Roberto Rillo Bíscaro
Ao comentar o recente trabalho do Hot Chip (resenha aqui), afirmei amar diversos ingleses branquelos que gostariam de ser negros
estadunidenses. No altamente categorizado mundo pop não poderia faltar
sub-gênero com essa característica, o blue-eyed
soul, que não incorpora apenas britânicos, mas tem diversos representantes
da ilha que adoro. Surgido nos 60’s pra enquadrar artistas brancos, como Dusty
Springfield e Tom Jones, o blue-eyed soul
teve grandes momentos/nomes nos anos 80, um dos quais, Lisa Stansfield, foi
resenhado aqui.
Em 1985, destoando da lugubridade associada à Manchester
pós-punk dos Smiths e da Joy Division o Simply Red lançou Picture Book, gerador
de diversos hits, dentre eles a arrasante Holding Back the Years. Era o início
duma carreira vendedora de dezenas de milhões de álbuns e receptora de inúmeras
farpas da crítica, à medida que o ruivo (Red) Mick Hucknall ficava mais e mais
mainstream. Deixei de seguir a trajetória da banda lá pelos fins dos 90’s;
ouvia algo aqui e acolá, mas nunca álbuns completos. Tanto é que nem sabia que
Hucknall lançou álbuns-solo após o encerramento das atividades do Simply Red,
em 2010 (agora sei, mas continuo não me importando).
Pois não é que semana passada saiu Big Love, lançado pra
celebrar o trigésimo niver da banda? Sequer me dei o trabalho de verificar a
formação. Simply Red sempre foi um nome falsamente coletivo: Vermelho é o
apelido de Hucknall, o grupo é simplesmente ele mandando em músicos
contratados. Mas, me deu curiosidade pra checar o blue-eyed soul que estão fazendo. Nostalgia de 1985 – lembro bem do
sucesso de Holding Back the Years nas rádios -, gostei bastante de Big Love.
A dúzia da canções pesca elementos dos anos 70,
especialmente disco music, (Philly)
soul e easy listening, e foi feita
pra agradar a nós, cidadãos de meia-idade que assistimos à gênese do Simply Red
e hoje estamos mais preocupados com a taxa do colesterol. Daydreaming nasceu de
Marvin Gaye, fase What’s Going On; a faixa-título mescla Phily soul com Burt Bacharach; a fugaz introdução glamorosa de The Ghost of Love estaria
confortável nalgum álbum do setentista Odissey; Tight Tones é James Brown
totalmente domesticado pra nossos ouvidos já zunidos; WORU abunda em arranjo de
cordas disco, ecoando boa parte do
álbum. A coisa mais moderna é Shine On, meio soul dance anos 90 e a mais antiga é o jazzinho de The Old Man and
the Beer. Tudo muito simpático e agradável.
Alguns dos astros oitentistas – hoje 50tões – mudaram o
tema de algumas letras. Em seu álbum de 2010, a ex-Everything But the Girl
cantava sobre a diferença hormonal dela e da filha adolescente (resenha aqui).
Hucknall dedica menos tempo ao sexo agora. OK que em Love Gave Me More tem uma
moça suspirando “give me more”, mas o Simply Red 2015 homenageia o pai falecido
e fala de renovar laços matrimoniais. Se você foi adolescente/jovem nos
80’s/90’s, Big Love tocará todos seus pontos G ainda em funcionamento.
Se você é posterior, seria
sacanagem eu recomendar o trabalho dum cantor cuja voz já está meio degradada e
liquidifica tanta influência e música sublimes que você deveria conhecer.
Assim, indico uma coletânea do Simply Red e, mais importante, Marvin Gaye,
Barry White, Burt Bacharach e coletâneas de disco music
e Philly soul. Daí você ouve Big Love
sacando de onde saiu cada charmoso acorde.
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