Roberto Rillo Bíscaro
Quando se historiciza o sub-gênero slasher, é obrigatório
citar o italiano A Bay of Blood (1971), o canadense Black Christmas (1974) e há
quem remonte ao hitchcoquiano Psicose (1960) pra desencavar características temático-formais
do tipo de filme “inventado” por Halloween (1978), popularizado (detratores
escreveriam bastardizado) por Sexta-Feira 13 (1980) e replicado à exaustão na
fase áurea 80tista. Menos frequente é a menção ao obscuro The Town That Dreaded
Sundown (1976). Slashermaníaco, há anos tencionava ver a produção. Há um par de
fins de semana, aproveitei o ensejo de ver a homenagem do ano passado e fiz
sessão dupla.
O diretor Charles B. Pierce, em plena América
desencantada pós-Vietnã/Watergate/Crise do Petróleo, jogou balde de água gelada
na tola idealização do Pós-Guerra, como período de inocência e paz. Entre
fevereiro e maio de 1946, um assassino em série, conhecido como Phanton Killer,
chacinou 5 pessoas na região de Texarkana, cidadezinha perdida na fronteira do
Texas e Arkansas. Naquele ano, a comunidade se armou até os dentes,
trancafiou-se em casa e literalmente abandonou Texarkana às dúzias devido ao
pânico. Os ataques cessaram tão repentinamente quanto começaram e nunca se
capturou o matador.
Mentindo que os fatos narrados são fidedignos aos
acontecimentos, The Town That Dreaded Sundown quase não conseguiu molhar
ninguém com seu banho de água gelada, mas isso não deve ser motivo de pesar: é
bem ruim. Com elenco péssimo – o oscarizado Ben Johnson amargando decadência,
protagoniza -, uma personagem horrível como alívio cômico que apenas enche o
saco e problemas de ritmo, The Town That Dreaded Sundown vale mesmo pra fãs de
Jason Voorhees verem seu “papai”. Não sei se o oportunista Sean S. Cunningham
assistiu a isso, mas o Jason do segundo Sexta-Feira (onde 2 mortes são cópias
de A Bay of Blood, diga-se) usa o mesmo tipo de roupa (até a cor!), o saco na
cabeça e anda devagarzinho na floresta (e alcança a vítima que corre!), como o
Phanton Killer.
A cena mais antológica é o
assassinato com trombone, que o Phanton consegue assoprar mesmo com a fronha na
cabeça! Notem como ele respira pesado (como em Black Christmas), prestem
atenção às roupas, música incidental; puro Friday the 13th.
Muito, mas muito mais legal é a meta-homenagem homônima dirigida
ano passado pelo estreante Alfonso Gomez-Rejón. 6 décadas após os assassinatos,
o temor/culto ao Phanton Killer ainda assombra/fascina Texarkana. Todo
Halloween, o drive in local reprisa o
filme de 76. Durante uma dessas exibições, um mascarado mata uma mocinha e o
pesadelo recomeça. Mas, quem seria o serial killer dessa vez? Teria alguma
conexão com o verdadeiro Phanton? Poderia ter algo a ver com o filme?
Pós-moderna e inteligentemente, o filme manipula ficção, realidade e
“realidade”, além de não sucumbir à fórmula dos slahshers. Nada errado se o
fizesse, mas diverte pensar que o primeiro pode ter dado algumas ideias ao
sub-gênero e este, inserido portanto, numa tradição avolumada, não se submeteu
ao conforto de segui-las. The Town That Dreaded Sundown 2014 obviamente
apresenta lugares-comuns do horror, como mocinha traumatizada desacreditada e
perseguida e reviravolta-surpresa na conclusão, mas é tudo tão bem-feitinho que
nos absorve na história. Até dinossauro
de volta o filme traz, como tantas produções de horror têm feito. Veronica
Cartwright faz a avó da mocinha.
Vai ver que o número de espectadores do filme de 76
aumentou devido ao de 2014. Não sei; tudo que sei é que pro público geral,
recomendo apenas o mais recente. Que o outro fique pros fãs roxos de
Sexta-Feira 13.
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