Você sabia que a divisão do dia em horas adequadas para dormir, descansar e trabalhar foi muito influenciada pela Revolução Industrial inglesa?
Essa e outras informações e ponderações na excelente crônica do Prof. Sebe, tratando sobre Cronos, nosso senhor Tempo.
OS SEGREDOS DO TEMPO.
Essa e outras informações e ponderações na excelente crônica do Prof. Sebe, tratando sobre Cronos, nosso senhor Tempo.
OS SEGREDOS DO TEMPO.
José Carlos Sebe Bom
Meihy
Seguramente “tempo” é a matéria mais significativa do nosso viver moderno. E olha que não falo apenas do tempo de cada um, mas do tempo coletivo, aquele que regula e coordena as ações de todos no trabalho, na escola, na vida social enfim. É comum dizer e ouvir que “não temos mais tempo para nada”, e, desdobramento mecânico disto se repete que “vivemos correndo”. Olhando a história bíblica, aprendemos que tudo começou com a indicada expulsão do Paraíso, onde o Criador decretou, frente ao pecado da cobiça, que os seres humanos deveriam “ganhar o pão de cada dia com o suor do próprio rosto”. Estava dada a maldição redentora que nos faria cativos do trabalho. Como se sabe, trabalho e dinheiro são aliados, como mais tarde Calvino pontificaria na máxima Time is Money. Em termos práticos, foi a Revolução Industrial inglesa que definiu a divisão do tempo diário em três partes igualmente distribuídas: oito horas para o trabalho; oito para descanso/lazer e oito para dormir. Vale notar que para os índios e nativos de várias regiões menos afetadas pela industrialização, este fracionamento temporal não vigora. Entre tribos brasileiras por exemplo, é muito comum notar que se dorme duas horas, acorda-se e se parte para outras atividades como pesca e caça, fabrico de utensílios de barro, arte plumária ou mesmo ficar em conversa sem pretensão de utilidade. Com intervalos, volta-se a dormir e assim a vida se processa.
O filósofo judeu alemão Walter
Benjamin em artigo conhecido como “O narrador” revela que nos tempos modernos,
não temos mais tempo para longas narrativas e assim, em vez de contar
histórias, no máximo desenvolvemos a leitura e mecanicamente mudamos o
comportamento e as relações humanas. Sob esta ótica, a quebra nas soluções de
relatos quer dizer muito em termos de tempo, pois perdemos a capacidade de
aprender pela experiência do outro. Recentemente, nova neurose foi detectada
com o nome de “hebefrenia”. Trata-se de uma manifestação na qual o indivíduo perde
o poder de se ver como um todo e precisa do espelho (daí hebefrenia, termo
derivado da deusa grega Hebe que precisava do espelho para se ver inteira). A
visão parcelada das coisas e dos fatos é uma das dramáticas conseqüências do
uso do tempo segundo as leis da produtividade.
Mauro Maldonato é o nome de um
filósofo italiano que tem revolucionado o conceito de tempo na modernidade,
mostrando que há reações à ditadura do relógio. Ao questionar valores que não
mudaram com o comando do tempo cronológico, diz ele que há outros tempos de
difícil mensuração como o “tempo do amor”, “tempo do ódio”, “tempo da saudade”.
Diz também o criativo pensador que estes “tempos subjetivos” não se submetem à
duração do relógio e são comandados pelos procedimentos da memória. Esta
diferenciação acabou por provocar séria crise entre o tempo objetivo e o
subjetivo. De toda forma, o que pesa mesmo no âmbito do capitalismo é o que
rende dinheiro, lucro ou capital. Não se considera muito mais que não seja
produtivo ou prático e nesta ordem, amar, ter raiva, sentir falta são valores
menores e às vezes até tido como exceção ou doentios.
A contemplação dessas variantes
em termos do tempo das festas de fim de ano torna-se emblemática dos dilemas da
modernidade. Tomemos por exemplo o Natal. Em juízos éticos é um tempo de confraternização,
de apelo solidário e de reparação dos desencontros da vida, mas, marcado no
calendário comercial, as festas natalinas se aproveitam dos ciclos de renovação
afetiva e tentam – sempre com sucesso – desvirtuar o que se tem de mais
profundo na humanidade: o tempo da lógica moral da vida. O que se aprende com
tudo isso é que não se deve deixar de lado as oportunidades que se nos afiguram
agora. É preciso aprender que a existência nos dá oportunidade de, no final do
ano, juntar o tempo cronológico com o tempo espiritual e assim viver se maiores
contradições os dilemas de ser contemporâneo.
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