Italo Prog IV
Roberto Rillo Bíscaro
A Itália é curiosa.
Quando algum gênero musical cai em suas graças, os italianos copiam e maximizam
tanto alguns aspectos, que obrigam a criação de subgêneros prefixados com
ítalo. Já escrevi sobre Italo Disco. Com o rock progressivo
não foi distinto. Nos anos 70, mormente na primeira metade, a Bota empipocou-se
de bandas geralmente inspiradas em modelos britânicos, mas injetando certa
“italianidade” nos vocais dramáticos (muitos muito ruins), instrumentação
épica, enfim, o exagero.
A quase totalidade dessa
produção periga ser esquecida, embora esteja cada vez mais disponível, por
exemplo, com álbuns completos no Youtube.
Quella Vecchia
Locanda lançou seu primeiro álbum, homônimo, em 1972. São 8 faixas não muito
longas, influenciadas especialmente pelo também italiano – e muito mais famoso
– Premiata Forneria Marconi e pelo britânico Jethro Tull. As letras são em
italiano e os vocais bons. O Prologo resume o álbum com sua fusão de clássico
operático, momentos pastorais e rock energético, especialmente turbinado com
violino elétrico. Ao longo do álbum estimulantes momentos de interplay entre
flauta, teclados e violino. Um Villaggio, Um’Illusione começa como barroco no
violino elétrico pra se transformar num hard rock envenenado com flautas
andersonianas. Em Realta, a flauta vem doce, mais Peter Gabriel, num clima de
piano bem PFM e Genesis. Immagini Sfuocatte começa como experimentação
eletrônica pra terminar em guitarra lisérgica e bateria galopante, que se
repete no início de Il Cieco, energética (e meio sem graça) no início pra
metamorfosear-se em calma paisagem onde piano, violino e flauta se encontram,
antes da volta da energia. O ponto alto é Sogno, Risveglio E... com sua linha
melódica de piano capaz de enternecer rochas. Num álbum onde a soma vale mais
do que as partes, esta seria a canção pra ouvir caso fosse só pra conhecer
Quella Vecchia Locanda.
Geralmente bombástico, o Italo Prog tem em Príncipe di Um Giorno (1976) - estreia do infelizmente obscuro Celeste – sua exceção mais encantadora. Os tropos árcades de calmaria duma natureza amiga compõem essa obra absolutamente pastoral e homogênea, na qual nenhuma faixa destoa da plangência bucólica e delicada criada por violão, flauta, piano, harpa, xilofone, algum instrumento medieval e órgãos, nunca vindo em turbilhão, antes fluindo suavemente por nossos ouvidos. Os vocais e até o bocadinho de experimentalismo são duma calma e beleza fantasmagóricas que acompanham o ouvinte muito depois de findo o álbum. Soa mais ou menos como se os momentos mais suaves e acústicos do Genesis fase Trespass, de certos álbuns-solo de Anthony Phillips e Stevie Hackett tivessem sido estendidos por 37 minutos. Agradará fãs de MPB setentista e de música sensível em geral.
O Murple botou apenas um álbum: Io Sono Murple (1974). A escolha do verbo foi porque Murple é o nome dum pinguim, cujas aventuras são narradas mais instrumentalmente do que por letras. Excentricidade a parte, o álbum é dividido em 2 longas suítes, compostas por canções menores emendadas. Sem inovar ou experimentar, o objetivo do Murple era entregar prog sinfônico com fortes descargas de Mellotron e guitarras. Os belos momentos lentos de piano clássico e harmonizações vocais apenas realçam as diversas e vigorosas descargas de órgãos em timbres variados. Dramático, mas não exagerado, Io Sono Murphy acerta em cheio pros gostos de quem curte sinfônico a la ELP, PFM ou The Nice.
O segundo álbum do Il Balletto di Bronzo é fundamental pra se conhecer o drama e exagero de certa vertente do sub-gênero na Itália. Ys (1972) é conceitual, baseado na lenda bretã da cidade que submerge devido a uma princesa devassa. São 5 faixas, 2 delas, a Introduzione e o Epilogo, são suítes longas. O álbum começa com um canto feminino evocando a sedutora princesa. Um dos poucos momentos relaxantes; o restante é sinfônico veloz com teclados endiabrados a la ELP e guitarras que lembram Yes. Alguns trechos antecedem o turbilhão criado pelo grupo de Jon Anderson em Gates of Delirium, faixa de Relayer (1974). Só que a produção é mais apagada e os vocais nem comparação. Ys é tão intenso que pode causar overdose e também desagrada quem não curte muito jazz-rock e experimentalismos, porque em vários momentos essas características ressaltam. Descontados esses senões, indispensável pra amantes de grandiloquência, complexidade de arranjos e alta velocidade de órgãos analógicos e guitarras.
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