Roberto Rillo Bíscaro
Dia 10 de janeiro, o mundo acordou perplexo com a notícia da morte de David Bowie. Mantido em sigilo pela família, o câncer levou o Camaleão dias após o lançamento do jazzístico Blackstar, nova guinada na carreira do artista mais importante saído da Inglaterra sabe-se lá há quantas décadas. Sem exagero, David Robert Jones deixou tantas crias, inspirou tantas tendências e influenciou não apenas a música, mas também a moda, que o impacto de seu Bing Bang criativo será ainda sentido por décadas.
O documentário Five Years (2013), da BBC, usa o título da faixa de abertura do clássico The Rise and Fallof Ziggy Stardust and the Spiders from Mars (1972) para traçar panorama de cinco anos importantes na carreira do inventor dos anos 80. Com a característica qualidade e profundidade da emissora britânica, colaboradores como Rick Wakeman e Carlos Alomar e acadêmicos pop como Camille Paglia exaltam qualidades e falam sobre a gênese, significância e legado de Bowie.
Dia 10 de janeiro, o mundo acordou perplexo com a notícia da morte de David Bowie. Mantido em sigilo pela família, o câncer levou o Camaleão dias após o lançamento do jazzístico Blackstar, nova guinada na carreira do artista mais importante saído da Inglaterra sabe-se lá há quantas décadas. Sem exagero, David Robert Jones deixou tantas crias, inspirou tantas tendências e influenciou não apenas a música, mas também a moda, que o impacto de seu Bing Bang criativo será ainda sentido por décadas.
O documentário Five Years (2013), da BBC, usa o título da faixa de abertura do clássico The Rise and Fallof Ziggy Stardust and the Spiders from Mars (1972) para traçar panorama de cinco anos importantes na carreira do inventor dos anos 80. Com a característica qualidade e profundidade da emissora britânica, colaboradores como Rick Wakeman e Carlos Alomar e acadêmicos pop como Camille Paglia exaltam qualidades e falam sobre a gênese, significância e legado de Bowie.
Lançando álbuns desde 1967
e com o sucesso de Space Oddity, sua carreira não deslanchava como gostaria.
Bowie queria ser estrela e trabalhou duro e eficientemente para tanto. O
primeiro ano de virada foi 1971-72, dos álbuns Hunky Dory e Ziggy Stardust. Em
Nova York, ele conhece Andy Warhol. Estabelece-se relação de admiração/inveja
criativa e quando Bowie retorna a Inglaterra usou muito do que viu no The
Factory para lapidar a imagem de rock
star que tencionava criar, desde a capa icônica de Hunky até a personagem
Ziggy Stardust e sua ascensão e queda. E Bowie se torna uma estrela do rock ao
cantar sobre uma; calculando cada gesto, assumindo a primeira de uma série de
visuais e personalidades. O público alguma vez viu o “verdadeiro” David Bowie?
Em cada ponto de virada, Five Years explica a criação de canções-chave, neste
período os destaques vão para Changes e Life On Mars?
Bowie
foi o primeiro ícone do rock no mesmo nível de adoração das estrelas
hollywoodianas da fase áurea. Astro que se dá ao luxo de matar sua personagem
Ziggy Stardust ao vivo, no palco, no dia 03 de julho de 1973. Hora de se
reinventar e o enfoque cai sobre o biênio 1974-5. De cabelo cor de laranja e
quase albino por falta de sol. Bowie decide se tornar soulman. Encharcado de música da Philadelphia e do Harlem, de
Aretha Franklin e auxiliado por futuros astros black como Luther Vandross, compõe Young Americans, soul music à Bowie, porque era esperto
demais para saber que não bateria os originais norte-americanos se tentasse
fazer o jogo deles. Inquieto e cocainado demais, Bowie já troca o disco em 75.
Inspirado por krautrock e o
eletrônico Kraftwerk, compõe as texturas escuras de Station to Station (1976).
