Roberto Rillo Bíscaro
Passamos cada vez mais tempo em frente a telas de PC e/ou
smartphones, fazendo com que as
interações sociais assumam outros contornos; certamente sociólogos e filósofos
têm se ocupado em discutir isso. A migração das mais tradicionais telonas
cinematográficas e telinhas televisivas pros monitores computacionais e
celulares não passa despercebida pelo cine e pela TV. Ano passado um dos
melhores episódios de Modern Family foi todo em conversas num chat e o slahser
The Den uniu o sub-gênero dos found
footage films ao mundo cibernético.
Este ano, Amizade Desfeita juntou os found footage films e slasher
de fantasma numa narrativa bastante rigorosa formalmente, que utiliza apenas a
tela dum computador. Criatividade nota 9, mas o resultado padece um pouco
porque o medo jamais se concretiza por estarmos numa mediação de terceiro grau:
estamos vendo através duma câmera algo gravado por outra(s) e isso dilui o bom
do horror.
Há um ano, Laura Barns cometera suicídio depois que
alguém postou um vídeo, onde a adolescente aparecia em situações vexatórias.
Incitada a se matar em tudo quanto é rede social, ela seguiu os conselhos e o
fez também pro mundo ver. Amizade Desfeita trata do lado mais destruidor do cyberbullying numa idade tão insegura,
numa era quando se vive o risco, mas também o fascínio, de que nossa intimidade
seja exposta. A rigor, trata-se duma fábula sobre a extinção da privacidade.
Na noite de aniversário de seu passamento, 5 de seus
amigos estão sozinhos em casa – slashers
basicamente são sobre os perigos de jovens sem supervisão/proteção adulta -,
mas online, conversando eletronicamente
entre si. Via Skype, alguém começa a ameaçar, chantagear, revelar segredos,
jogar um contra o outro, à medida que os elimina. Será o fantasma de Laura?
Lógico que é.
Como sabemos que é found
footage film, que tudo se passará na frente das câmeras de PCs -
restritivas de movimento e escopo – e que a não ser que o roteirista tenha se
drogado em demasia, a única entidade lógica pra causar toda a comoção só podia
ser o espírito de Laura se vingando via cyberspace,
Amizade Desfeita carece de suspense pra saber o que vai acontecer.
Sobra o como acontece, mas nesse quesito o enredo também
não é tão interessante, devido à restrição imposta pelas regras de filmagem que
queriam tudo registrado pelas câmeras dos notebooks.
Sendo assim, a atenção recai quase toda na forma, trunfo de Amizade Desfeita.
O roteiro de Nelson Greaves e a direção de Levan Gabriadze
utiliza os ruídos, interfaces e possibilidades de sites onipresentes nas vidas
de bilhões: Facebook, Youtube, Instagram, Google. São múltiplas janelas
abertas, conversas paralelas, que exigem do espectador atenção e vista boa pra
ler muito chat, nessa história que
também se autoimpõe ser mostrada em tempo real. Tudo interessante, mas não dá
pra criar muito pavor com tanto tempo gasto com transferência de arquivos ou
vídeos preenchendo.
Amizade Desfeita ficará datado tão celeremente quanto
muda a rede, mas mesmo que não seja uma grande história de horror, sempre
valerá a pena: agora pra constatar a perícia formal dos realizadores e num
futuro qualquer, como curiosidade arqueológica sobre como aqueles primitivos
seres de 2014 se comunicavam.
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