quinta-feira, 28 de maio de 2015

TELONA QUENTE 120

Roberto Rillo Bíscaro

Continuando com meu festival islandês – que rendeupostagem-dobradinha semana passada – vi Eldfjall (2011), submetido, mas infelizmente não indicado, ao Oscar. Esse tipo de premiação não faz diferença em meus processos de escolha, mas senti que a película tenha ficado de fora da competição. Mesmo sendo só indicada teria o público maior que merece.
A sequência de abertura arrepia: erupção vulcânica destruindo uma aldeia ao som de canto coral:

Corte pra festa de despedida de Hannes, que abandonara com a família a ilha avassalada pelo vulcão (eldfjall, em islandês) e agora se aposentava como zelador duma escola em Reikjavik. Rígido e distante com alunos e colegas, o padrão comportamental repete-se em casa, onde o coroa dá patadas na esposa e mantém filhos e neto à distância. Hannes não é mau sujeito, porém; escolhera o caminho da rabugice, mas ao ouvir incógnito os filhos comentando enojados sobre seu comportamento, ocorre-lhe uma epifania. Decide mudar: compra o peixe favorito da esposa, faz amor com ela, começa o caminho pra se tornar ser humano mais decente. Como a vida não é filme de final feliz, a esposa tem um tremendo AVC e Hannes decide cuidar dela em casa, ao mesmo tempo em que tenta remediar as coisas com os filhos e neto.
Filmado em 16mm, Eldfjall evita o visual HD da pós-modernidade pra contar essa belíssima história de tentativa de redenção, que pode ser difícil, porque representa as agruras da idade e da doença, mas jamais recai no sentimentalismo induzido por trilha sonora incidental lacrimejante. A música feita por um dos integrantes do cultuado Sigur Rós aparece tão parcimoniosamente quanto os cenários espetaculares da natureza islandesa. A maioria do filme se passa no interior duma casa nos arrabaldes da capital.  

O diretor estreante Rúnar Rúnarsson – seguindo roteiro tradicional e quase impecável – encontra sábias soluções cênico-simbólicas pra ilustrar o apartamento, a fantasmogaria e o desnudar de Hannes em sua quieta jornada de retomada de humanidade, que passará por teste duríssimo ao ver a esposa vegetativa gemer de dor ireversível.

Theodór Júlíusson (Hannes) e Margrét Helga Jóhannsdóttir (Anna) dão interpretções exemplares e corajosas, sem medo de se despir (escandinavos não têm problema com nu frontal!), de se entregar, mas sem sacarina.

Já guardei o arquivo de Eldfjall, grande filme que merece ser visto mais de uma vez. Na verdade, merece ser descoberto por grande parcela do público.

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