Roberto Rillo Bíscaro
K. Michelle contou que atualmente os reality shows são uma das únicas vias de divulgação pra cantoras
negras de rhythm’n’blues. Além da própria Michelle, lembro do envolvimento de
Tamar Braxton e Angie Stone em programas do tipo, e olha que menciono apenas
artistas aqui resenhadas.
Exagero ou não, o álbum do ano passado de Jazmine
Sullivan chama-se justamente Reality Show e segue um hiato de 3 anos, qando a
norte-americano afastou-se do cenário musical. Ela diz que o título é porque
viu muitos desses programas enquanto estava “aposentada”, mas sabe-se lá se não
é farpa contra a atual escassez de oportunidades pra quem faz som old school
(meio 80’s no seu mais antigo). O que quer que signifique, Reality Show é um grande
álbum. A voz granulada de Sullivan em canções produzidas por mãos diferentes,
mas surpreendentemente homogêneas, prova que a cantora não pode parar pro bem
da humanidade. É uma dúzia de coisas boas.
Na abertura de marcha rigorosa sincopada por hip hop, de
Dumb, Sullivan já mostra quem comanda; é ela a voz, é ela a diva. O rigor
continua com Mascara, mas dessa vez na letra, que joga luzes contraditórias
sobre meninas que pra escapar da pobreza do gueto se entregam pra sugar daddies. O ponto de vista é de uma
delas, que pergunta se ela também não tem direito às coisas boas da vida e
sente-se insegura, porque a concorrência é enorme; se ela está com o bofe pelo
dinheiro, ele também não está com ela por amor, não é enganado. A melhor letra
que ouço em qualquer estilo há tempos. E interpretada com uma nuança que
necessita de várias audições pra captar a insegurança. Aliás, Reality Show
precisa de várias ouvidas atentas; Sullivan canta em camadas.
Às bases de soul contemporâneo, os arranjos adicionam
detalhes, como o piano de salsa, em Silver Lining ou os metais de jazz, em
Brand New. #HoodLove é trilha de Quentin Tarantino misturada com tema de Lana del Rey: uma mulher que carrega uma 45 na bolsa e tem um macho que pode não ser
bom, mas o é pra ela. E a letra é cheia de bang
bang, bitch e nigger. Ah, se
nossos instruídos moralistas críticos da “pouca vergonha” do pancadão
entendessem outro idioma que não só o português funcional...
Stupid Girl é super Amy Winehouse; que lindo ver branquela
judia inglesa influenciado negras rhythm’n’blues; Stanley é neo disco que abre com palminha de Santa
Esmeralda e ruído de electronica low fi.
Daí chega o final catártico, com destaque pra penúltima faixa, Masterpiece
(Monalisa), com sua autoconfiança inquebrantável, mas que expressa os 2 lados
de qualquer um, representados pelas enérgicas guitarras e o fecho de piano
suave. Sullivan sabe e pode sobrevoar e mergulhar, alternando momentos de alta
potência com registros mais intimistas.
Acho que algumas canções estão faltando dessa playlist, mas as constantes já dão boa medida do arraso que é Reality Show:
Acho que algumas canções estão faltando dessa playlist, mas as constantes já dão boa medida do arraso que é Reality Show:
Nenhum comentário:
Postar um comentário