quarta-feira, 24 de setembro de 2014

CONTANDO A VIDA 80

O rol de escolhas para essas eleições está tão variado - negros, mulheres, deficientes, evangélicos, mulheres - que nosso historiador-cronista resolveu problematizar algumas questões de identidade grupal.
Será que ele revelará seu voto? Leia e descubra...  


MEU VOTO VAI PARA...

José Carlos Sebe Bom Meihy
Faltam poucos dias para as eleições. Sobram dúvidas e perplexidades, pois afinal é tempo de definir em quem votar. O “voto nulo” não cabe, pois temos que respeitar nosso direito de participação, arrancado que foi por anos de interdição política. Por todos os motivos, no entanto, o atual pleito se mostra dos mais difíceis. E não faltam motivos que vão desde acasos – e o mais fatal foi o desastre que matou o candidato Eduardo Campos – até o congestionamento de causas. Nunca antes na história deste país apareceram tantas bandeiras defendendo segmentos menos privilegiados. São negros, mulheres, “deficientes”, religiosos de várias filiações, representações de categorias de trabalho e orientação sexual. Nem faltam defensores da natureza nos diversos reinos: animais, vegetais e minerais. É tanta coisa que nos perdemos em alternativas que, contudo, reclamam posições. É bom lembrar que todo este universo variado é positivo. A democracia representativa tem que ser realmente atestado das diferenças e todas devem caber no espaço político eleitoral. Sem limites, diga-se. A jovialidade do nosso processo – ressuscitado depois da morte imposta pelos ditadores por duas décadas – ainda não permitiu depurações críticas. Sem dúvidas, isso confunde o eleitor que se vê perdido entre tantas possibilidades.
Constitucionalmente, somos um Estado Laico. Esta constatação elementar coloca na pauta do dia um dilema central: como explicar a existência de 327 candidatos crentes, concorrendo a diversos cargos? Devemos lembrar que estes números se somam aos três senadores e 70 deputados já estabelecidos, constituindo-se na terceira maior bancada da Câmara. Direito eles têm – e temos que respeitá-los. Na mesma senda, porém, cabe reconhecer que eles são ativos e interferem em pautas importantes como o direito da mulher optar por gestação, casamento de homossexuais, uso de experiências com células tronco etc. Tudo bem que eles podem brigar por suas causas e, exatamente por vivermos o tal Estado Democrático, temos que lutar por isso, mas até onde este caráter militante não ganha foros de “voto de cabresto”? Enquanto não amadurecemos estas questões, assistimos políticos cortejando templos, comungando ostensivamente, evocando o santo nome de Deus em vão.
Com o “voto negro” o processo não é muito diferente. Segundo os registros no TSE, cerca de 55% dos eleitores são negros ou pardos e isso nunca ocorreu com tal intensidade e na mesma ordem, nem tantos candidatos se apresentaram para representar seus pares. Respeitando a premissa que reza que “democracia não tem cor”, sabe-se da importância da luta para o pertencimento desse segmento. No caso dos negros há um elemento a mais a ser considerado: a questão de classe e a violência histórica que se reflete, por exemplo, na cifra absurda da morte provocada de tantos jovens “de cor”. O pressuposto “negro vota em negro” abriga ambigüidades sérias, do tipo: e se o negro for evangélico?
Esta questão, aliás, joga o problema para um poço ainda mais movediço: e se ao fato de ser evangélico e negro, for mulher? O contingente feminino nesta eleição repete a cifra multiplicada de “minorias votantes”. Será que o fato das mulheres representarem tantos sufrágios alterará o metabolismo da escolha? Qual o impacto das três candidatas à presidência serem mulheres? Onde estão – pergunta-se - as pautas femininas? Entre os muitos estranhamentos desta campanha a ausência de discussão sobre a saúde da mulher chega a chocar. Mas, não bastassem estes dilemas – raciais, religiosos, de gênero – há ainda uma fato a mais: os chamados erroneamente “deficientes físicos”. A demonstrar a carência de agenda para elementos que compõem este grupo, ressalta-se a confusão comum entre “doença” e “funcionalidade”. Esta, salienta-se, deveria ser uma pauta defendida por tantos que têm algum tipo de inibição funcional. Porque não respeitamos devidamente este tipo de “minoria”, acabamos nos confundindo e prestando atenção maior às demais características,  que catalisam votos. Finalmente, chego a um ponto importante. Pensemos no direito de grupos que historicamente não ganharam dimensão representativa. Meu voto então vai para... 

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