Roberto Rillo Bíscaro
Durante minha adolescência e começo de vida adulta nos
anos 80/90, Agatha Christie ainda era tão popular que sua vasta bibliografia
era lançada na íntegra, em edições baratas de bolso. Trabalhei na biblioteca
municipal de Penápolis, de 1986-89, e seus livros tinham procura enorme. Certa vez, alguém veio perguntar se tinha algum livro da Gata Triste, porque tinham-lhe dito serem muito bons. Sério, não conto lorota.
Diz(ia)-se que tirando a Bíblia, a britânica é a mais traduzida de todos os tempos. Nunca devorei, mas li vários de seus mistérios e o que mais marcou foi O Caso dos Dez Negrinhos, que, na adolescência achei genial, porque descobri o culpado literalmente na última linha. Hoje reconheço a forçação de barra e implausibilidades da trama, mas algum valor deve ter uma obra da qual lembro o nome de várias personagens, inclusive do(a) assassino(a).
Diz(ia)-se que tirando a Bíblia, a britânica é a mais traduzida de todos os tempos. Nunca devorei, mas li vários de seus mistérios e o que mais marcou foi O Caso dos Dez Negrinhos, que, na adolescência achei genial, porque descobri o culpado literalmente na última linha. Hoje reconheço a forçação de barra e implausibilidades da trama, mas algum valor deve ter uma obra da qual lembro o nome de várias personagens, inclusive do(a) assassino(a).
Originalmente publicado em 1939 sob o título Ten Little
Niggers, o whodunnit já vendeu uns
100 milhões de cópias, é considerado a obra-prima de Christie e teve o título
alterado umas 2 vezes, porque nigger é
muito ofensivo nos EUA. Mudaram pra Indians, mas nos 60’s ou 70’s acharam
ofensivo pros americanos-nativos e o nome ficou And Then There Were None. Se
fosse Ten Little Albinos provavelmente poucos achariam ofensivo, querem
apostar?
Adaptações pras telonas e linhas tem havido várias, em
diversos países. Já na primeira, de 1945, o título foi And Then There Were
None, porque foi nos EUA. Vi mais de uma e entre Natal e Ano Novo os 3
capítulos da readaptação 2015 da BBC, que manteve o título politicamente
correto, teve elenco estelar e clima soturno com adensamento psicológico, e,
sobretudo, não empolga.
A trama é avó dos slasher films. 8 pessoas são convidadas prum fim de semana numa mansão numa ilha
isolada, onde há apenas 2 empregados. Após lauto jantar, uma gravação anuncia
que todos são culpados dalgum crime e, a partir daí, morrem um a um. As mortes
seguem uma rima infantil, onde negrinhos, índios e atualmente soldadinhos vão
sendo eliminados. Conforme cada eliminação, um negrinho/indiozinho/soldadinho é
retirado de uma bandeja.
Nessa nova filmagem, o roteiro enfatizou bastante a crise
de consciência e sensação de culpa das personagens, através de flashbacks, onde a maioria, na eminência
de morrer pra pagar pelos crimes, lembrava das circunstâncias de seus erros e
enfrentava seus demônios de culpa. Essa dimensão garantiu adensamento
psicológico inédito nas adaptações fílmicas. A cinematografia escura, com céus
negros de tempestade, belos cenários da ilha isolada e a música incidental
eficiente colaboram com a qualidade técnica, sem contar o elenco de ótimos e
famosos, como Sam Neill, Charles Dance, Miranda Richardson, Anna Maxwell Martin e Burn Gorman, respectivamente, a Esther Summerson e o Mr. Guppy, de minha
amada Bleak House. Puristas torcerão narizes pra adição de sexo e dum bofe que
passa metade da minissérie sem camisa, mas considerando-se que é o Aidan
Turner, do recente sucesso Poldark (qualquer hora, escrevo sobre), dá pra
entender porque a BBC não economizou no talento dramático do peito do moço.
Cônscio da identidade do(a) assassino(a), concentrei-me
no andamento, o qual achei demasiadamente moroso e os diálogos engessados. And
Then There Were None virou drama psicológico, faltou conseguir criar clima de
tensão e as mortes são pífias. Até em filme dos anos 60 havia melhores.
Enfim, achei frio, mas se
você assistir sem saber a identidade d(a)o perpetrador(a) e ficar tenso, então
o problema deve ser meu que já vi essa história vezes demais.
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