quarta-feira, 17 de dezembro de 2014

CONTANDO A VIDA 92


Nosso historiador-cronista, chiquérrimo, está em Nova York e de lá enviou texto emocionante e elucidativo sobre sua visita ao que um dia foi o World Trade Center, hoje monumento de superação, memória e vitalidade. 




WTC: UMA VISITA INESQUECÍVEL.

Jose Carlos Sebe Bom Meihy,



Sou de uma geração que aprendeu a criticar os Estados Unidos. Na contramão dos ordenamentos dados pela “Quarta Internacional”, contudo, toda a geração de meus filhos foi seduzida pelo imperialismo cultural que desde os anos de 1960 tem avassalado o mundo. O cinema, a música, as tentadoras mercadorias que marcam o consumismo moderno, tudo somado, tem produzido efeitos progressivos. O resultado destes processos se manifesta nas atitudes contraditórias que se resumem no sentimento de amor e ódio. De maneira pendular, em uma ponta o queremos muito bem, incorporamos em nossas roupas, atitudes, gostos os valores propalados pelos ditos “Americanos”, e por outro detratamos o poderio que afinal nos faz devedores e dependentes econômicos “deles”.



Estar em Nova Yoirk e daqui escrever sobre esses temas submete minha opinião ao extremo positivo, pois afinal, o que me faz eleger esta cidade como a preferida no mundo? Mera contradição? Tropeço cultural? Claro que não, mas também não cabe jogar no mundo da relativização argumentos que merecem cuidados.  Estas palavras introdutórias se justificam quando tenho em mente o impacto causado por uma visita ao World Trade Center. No ano 2000, ainda morando aqui, onde fazia a pesquisa empírica para o meu livro “Brasil fora de si: experiencias de brasileiros em Nova York”, por várias vezes estive nas torres derrubadas. Em 2001, no dia 10 de setembro, num voo de volta ao Brasil depois de participar de um congresso, ainda a noite, o avião que saía do aeroporto de Newark sobrevoou as torres. Chegando em minha casa no dia 11, logo pela manhã, fui surpreendido pelo telefonema de meus filhos que, aflitos, temiam pela minha integridade. Foi quando liguei a televisão e vi as cenas apavorantes. Por motivos profissionais, voltei a Nova York no próximo dia 16 de outubro e então pude visitar os escombros medonhos do ataque. Era como se o buraco aberto na terra se replicasse em minha alma. Com certa regularidade passei a voltar anualmente a Nova York e sempre insistia na visita àquele campo. De maneira sutil, questionava em meus interiores o que seria feito com a memória da trágica ferida. De maneira sutil, essa pergunta servia de guia para meu debate moral sobre a cultura norte-americana. Acompanhei com cuidado a evolução dos acontecimentos, a decisão de transformar a memória da desgraça em marco efetivo para a história da cidade. A ideia de um memorial físico, de um ponto de referência obrigatório para assinalar o sentimento de luto e ao mesmo tempo de reconstrução fazia com que despertasse uma curiosidade que, afinal, era compartida com boa parte do mundo.

O tempo foi passando, anos corridos se sucederam ate que se extraiu o entulho, começaram as construções e a paisagem foi ganhando contornos de superação. Não há como deixar de reconhecer o sucesso do empreendimento. Além de um jardim composto por logradouro público, uma imensa piscina quadrangular em níveis declinantes transporta água de um estágio para outro. O som da água caindo, juntamente com a noção de escada descendente deixa profunda marca na observação. Não há como não se emocionar. Ademais, os ultramodernos prédios erigidos ao lado, exatamente, no coração financeiro da América, dão formas insistentes  da vitalidade de uma cultura que não ficou na lástima. E não há como refutar o reconhecimento de um projeto de vida coletiva que soube transformar um ataque em monumento de reflexão. Por certo, não há só homenagens nesta edificação da memória. Há também críticas, pois o espetáculo da arquitetura que exibe força, não se compromete em esconder os motivos que levaram os “inimigos” ao ataque. O que se pretende é mais do que apenas mostrar força, mas reconhecer que seja qual for o oposto, é possível recomeçar. Não há como visitar o World Trade Center sem repassar todas estas emoções. Não há também como deixar de reconhecer a vitalidade um país que no coração de sua mais importante  cidade se deixa marcar pela ideia de reconstrução, recomeço e continuidade. 







Nenhum comentário:

Postar um comentário