terça-feira, 2 de fevereiro de 2016

TELINHA QUENTE 197

Roberto Rillo Bíscaro

Ao escrever sobre a temporada prima de Transparent, ironizei que meu lado malvado tinha ganas de enviar aquela gente pra Katmandu pós-terremoto pra sentirem o que é problema de verdade e diminuírem o mimimi. Parece que a criadora Jill Soloway se tocou sobre o significado de ter um monte de judeus de classe-média com problemas identitários em um mundo onde 99% reunido é mais pobre do que o restante 1%.
A segunda temporada da provocadora série, disponibilizada online pela Amazon Studios no dia 11 de dezembro, questiona também a posição social e de gênero de algumas personagens. Os 10 capítulos de cerca de meia-hora cada, continuam com a jornada de Mort/Maura, o intelectual 70tão que se assume transgênero, e seus familiares e amigos. Sem desmerecer questionamentos ou problemas individuais, personagens problematizam o privilégio econômico de classe-média alta e a própria posição mais confortável de Maura, que parte duma lócus de homem branco, socialmente percebido como heterossexual. Maura também é confrontada por uma antiga companheira de universidade, sobre o preconceito velado nutrido pelas feministas/lésbicas, enquanto era Mort e sistematicamente negava-lhe bolsas de estudos.
Esse tipo de autocrítica e também por pinçar similaridades entre o exclusionismo de alguns segmentos LGBT e o fim da festa libertária na República de Weimar, assinalada pela ascensão do nazismo, são apenas 2 exemplos do porquê Transparent é uma das séries mais inteligentes da atualidade. Pode nem sempre ser a mais viciante, mas instiga o espectador mais aventureiro a tentar retirar-se de suas zonas de conforto.
O relativo pouco tempo destinado a Mort/Maura talvez ressignifique o título pra transparência da discussão de ideias e demonstração de diferentes formas de desejo, sexualidade e arranjos familiares.
A sensação de indie movie com trilha sonora descolada continua, assim como Transparent, renovada pruma terceira vinda.

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