os que desligam os aparelhos eletrônicos e pouco mais
fazem que reclamar o atraso do horário das novelas. Até entendo tais atitudes
em jovens que não vivenciaram o drama de espera eleitoral. É, contudo,
necessário ver o outro lado da questão. Há vantagens.
Aprendi a gostar do horário político. Mais:
acolho com fervor a sucessão muitas vezes ridícula de falas rápidas, figuras
incríveis, vexatórias, alcunhas inacreditáveis. Antes de me irritar, creiam,
respeito profundamente o direito de representação, seja qual for sua matriz. É
exatamente pela variedade de tipos e propostas que meço a busca desesperada de uma
democracia mais constituída. Temos que pagar e é custoso o preço de termos
suportado por tanto tempo o autoritarismo quartelesco. Tamanha foi a força
desse processo que tivemos figuras como Pelé que, em 1972, no auge da tirania
bradava que “povo não sabe votar”. Aliás, vale lembrar que esta “preciosa”
máxima, cunhada pelos ideólogos da ditadura vigora até hoje. E não são poucos
os que reptem sem critério algum o jargão excludente. E as lições do passado
nos assaltam de maneira surpreendente. Não sabemos votar? Como assim? Quais os
patamares que garantem isso? Historicamente, o Brasil sempre aliou o voto aos
donos do poder. Agentes que “compram” eleitores nunca deixaram os despossuídos
ter voz e quando estes aparecem na cena supõem enganá-los com facilidade. Foi
assim até 1988, quando finalmente a Constituição permitiu direito ao voto aos
analfabetos. Conclui-se então que ao invés de ser artifício de integração, o
poder votar sempre foi marginalizador. Sim, democracia se aprende. Não nascemos
sabendo como lidar com a representação civil. O voto é a grande escola da
liberdade negociada e temos que aliar o direito ao respeito à opinião alheia.
Centremos nossos argumentos no direito de representação. É por ele que temos
que declinar a imposição de nossas ideias sobre a escolha dos outros. Seja qual
for o candidato, valha qualquer que seja o artifício usado para atrair seu
eleitor, vale tudo na democracia. Tudo. Inclusive e principalmente o direito de
ser diferente e até “comprado”.
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