Cheio
de problemas com empresários, esposa e, acima de tudo, perigando surtar ou
morrer pelos abusos com drogas na maluca Los Angeles, decide retornar a Londres
em 76 e aí está o ponto para a próxima virada 76/77. Influenciado pela
ambiência eletrônica das paisagens aparentemente imutáveis e gélidas de
Discreet Music (1975) do ex-Roxy Music e não-músico Brian Eno, Bowie recruta-o,
assim como o King Crimson Robert Fripp e sua guitarra frippertrônica, muda-se
para Berlim e despindo-se dos paramentos e estilo de vida de rock star compõe a eletrotrilogia
iniciada por Low, que pavimentaria o caminho para o synth pop, só para dar um exemplo. Malhado por críticos, que depois
seriam implacáveis com o synth pop,
um dos melhores trechos é a inteligência do Camaleão fuzilando um desses
escribas, que acusa o álbum de “alienado” “Alienado do quê?”, pergunta Bowie,
enquanto a câmera dá zoom em seus
olhos, um azul, outro verde. “De, de, de, de, bem, de minha realidade”, admite
o repórter. Low é clássico e esse repórter é quem mesmo? Outra delícia é ver
Robert Fripp na “terceira-idade”, de paletó e gravata, supertiozinho, falando
em guitarras que dão ereções.
Na
virada de 1979/80, o Camaleão coabitava o universo pop com suas crias. A
explosão punk e o estilhaçar pós-punk em n
subgêneros tiveram muito de sua mão na concepção/execução. Utilizando o novo
expediente do vídeoclipe, ressuscita Major Tom, personagem de Space Oddity, na
faixa Ashes To Ashes, ressignifica eletronicamente o glam rock e põe guitarra distorcida de Fripp no funk estranho de
Fashion e com isso fecha os 70’s – década em que foi o maior – com Scary
Monsters, influenciando, mas já trabalhando junto com seus filhotes New Romantic.
Vale lembrar que sabendo da fama do Blitz Club, o artista recrutou alguns de
seus frequentadores para o vídeo de Ashes to Ashes, dentre eles, Steven Strange, do Visage.
Entre
82/3, Bowie assina contrato milionário com a EMI, fisga o produtor da moda Nile
Rodgers, do Chic, que produzira Diana Ross e Sister Sledge e lança Let´s Dance.
Até então, respeitável e respeitado pela crítica e companheiros da indústria e
com público cativo, faltava a Bowie conquistar o planeta e isso o faz com esse
álbum. De teatros cobertos a estádios de futebol, a fase pop que produziu China
Girl e Modern Love é encarada como mais um experimento. Liberto das drogas e
tendo dominado os 70’s e gerado os 80’s, chegara a hora de colher os louros
virando ídolo planetário, de cabelo platinado e paletós de diversas cores.
Five
Years poderia ter o último grande ponto de virada, em 1988, quando o artista se
encheu de fazer coisas comerciais (o álbum de 87 é frustrante) e já tinha
dinheiro até mais não precisar e por isso criou o alternativo Tin Machine,
áspero demais para papai e mamãe
Mcfelizes curtirem com mauricinho e patricinha pelo alto-falante do shopping.
Como Bowie saíra do radar da
grande mídia há anos, mesmo lançando sólidos trabalhos nos 90’s e 00’s, Five
Years tem sabor de resumo da ópera para contextualizar a importância do
lançamento de The Next Day (2013), que marcava o aparente enceramento de uma
década propositalmente em silêncio. Como se isso não fosse muito bom, porque
apresenta o filé de sua produção, ainda se refere a suas elogiadas atuações no
cinema e na Broadway.
Lotado de imagens raras ou
até então inéditas, Five Years é essencial para neófitos começarem a entender a
importância do artista e para fãs terem rápido material de consulta para sempre
se lembrar do porquê David Bowie é tão fundamental para a cultura
contemporânea.
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