quarta-feira, 5 de novembro de 2014

MATEMÁTICA INCLUSIVA

Software feito na Unicamp ajuda no ensino de matemática para deficientes

Aplicativo contempla crianças com deficiência visual, entre 6 e 8 anos. Programa é gratuito e poderá ser usado por instituições e também em casa.

Patrícia Teixeira
Contas simples e pequenos problemas de matemática podem ficar menos complicados para crianças com deficiência visual com a ajuda de um aplicativo desenvolvido na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). O software se utiliza de perguntas em áudio para ensinar alunos a entender a disciplina de forma lúdica nas aulas com professores e também pode auxiliar no dever de casa no ambiente familiar. O programa é gratuito e deverá ser disponibilizado até o fim do ano.
O MiniMatecaVox foi pensado e desenvolvido como tese de mestrado do tecnólogo em informática Henderson Tavares de Souza, de 31 anos, na Unicamp, no curso de engenharia elétrica na área de concentração em engenharia da computação. O sistema contempla o conteúdo de matemática do primeiro ano do ensino fundamental, portanto para crianças de 6 a 8 anos de idade. São 20 aulas com 300 atividades. "Eles podem aprender conceitos básicos, cálculo mental, além de ser um estímulo ao uso do computador e à inclusão digital", afirma o pesquisador.
A ferramenta poderá ser utilizada dentro de um programa já conhecido e muito usado por deficientes visuais, o Dosvox, que permite a realização de tarefas variadas por meio da voz. O caminho é fazer o download pela internet para ter acesso a todo o conteúdo. "O programa vai fazer perguntas de áudio. Quantos dedos há em sua mão direita? E o professor aproveita para orientar, ensinar a noção de direita e esquerda, por exemplo. A resposta é pelo teclado e um aviso com voz humana diz se o aluno acertou ou não", explica entusiasmado.
O programa, no qual o aplicativo ficará hospedado, faz a leitura de cada tecla digitada pela criança e traduz em som para que seja possível saber o que está sendo escrito pelo teclado do computador. Segundo Souza, não há muito investimento para melhorar o aprendizado de deficientes visuais, principalmente na área de exatas.
"Nunca vi nada no mercado. Foi um grão de areia o que consegui desenvolver em dois anos e meio. Pretendo continuar o projeto em um doutorado", conta. O pesquisador espera que, com a divulgação, mais profissionais se interessem pelo projeto para desenvolver e disponibilizar o conteúdo para outras séries escolares.
O trabalho foi orientado pelo professor Luiz César Martini, do Departamento de Comunicações da Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação (Feec).
Motivação veio da sala de aula
Além de pesquisador, Henderson, morador de Louveira (SP), é professor do ensino fundamental na rede pública de Várzea Paulista (SP), cidade próxima. No dia a dia, convivendo com as deficiências de cada aluno para aprender matemática, ele se viu motivado a fazer algo por aqueles que enfrentam ainda mais dificuldades para absorver o conteúdo.
"A matemática tem mais dificuldade para os deficientes visuais por falta de recursos, ferramentas que dêem a eles condições de aprender. Espero que através do software eles se motivem para aprender e usar a matemática para as suas vidas e para o futuro", conta o pesquisador, que hoje se diz preparado para receber um aluno com essa deficiência em sala de aula.
Programa foi testado em instituições especializadas
Henderson levou o programa para ser testado em instituições especializadas no auxílio a deficientes visuais em Campinas. "É um suporte a mais para o que a criança aprende no ensino regular. Foram solicitados ajustes e até o fim do ano o aplicativo estará disponível na internet", afirma.
Uma delas foi a Pró Visão, que promove a habilitação e reabilitação desse público há 30 anos. A instituição, localizada no bairro Jardim Proença, atende em média 45 deficientes, de bebês a adolescentes. Para a coordenadora Maria Cecília Saragiotto, a invenção de Henderson será muito importante para o futuro das crianças. "Tudo que facilita, dá autonomia para os deficientes visuais, é bem-vindo", conta.
A coordenadora afirma que esse público enfrenta uma carência no ensino normal e, por isso, as crianças procuram o apoio das instituições. Sem a ajuda, muitas não conseguem acompanhar. "Vamos usar o aplicativo e exercitar com as crianças. Já está no nosso plano", completa.
Carência em matemática é percebida entre adultos deficientes
Outra instituição que cuida dos deficientes visuais em Campinas é o Centro Cultural Louis Braille, também no Jardim Proença. No local é possível aprender a linguagem e apoiar os jovens, principalmente acima dos 18 anos, na inclusão escolar em classes comuns. O coordenador de projetos sociais Devanir de Lima, que é deficiente visual, percebe que a matemática é, de fato, um problema para esse público.
"Muitos pais acreditam que o papel de ensinar está sendo feito nas escolas, que elas estão suprindo, mas não é assim. As crianças precisam sim de apoio e empenho maior das famílias", afima Lima. Segundo ele, muitas escolas não possuem professores especializados e o aprendizado precisa ser complementado para que as crianças evoluam.
"Recebemos jovens de 18 anos que não sabem fazer contas de adição, subtração, divisão e multiplicação com três dígitos. Matemática avançada eles nem sabem o que é. Se não tiver uma base bem feita do 1º ao 5 º ano, eles terão problemas no futuro", preocupa-se.

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