Dizem que o ano brasileiro começa apenas depois do Carnaval, então creio que ainda é tempo de seguirmos os conselhos de nosso historiador-cronista para 2016, que se inicia semana que vem!
CINCO VERBOS PARA 2016: aceitar, escolher, desapegar,
decidir e conferir.
José
Carlos Sebe Bom Meihy
Sempre que uma etapa desponta como possibilidade, cabe
fazer planos. Como qualquer recomeço, aprendemos a exilar o mal, evitar
dissabores e prevenirmo-nos contra erros passados. E logo nos lançamos nos
planos de mudanças, pensando em retraçar caminhos e escolher os melhores
atalhos. Em termos gramaticais, a ação reside nos verbos que, afinal,
significam movimentos. Tratei de deixar de lado os complicados mandamentos da
língua e me permiti flanar (bonita palavra esta “flanar”) e rompi as exigências
classificatórias de verbos: transitivos, intransitivos, transitivos diretos,
indiretos, principal, complementar. Deixei tudo para trás e resolvi escolher
cinco verbos para conjugar durante o ano que se inicia. Seria inútil dizer que
uma legião de verbos vivenciais logo foi deixada de lado, pois “viver”,
“comer”, “respirar” são inerentes à sobrevivência e, portanto, não aplicáveis. Outros
foram banidos da relação por serem negativos: “sofrer”, “adoecer”, “machucar”.
Também desprezei aqueles que sugeriam mudança de meu perfil: “mandar”,
“exigir”, “impor”, “castigar”. É lógico que recusei verbos contrários às
intenções incutidas na proposta: “alienar”, “enlouquecer” e mesmo “contemplar”.
Na medida em que se diminuíam as possibilidades, estabelecia critérios para as
definições que, afinal, recaíram em cinco: “aceitar”, “escolher”, “desapegar”,
“perdoar” e “conferir”. Antes de prosseguir, devo dizer que verbos inerentes à
vida foram convocados, mas como paisagem e não orientação, assim “amar”,
“acarinhar”, “gostar”, funcionaram como condição ou suporte para os escolhidos.
Foi difícil eleger o primeiro verbo, pois deveria ser o
condutor dos demais. E teria que ser capaz de conciliá-los sem ser passivo,
submisso ou, pelo contrário, mandatório. Pensei bastante e ironicamente optei
por um que me namora há muito tempo: aceitar. Mas não se trata de qualquer
admissão. Não mesmo. Pelo reverso, pensei em um “aceitar” combativo, daqueles
que admitem o bom combate, algo próximo de um “eu aceito lutar”. Outro lado da
mesma moeda, “aceitar” também a fatalidade das coisas que não posso mudar.
“Aceitar” as limitações que possuímos pode ser virtude se conjugarmos o verbo
com a esperança e com metas. Posto isto, restava decidir sobre o segundo verbo.
“Escolher”, curiosamente, se afigurou logo. E se mostrou valente soldado de uma
faina incessante. Saber deliberar, ter a coragem de tentar alternativas com
consciência que vai além do mero jogo. Escolher é uma arte, pois demanda
consciência do que é deixado. Em tantos casos, abdicamos o direito de escolhas
e legamos ao acaso a solução de problemas. Resolver o próprio caminho, depois
de aceitar o direito de opção é algo consequente. O verbo “desapegar” despontou
com força, com vontade e naturalmente. “Desapegar”, nossa!... “Desapegar”
quantas lições de moral e ética estão contidas nessa palavra que até pouco
tempo estava em desuso. Crítica ao capitalismo que naturalmente se instala em
nós, o apego é irmão siamês da cobiça e se compõe com autonomia com o egoísmo e
a mesquinharia. Temos coisas demais e somos escravos de novos e progressivos
desejos. Vamos “desapegar” de tantos bens materiais e se conseguirmos fazê-lo
juntos nos colocamos no caminho da revolução necessária a um mundo melhor e,
quiçá, menos consumista. “Perdoar” é mais do que um verbo necessário. É
essencial à boa relação com o mundo. Não devemos investir no inventário de
mágoas que acumulamos. O verbo “perdoar” não deve ser visto como resignado ou
anulador da memória. Avesso disso, o perdão deve ser soberano e equivaler à
experiência. Por fim, ganhou lugar o verbo “conferir”. Mas este também exigiu
reparos, pois não se pensou na conferência como um ajuste de contas e sim como
critério de verificação das propostas. E também, em extensão, “conferir” se
abriu como um convite a vida como um todo. Com estes cinco verbos, creio,
podemos nos abraçar coletivamente desejando um bom ano, mas sobretudo um 2016
temperado com os fermentos da ação.
Nenhum comentário:
Postar um comentário