quinta-feira, 29 de janeiro de 2015

TELONA QUENTE 111

Roberto Rillo Bíscaro

Gene Hackman se aposentou do cinema em 2004, reclamando da inexistência de bons papéis pra atores em idade avançada. A obsessão de nossa cultura pela juventude e a própria matriz dramática da sétima arte dificultam o protagonismo daqueles com mais anos nas costas.
Vez ou outra, porém, coroas quebram a rotina de interpretar vovôs, pais, chefes e mordomos. Em 2012, James Cromwell – que sempre coadjuva – estrelou o canadense Still Mine, segura estreia na direção de Michael McGowan.
Baseado em fatos, o filme ambientado na linda zona rural canadense pretende ser a história dum octogenário que desafia o Estado burocrático altamente regulador construindo uma casa em sua propriedade, do modo que aprendeu pela tradição passada por seu pai.
Essa afirmação da independência pessoal contra normas, todavia, é eclipsada pela narrativa muito mais nuançada do relacionamento de Craig com a esposa Irene, com a qual está casado há mais de 6 décadas. A casa deve ser erigida, porque Irene tem doença degenerativa e o casal precisa duma moradia mais fácil de manter, uma vez que se instalar num asilo lhes parece o fim da picada, graças a aguçado senso de autonomia.
A força de Still Mine reside nas diversas facetas desse relacionamento no dezembro do casal. Doença, vitalidade, esquecimento, lembranças, sexualidade, decadência física e mental são apresentados de maneira terna, quieta, comovente e irônica pelo roteiro, que, se esquemático na construção narrativa e na condução da trama social, prova ser profundo, realista e humano no trato das questões individuais.
Cromwell e Geneviève Bujold nos presenteiam com atuações estelares numa produção que mostra as dificuldades e medos de envelhecer, mas também traz a esperança de autonomia, liberdade de exercer vontades e amor duradouro.

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