Hoje nosso cronista-historiador conta com leveza como se esbaldou em terras mineiras, visitando a histórica Ouro Preto, tomando cachaça, papeando com motoristas...
José
Carlos Sebe Bom Meihy
Como dizem por aí, a vida é uma caixa de surpresas. Fui destacado pela minha editora para divulgar meus livros. Teria que aceitar, é claro, pois isso é um elogio distintivo. Mas tudo seria mais fácil se recebesse indicação do destino, fora o eixo São Paulo Rio. Alternativas abertas, isso foi o suficiente para armar um teorema em minha cabeça: para onde ir? Complicando dilema se montou, pois poderia escolher qualquer capital do país. Ponderei sobre a Bahia, estado que mais consome tudo que publico; ventilei o Rio Grande do Sul, onde existem grupos atentos à história oral; em pensamento, supus Brasília e também contemplei Recife. Seria uma boa oportunidade de ir ao Maranhão – única capital brasileira que não conheço, também ponderei. Dei asas às oportunidades e por dias me deixei levar. Finalmente, depois de titubeios, optei por Minas. Belo Horizonte especificamente, e vigorou o fato de ter em mente a doação prometida de 21 pranchas de Portinari com versos de Drummond, em edição rara. Antes, já havia ofertado para o Arquivo dos Escritores Mineiros, da UFMG, os microfilmes de Carolina Maria de Jesus. Pesou na decisão o fato de ter amigos queridos, em particular o casal Constança e Eduardo Duarte. A programação, como seria de se esperar, seria intensa. Teria que ficar à disposição de entrevistas para jornais e televisão, além de tratar de um assunto importante com a Editora da Universidade Federal de Minas Gerais, UFMG. Sobretudo, era importante o lançamento planejado para a simpática Livraria Don Quixote. Com ajustes, tudo deu certo, restando o domingo livre.
Confesso que tinha várias alternativas em mente: ir para
Brumadinho visitar novamente o Museu Nhotim - com espetacular acervo de arte
contemporânea, o maior museu a céu aberto da América Latina; pensei em passar o
dia em BH e visitar os museus locais, dar uma volta à Pampulha e ver os painéis
de Portinari na combinação perfeita com o prédio de Niemeyer. Poderia ainda conhecer
o Museu do Peso e da Mineralogia. É lógico que daria para ir ao fabuloso
Mercado Central e até ver a famosa Feira de Artesanato da Av. Afonso Pena.
Venci a etapa das tentações e optei por Ouro Preto. A bem da verdade, devo
dizer que não fazia muito tempo que havia estado lá, mas o friozinho do inverno
e a possibilidade de visitar o incrível Museu do Oratório, a propaganda das
igrejas preparadas para receber os turistas que estariam lá para o Festival de
Inverno bastaram. Preciso dizer que encontrei um chofer autenticamente mineiro:
orgulhoso da terra; simpático e conhecedor de bastidores da vida cultural da
região. E dos bastidores da política local também.
A conversa fiada no caminho ia dando detalhes da
corrupção da política estadual, fato que explicava porque os “mineiros
autênticos” não votaram no Aécio. Da política passamos por questões da
preservação dos monumentos e da atenção especial que Minas merece no quesito
preservação do patrimônio Histórico. Falamos, é claro, da comida mineira e dos
escritores “os mais importantes da Literatura brasileira”: Guimarães, Drummond,
Sabino, e até Carolina Maria de Jesus repontou. Por fim, chegamos. Ouro Preto
estava lotada de pessoas, pois o tema do Festival de Cinema era o papel dos
interpretes negros. Não faltou gente para prestigiar. Visitei o Museu da
Inconfidência, lindamente reformado e passei por algumas igrejas. Meu tempo,
contudo, estava reservado prioritariamente ao Museu do Oratório. Que
espetáculo! Seja pela coleção, pela disposição das peças, pela música de fundo,
por tudo enfim, olhei aquela montagem como se fosse a primeira vez. E fiquei
extasiado. A precisão das informações, a iluminação certeira, a sequência
pedagógica. Tudo encanta. Demorei umas três horas perdido em contemplação
absoluta. Ao sair, o entardecer foi coroado por lindo pôr do sol, com um trago
de boa cachaça e linguiça apimentada.
Deixei Ouro Preto, mais barroco do que já sou, e fico
pensando nos recantos deste Brasil que precisa se mostrar mais. A completar
tudo, reconheci os passos taubateanos que desbravaram Minas e bateu um orgulho
meio bobo de achar que aquela realidade é um pedaço do que fomos.
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