Roberto Rillo Bíscaro
Neal Morse tem história das mais interessantes no mundo do
rock progressivo. Fundador da bem-sucedida Spock’s Beard e membro do
multinacional Transatlantic, o poli-instrumentista converteu-se em fervoroso
cristão depois que sua filha supostamente recebeu milagre de cura após sessão
de oração. Desde então, lança trabalhos-solo de louvor prog, que, diga-se, pode
ser considerado sub-gênero dentro do sub-gênero. Há até sites listando bandas
de Christian Progressive Rock, conhecido como CPR entre os iniciados.
Acostumado a entrar em estúdio com muitas ideias e material
composto, o norte-americano decidiu experimentar. Chamou feras como o
ex-baterista do Dream Theater, Mike Portnoy, e em clima de jam sessions a The Neal Morse Band produziu The Great Experiment,
em fevereiro de 2015. A edição de luxo dupla, com 10 faixas, é a que compensa
adquirir.
O CD 1 abre com uma das melhores canções prog do ano, The
Call. Alguém se saiu com memorável riff,
que a abre e encerra, executado ora em guitarra, ora em teclado. A seção final,
que leva à retomada dessa melodia, é uma catarse de interplay entre guitarra e teclas; convite quase irresistível para
amantes de prog sinfônico a pressionarem frequentemente a tecla repeat. Se The Call tem defeito, é ter
apenas 10 minutos e não os quase 27 do épico que conclui o CD.
A trinca que recheia os 2 grandes momentos prog do álbum é
boa e simpática, mas rebaixa o nível do experimento de grande para bom. A
faixa-título recua para o hard rock
setentista e por momentos lembra o prog ianque de então, como Styx e Kansas.
Vigorosa, mas The Great Experiment, a canção, já foi feita milhares de vezes.
Waterfall é folk com lindas harmonias
vocais sobre tecido de violões e alinhavos de piano. Agenda gruda na cabeça
como qualquer bom pop-rock oitentista, do qual é parcialmente tributária.
Alive Again é o épico de quase 27 minutos que conclui a
experiência, voltando a subir-lhe o nível para grande. Indo do quase thrash ao rococó, passando por momentos anos
60 meio The Moody Blues traz todos os elementos encantadores dos fãs de prog
sinfônico: mudanças no andamento, oportunidades para todos os instrumentistas
brilharem, perícia técnica indiscutível e grandes melodias. Mas, The Call é
melhor, essa será a sina da canção.
O CD bônus não faz feio com números ao vivo
orgiásticos, como The Creation e vigorosas faixas de estúdio como New Jerusalem
e Doomsday Destiny. Aliás, são nessas 5 faixas que se percebe mais
explicitamente as letras devocionais de Morse. O ponto alto, porém, é a
regravação de MacArthur Park, composta no fim dos anos 60 por Jimmy Webb e que
já ganhou até versão disco de 18 minutos de Donna Summer. A canção é épica o
suficiente para permitir voos prog e os quase 11 minutos tocados por Neal Morse
e amigos só reforçam isso.
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